Não só multas: como autoridades nos EUA pretendem reduzir o poder do Google

Big tech se defendeu de investigações na Europa com pagamento de 6,5 bilhões de euros, mas abordagem da Justiça nos EUA pode alterar a forma como opera seus negócios

Por

Bloomberg — Os desafios antitruste do Google (GOOGL) estão voltando para assombrar a gigante de tecnologia.

Embora a empresa tenha se defendido das intervenções antitruste europeias ao pagar 6,5 bilhões de euros (US$ 7,1 bilhões), as autoridades norte-americanas agora miostram seus poderes - e a parte mais dolorosa para a unidade da Alphabet não serão as multas, mas os golpes nos principais negócios que geram grande receita.

Em um intervalo de três dias, um juiz federal ordenou que a empresa abrisse sua lucrativa loja de aplicativos para os rivais e o Departamento de Justiça (DoJ, na sigla em inglês) disse que pode tentar forçar a gigante da tecnologia a desmembrar algumas áreas para remediar o monopólio em buscas.

Leia também: EUA estudam separação de negócios do Google para reduzir o domínio nas buscas

Embora uma separação possa ser difícil de vender para o juiz de Washington que supervisiona o caso de domínio em buscas pelo Departamento de Justiça, o Google, sem dúvida, analisa mudanças na forma como vem operando há muito tempo, disseram especialistas em antitruste.

O Departamento de Justiça tenta encontrar “remédios que não apenas reintroduzam a concorrência na busca mas que também garantam que, à medida que o mercado muda, o Google não volte a se entrincheirar”, disse Abiel Garcia, advogado antitruste e sócio da Kesselman Brantly Stockinger.

As medidas corretivas podem fazer com que o Google “repense e reavalie sua estratégia de negócios até certo ponto, mas não é que deixaremos de ter um Google”.

O Google criticou a proposta inicial do Departamento de Justiça como "radical", dizendo que ela teria "consequências significativas e não intencionais para os consumidores, as empresas e a competitividade americana".

As ações da empresa caíram mais de 15% desde que atingiram o recorde de US$ 191,18 em 10 de julho.

“Há um claro balanço quando se trata do lado antitruste das coisas e do escrutínio que a Alphabet recebe”, disse o analista sênior do setor de tecnologia da Bloomberg Intelligence, Mandeep Singh, na Bloomberg TV.

Dhaval Moogimane, sócio sênior da empresa de consultoria West Monroe, disse que forçar o Google a compartilhar seu índice poderia ajudar não apenas os rivais de busca mas também as empresas de IA que querem entrar no mercado.

O compartilhamento dos dados de pesquisa “abre certamente a concorrência, que é a intenção aqui”, disse ele. “É o molho secreto para o Google.”

Daniel Morgan, gerente de fundos da Synovus Trust comparou a exigência de que o Google compartilhe seus dados com a exigência de que a Coca-Cola forneça sua receita a outros fabricantes de refrigerantes.

"O DOJ está procurando reduzir o fosso para a entrada de outros rivais de busca", disse Morgan. O "algoritmo proprietário do Google, que tem servido como vantagem competitiva como empresa de busca dominante no mundo, se tornaria disponível como um tipo de modelo de código aberto para seus concorrentes".

Rebecca Allensworth, professora da Faculdade de Direito de Vanderbilt, que acompanhou de perto o processo, diz que acha “muito improvável” que o juiz distrital dos Estados Unidos, Amit Mehta, opte por uma separação.

Grande parte do caso do Departamento de Justiça se concentrou no acordo de US$ 20 bilhões do Google com a Apple (AAPL) para ser o padrão de pesquisa no iPhone, disse ela, e não no Chrome ou no Android — os produtos do Google que o DOJ identificou como os que podem ser potencialmente desmembrados.

Mehta seguiu de perto o caso da Microsoft (MSFT), disse ela, em que o Departamento de Justiça processou com sucesso a fabricante do Windows em 1998 por monopolizar sistemas operacionais de computador. O juiz desse caso inicialmente pediu que a Microsoft deveria ser desmembrada antes de a decisão ser anulada em um recurso.

“Não é possível que esse juiz desmembre o Google nesse caso”, disse Allensworth sobre Mehta.

John Kwoka, economista da Northeastern University, que pesquisou extensivamente os remédios antitruste, disse que a separação "deveria estar na mesa" pelo menos como um "sinal" para o Google e outras empresas com casos de monopolização pendentes de que as autoridades antitruste não aceitarão uma resolução fraca.

Com uma solução de conduta, a empresa tem o incentivo para se esquivar, e até mesmo o acesso obrigatório aos dados pode ser complicado devido a questões sobre quem recebe os dados e quanto, disse ele.

“O histórico de soluções estruturais é ótimo”, disse Kwoka, observando que o rompimento da AT&T ocorreu após anos de tentativas infrutíferas de corrigir os problemas com soluções de conduta. “Pode haver muitos danos colaterais se as autoridades responsáveis pela aplicação da lei esperarem para agir.”

Bill Kovacic, professor de antitruste da Faculdade de Direito da Universidade George Washington, disse que o processo do Departamento de Justiça foi um "esforço consciente para enquadrar" a questão para o juiz, "oferecendo a ele um menu que vai do mais suave ao mais picante".

Não obstante o fato de o Google rotular a separação como uma solução “radical”, Kovacic observou que as empresas hoje têm “muita experiência em montar e desmontar empresas”.

E algumas das propostas do Departamento de Justiça - como a exigência de compartilhar alguns dos dados de pesquisa da empresa - já estão em vigor na Europa como parte de uma implementação de novas regras de gatekeeper digital, disse ele.

Kwoka e Allensworth também concordaram que o Departamento de Justiça pode estar tentando usar a opção de separação como uma jogada de abertura para que Mehta esteja mais inclinado a escolher outra solução que lhes agrade, como o compartilhamento de dados.

"Essa seria uma solução realmente progressiva", disse Allensworth. "Compartilhar o índice seria uma maneira boa e óbvia" de resolver os problemas.

Veja mais em Bloomberg.com

Leia também

Rodadas da semana: fintechs Asaas e Tuna recebem investimentos

Caixa planeja fundo de VC com R$ 100 milhões para se aproximar de startups

Este escritório decidiu apostar no mercado de venture capital. Agora colhe os frutos