Bloomberg Línea — A Tiger Global Management, de Nova York, liderou um aporte de US$ 61 milhões (cerca de R$ 300 milhões) na Nomad, fintech de serviços financeiros em dólar para brasileiros. A Série B foi seguida por atuais investidores como Stripes, Monashees, Spark Capital, Propel, Globo Ventures e Abstract. Com esse investimento, o valuation da Nomad atinge R$ 1,8 bilhão (US$ 365 milhões).
A Nomad já tinha captado US$ 32 milhões (cerca de R$ 160 milhões) em financiamento de venture capital em uma negociação liderada pela Stripes em maio de 2022, quando foi avaliada em US$ 200 milhões.
A nova captação acontece em um cenário de rodadas estáveis e down rounds (em que o valuation cai em relação ao que era anteriormente), o que indica que a Nomad conseguiu levantar capital contando com a confiança por parte dos investidores.
Dados do PitchBook até abril de 2023 mostram que gestores de mercados emergentes estão caminhando para levantar neste ano o volume mais baixo da década. Em 2020, os fundos captaram US$ 31 bilhões, igual a 2019. No ano passado, os fundos captaram US$ 37 bilhões, mas este ano, até abril, apenas US$ 2 bilhões.
Anteriormente, a Nomad havia levantado US$ 20 milhões em financiamento em rodada Série A liderada pela Monashees e pela Spark Capital em julho de 2021.
A Nomad entrou em operação no segundo semestre de 2020, co-fundada por Patrick Sigrist, Marcos Nader e Eduardo Haber. Sigrist, um dos co-fundadores do iFood há mais de uma década, foi anos depois um dos primeiros investidores do banco digital Neon e se aproximou do mercado de fintechs.
A Nomad nasceu com a proposta de ser inicialmente um banco que permitisse aos brasileiros ter uma conta em dólar - com o “sonho grande” de se tornar depois um hub financeiro mais abrangente.
Os fundadores usaram capital próprio para lançar a empresa e depois captaram duas rodadas que totalizaram cerca de US$ 7,5 milhões com anjos e fundos de venture capital. No final do primeiro ano de operação, de outubro para novembro de 2021, a empresa atingiu 100 mil contas.
De novembro de 2021 para abril de 2022, a startup atingiu 300 mil contas. Agora, a empresa acaba de ultrapassar a marca de 1 milhão de contas.
Parceiro de Sigrist, Lucas Vargas, CEO da Nomad, também tem um histórico de empreendedorismo. Durante MBA nos EUA, lançou um “Groupon americano”, que não foi adiante. Ele acabou se juntando ao Groupon no Brasil e também teve passagens em cargos executivos no Zap Viva Real e na OLX.
“Foi um processo desafiador [a captação da Nomad]. Existem menos rodadas acontecendo, então a abordagem já é de mais ceticismo de forma geral no mercado. É natural que, com esse ceticismo, nesse processo de apresentar a empresa, haja um escrutínio maior e uma necessidade de entendimento mais profundo de tudo o que está por trás”, disse Vargas em entrevista à Bloomberg Línea.
“O valuation aumentou. Se fosse em outro contexto, possivelmente teria aumentado mais, mas entendo, que independentemente disso, o investimento ajuda a acelerar e colher os frutos lá no futuro. Estamos menos preocupados com esse papo de curtíssimo prazo”, disse Vargas.
“Grande parte do valor que a startup constrói é aquilo que vai ser erguido, são as receitas futuras. Então há uma lupa maior nessas entregas futuras.”
O processo de captação dessa rodada começou há cerca de quatro meses, em um momento ainda mais difícil para o mercado de startups, segundo Vargas.
“Parece que estes últimos meses têm sido até um pouco mais otimistas, com a reação do mercado e de empresas listadas. Tudo isso ajuda, mas, quando começamos [as conversas], ainda era um momento de um pouco mais de pessimismo, com os investidores todos muito mais cautelosos.”
O novo dinheiro será direcionado para a expansão da plataforma de investimentos globais e para o lançamento de novos produtos, incluindo iniciativas na área de crédito (veja mais abaixo).
“Comparando um ano contra o outro, a empresa está em outro patamar. Vemos a captação que tínhamos feito no ano anterior, que era para fazer algumas entregas e acelerar o crescimento, o timing de mercado. Tudo isso ajudou a nova captação, mostra que de fato a empresa está crescendo.”
A Nomad adquiriu a startup de transferências internacionais Husky no ano passado, para ampliar as suas capacidades, de olho em atender brasileiros que recebem em dólar. A compra foi feita majoritariamente com pagamento em ações, mas há “uma pequena parcela da venda que é em caixa” e a Nomad tem “uma certa agenda de pagamentos ao longo do tempo que já estava previsto”, segundo Vargas.
Desde o início de 2023, a Nomad disse ter processado mais de R$ 1 bilhão em operações com cartão e mais de R$ 5 bilhões em transferências internacionais. A conta possui a cobertura do FDIC, órgão federal dos EUA que garante depósitos bancários até US$ 250 mil por conta.
A plataforma de investimentos da Nomad, funcionalidade que entrou em operação no começo de 2021 com carteiras administradas e, posteriormente, ganhou outros produtos de renda variável e de renda fixa, oferece atualmente mais de 2.000 alternativas de investimentos internacionais.
Como o cartão de débito oferecido pela Nomad não é brasileiro, o imposto em transações no exterior é menor. Para enviar dinheiro para a conta de investimento, a Nomad cobra um IOF de 0,38% e uma taxa operacional de até 2%, enquanto o envio de volta para o Brasil tem um IOF de 1,1% e uma taxa de até 2%, além de US$ 10. A taxa varia de acordo com o programa de fidelidade Nomad Pass.
“Temos uma abordagem mais de longo prazo. A Tiger entra agora e tem menos pressão por buscar alguma saída. No curto prazo, estamos bastante capitalizados. Na verdade, é um reforço que nos deixa mais tranquilos para fazer frente aos diferentes players já estabelecidos, como grandes bancos e fintechs globais, que são muito capitalizadas”, disse Vargas sobre o novo aporte.
Bancos como o C6 Bank, que tem o JPMorgan (JPM) como sócio com 40% do capital, e Itaú (ITUB4), que comprou a pioneira Avenue no ano passado, oferecem conta global em dólar, além de Inter (INTR) e XP (XP), entre outros.
As britânicas Wise e Revolut e a brasileira Remessa Online, comprada pelo Ebanx, também oferecem conta em dólar e em outras moedas. “Os nossos concorrentes são todos muito maiores que a gente, então, de alguma forma é um aporte que nos ajuda a criar uma fundação mais mais sólida para fazer frente ao que temos visto, ao movimento da indústria inteira de oferecer soluções complementares.”
Cartão de crédito no roadmap
A Nomad planeja em seu roadmap o lançamento de mais produtos de investimentos e serviços para pessoas jurídicas, além de negócios em crédito. A próxima etapa prevê a oferta de um cartão de crédito por meio de uma parceria com outra instituição no Brasil, ainda não revelada.
“Temos já experimentado e fizemos alguns produtos, parcelamentos. Entendemos que há a oportunidade de explorar esse ativo, que são os depósitos que os clientes têm com a Nomad”, disse Vargas.
A empresa já está em negociações para oferecer um cartão de crédito brasileiro - diferentemente do de débito, que é americano - e deve lançar os primeiros testes no começo do próximo ano.
“Entendemos que o cartão é uma oportunidade para os clientes que usam a Nomad para viagens internacionais, para que eles consigam comprar a passagem, fazer a reserva do hotel e participar de categorias de que hoje não participam.”
Segundo Vargas, emitir um cartão de crédito americano para brasileiros seria mais difícil porque os riscos interpretados pelos parceiros seriam maiores, e os limites de crédito, menores. “O cartão de crédito em dólar não necessariamente é a melhor opção para esses usos de compra de passagem, que normalmente é feita no Brasil e de forma parcelada”, explicou.
Hoje a startup tem cerca de 320 funcionários. A Nomad fez um corte em agosto do ano passado. “Estamos crescendo com mais cautela desde então, mas com o novo investimento devemos expandir o time.”
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