Este empreendedor fez de sua startup latina uma empresa global. E conta o caminho

Em entrevista à Bloomberg Línea, Guibert Englebienne, cofundador da tech Globant, disse por que diferentes startups argentinas têm alcance global apesar da economia local em crise frequente

Este empreendedor fez de sua startup latina uma empresa global. E conta o caminho
19 de Abril, 2024 | 06:03 AM

Bloomberg Línea — Ao longo dos anos, diferentes startups argentinas se provaram globais e com atuação de destaque em suas respectivas áreas de atuação, como Mercado Livre, Decolar e Globant, a despeito de adversidades como uma economia local que enfrentou sucessivas crises nas últimas duas décadas.

Para Guibert Englebienne, co-fundador da Globant (GLOB), empresa de tecnologia listada na NYSE com valor de mercado de quase US$ 8 bilhões, a explicação é a busca por solucionar problemas que existem em qualquer parte do mundo com modelos de negócios que podem ser replicados.

Englebienne disse que, embora a Argentina nunca tenha oferecido um ambiente de negócios exatamente estável, momentos de adversidade também servem como ambiente de oportunidades.

“Quando começamos, queríamos criar oportunidades em troca de exportar software. E temos feito isso em lugares diferentes. Agora estamos em 35 países e continuamos a crescer em todo o mundo e muito na América Latina, inclusive no Brasil, que é um grande mercado para nós”, disse o empreendedor argentino em entrevista à Bloomberg Línea durante o South Summit, em Porto Alegre, no mês passado.

PUBLICIDADE

Englebienne destacou ainda o potencial transformador da IA (Inteligência Artificial) para ampliar oportunidades e acelerar processos, tanto em nível individual quanto organizacional, com uma visão mais construtiva, portanto, do que a de quem alerta para o risco de aumento do desemprego.

Veja abaixo a entrevista com Guibert Englebienne, editada para fins de concisão e clareza:

A Globant é uma das poucas startups da América Latina que de fato é global. Quais as explicações para essa abrangência?

Nosso negócio é algo que podemos facilmente traduzir para remodelar o potencial de cada país do mundo. Acreditamos que o talento hoje e a tecnologia podem ser organizados em qualquer lugar.

Quando começamos, queríamos criar oportunidades em troca de exportar software. E temos feito isso em lugares diferentes. Agora estamos em 35 países e continuamos a crescer em todo o mundo e muito na América Latina, inclusive no Brasil, que é um grande mercado para nós.

O Brasil responde por 38% da nossa receita, dos 23% pelos quais a América Latina responde globalmente. Temos uma visão muito global que tradicionalmente não tem sido o ponto forte de muitas empresas em nossa região.

Que conselho você daria às startups da Argentina que passam pelo segundo ano consecutivo de recessão. Você espera uma recuperação?

PUBLICIDADE

A Argentina nunca teve um cenário extremamente estável. Apesar disso, conseguimos ver muitas histórias empreendedoras de sucesso. E eu acredito que um tema comum de todas elas é que essas empresas não estão olhando para o curto prazo mas para um longo prazo. Elas não estão olhando para o mercado local, são mais globais.

E histórias como o Mercado Livre, a Globant, a Decolar e outras nos mostram que temos oportunidade de realmente ter uma ideia e explorar em nossos países, mas com rápido crescimento global, como é o caso da nossa empresa.

Nós começamos a empresa logo após a severa desvalorização do peso em 2002, e as pessoas estavam migrando da Argentina. E acredito que sempre que as coisas ficam difíceis, você encontra oportunidades, de modo que você precisa manter os olhos abertos.

E acho que isso vai mudar. Estou muito positivo sobre as oportunidades que o novo governo traz em termos de libertar o setor privado de um peso. E eu acho que isso se provará com uma recuperação razoavelmente rápida se nós, se o governo conseguir impulsionar as reformas que acredito serem muito interessantes.

Resumindo, boas empresas podem ser construídas em todos os cenários.

Um cenário bom facilitará a vida de muitos empreendedores, tornando-os não apenas uma história de sucesso, mas uma coisa mais comum de acontecer.

Parece que a Argentina não é mais tão barata para estrangeiros neste momento. Como você vê essa mudança?

Acho que a Argentina precisa se ajustar um pouco. Nos últimos meses, a inflação tornou a Argentina repentinamente cara. Os preços precisarão se ajustar. Acho que a Argentina é um país maravilhoso, com muitas oportunidades. Muitas empresas não olharam para a Argentina durante os últimos anos, mas agora acredito que é a hora de apresentar o seu lado nisso.

Tem-se falado muito sobre o risco de aumento de demissões porque a IA amplia a produtividade em empresas de tecnologia. Você concorda?

Estamos muito positivos sobre como isso vai expandir nossas oportunidades. Acreditamos que, agora, em nível individual, é muito fácil ter uma ideia do que a IA pode trazer. O ano passado foi o primeiro ano em que a IA de repente se tornou útil e acessível para pessoas sem nenhum conhecimento prévio. E isso representou um grande marco.

Há nove anos decidimos treinar 100% do nosso pessoal em algo em que trabalhamos há anos: 100% do nosso time global é capaz de identificar os vários tipos de problemas que poderiam ser resolvidos com IA.

Somos como uma organização híbrida em que os humanos se associam à IA para fazer coisas, desde o recrutamento até a construção de equipes, expandindo nossa cultura e, claro, a essência do que fazemos, que é criar tecnologia muito mais rapidamente. Como resultado, vimos muito impulso e podemos fazer as coisas mais rapidamente.

Nós também podemos fazer as coisas de maneira diferente. 2023 se tornou um ponto de virada para a tecnologia hoje, há aplicativos com os quais você pode sonhar que são totalmente diferentes do que você poderia sonhar há um ano.

Não estamos apenas usando novas ferramentas para avançar mais rapidamente para a tecnologia que precisamos construir, mas, também, a tecnologia que precisamos construir deveria ser extremamente diferente. E isso é uma oportunidade.

Além disso, você vê áreas que tradicionalmente estavam fora da ponte de TI, por exemplo, departamentos jurídicos, comerciais ou coisas em que você precisa trabalhar muito com documentos. Agora, com IA, isso abre muito mais oportunidades.

Você mora no Uruguai. Com o novo governo, pensa em voltar para a Argentina?

Como um argentino, sempre adoraria morar no país. Eu acredito que cada um deve fazer a sua parte de um lado. Os empresários precisam construir companhias que possam crescer e ter sucesso em todos os lugares. E, por outro lado, os governos precisam criar condições para que os empresários o façam nos seus próprios países. Continuamos investindo muito.

Embora eu não more pessoalmente na Argentina, continuamos investindo pesadamente no país, onde somos a empresa líder em tecnologia. É o nosso país. Continuaremos sempre a crescer lá.

Vemos no South Summit o grande impulso empreendedor da América Latina. Toda a situação global fará com que a América Latina seja a próxima grande novidade em termos de investimento. Estou muito feliz por estar aqui e compartilhar tempo com todos esses empreendedores incríveis.

Leia também

Para Itaú BBA, Nvidia é ‘double outperform’ e se tornou mais que uma empresa de chips

Isabela  Fleischmann

Jornalista brasileira especializada na cobertura de tecnologia, inovação e startups