NotCo ajusta operação no Brasil e prioriza inovação, distribuição e B2B, diz CEO

Em entrevista à Bloomberg Línea, André Weinmann fala da estratégia da operação no país com medidas que já resultaram em aumento de 40% do Ebitda e explica o foco em buscar o breakeven

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Bloomberg Línea — A chilena NotCo, de produtos plant based, tem reposicionado a operação no Brasil em busca de ganho de eficiência e rentabilidade da operação. Os últimos dez meses foram de rearranjo, com novas estratégias para ampliar a distribuição, readequar o portfólio e apresentar novos produtos.

À frente das mudanças está o brasileiro André Weinmann, que entrou para a companhia em abril passado. Ele substituiu o argentino Mauricio Alonso, que ficou na liderança entre 2021 e 2024.

“Nós sabemos que nos últimos anos o dinheiro fácil acabou. E todo o trabalho foi feito para conseguirmos deixar a empresa mais eficiente e com rentabilidade. Esse foi o nosso foco no ano passado: conseguir melhorar a produtividade em todas as áreas”, disse o CEO à Bloomberg Línea.

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Fundada em 2015 pelos empreendedores Karim Pichara, Pablo Zamora e Matias Muchnick, a startup ainda trava uma batalha na operação para chegar ao lucro em um mercado que continua a crescer, mas sem o hype de anos atrás.

Weinmann é o quarto presidente da operação local da foodtech desde 2019. Ele busca usar a experiência de 30 anos na indústria de bens de consumo, que inclui o comando de operações como a da fabricante de cigarros Philip Morris e a da Mondelez, dono de marcas como Trident, Lacta e Oreo, para guiar os passos da NotCo no Brasil.

O mercado de plant-based desacelerou nos últimos anos, enquanto, por outro lado, o universo das startups convive com recursos mais escassos de venture capital.

Os dois elementos adicionam doses extras de pressão para um modelo de negócio que procura se provar em um mercado de alimentos em que compete com multinacionais que também ingressaram no “jogo”, a exemplo da Coca-Cola com a marca Fairtale, como contado pela Bloomberg News.

Nos últimos dias, a NotCo anunciou o fechamento dos seus escritórios em Nova York e que a Kraft Heinz passará a vender os seus produtos nos Estados Unidos e no Canadá.

O acordo é paralelo à joint venture assinada entre as duas empresas em 2022 para produzir versões à base de plantas de clássicos da multinacional com sede em Pittsburgh.

A NotCo chegou ao status de unicórnio - empresa com valuation igual ou superior a US$ 1 bilhão - em 2021, após uma captação de US$ 235 milhões em rodada Série D conduzida pela Tiger Global.

O aporte representou um valuation de US$ 1,5 bilhão. Pouco mais de um ano depois, a startup recebeu o seu último investimento via equity, uma extensão de US$ 70 milhões.

No cap table estão outros players relevantes como a L Catterton, fundo de private equity da família Arnault, de Bernard Arnault, fundador e CEO da LVMH, e a Bezos Expeditions, de Jeff Bezos.

Apostas locais

Para começar a endereçar os principais desafios da operação local, o executivo realizou alterações no time: trouxe profissionais com perfis mais alinhados ao momento da companhia, ao mesmo tempo em que investiu no aumento dos canais de distribuição e no relançamento de produtos.

A NotCo também anunciou o encerramento da divisão de proteínas congeladas no país, que incluía produtos como hambúrguer à base de plantas.

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De acordo com a Euromonitor, o mercado de proteínas congeladas deve crescer 318% entre 2023 e 2028 e movimentar R$ 4,7 bilhões. É um segmento em que marcas de grandes empresas ou já consolidadas, como a Incrível, da JBS, e a Futuro Burger, têm levado vantagem.

As mudanças fizeram com que a foodtech aumentasse em 40% o Ebitda (métrica de geração de caixa operacional) em comparação com os números de 2023. A startup não abre os números.

Além da Not Milk, o principal produto da marca no Brasil, a operação local aposta agora em bebidas proteicas, mercado em expansão no Brasil após o case construído pela Danone com o YoPro, como uma das avenidas de crescimento.

Novo momento

De acordo com dados da Euromonitor, as bebidas prontas como shakes devem crescer mais de 90% nos próximos cinco anos, após um avanço de mais de 270% desde 2019. Os mais recentes lançamentos da NotCo foram as versões Panqueca de Banana com Canela e Morango com Tâmara.

“Eu, como uma pessoa muito cética, me perguntava se essas inovações iriam funcionar ou acabariam como um furo na água. E, muito pelo contrário, quando olhamos os nossos números de participação de mercado, o maior crescimento veio das inovações”, afirmou Weinmann. “Nós percebemos o quão é importante para o consumidor dessa categoria buscar coisas completamente diferentes.”

A NotCo usa como base de desenvolvimento de produtos plant-based o Giuseppe, uma IA proprietária que reúne uma base de 2.000 ingredientes e que é capaz de avaliar e sugerir combinações de aroma, sabor e textura que agradem ao paladar e entreguem os benefícios propostos nas formulações.

O shake de panqueca de banana é produzido, por exemplo, com proteína de soja e de ervilha, pasta de amendoim, suco concentrado de abacaxi, amido modificado e fibra de chicória.

A tecnologia permite que a foodtech encurte o processo de desenvolvimento dos produtos, com chegada ao mercado com mais agilidade. Além disso, tem conseguido prover produtos mais eficientes, com quantidade de proteína semelhante à de competidores, 16 gramas, porém com menor quantidade de carboidratos, 3,5 gramas.

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Entre os desafios da marca está levar essas informações a mais consumidores e ampliar os canais de distribuição dos produtos. Os itens estão disponíveis em 3.400 pontos de vendas pelo país, o que representou um aumento de 70% - em 2023, o número havia sido de 2.000.

“Nós temos uma distribuição muito tímida se olharmos o tamanho do Brasil”, disse o CEO. Os primeiros passos consistiram em ampliar a presença em grandes contas, com a chegada em redes como o Assaí e o Guanabara.

“Mas nós vimos que isso não era suficiente. Fizemos outro trabalho bastante importante com foco nas contas regionais, no canal digital, e, mais recentemente, com distribuidores”, contou Weinmann.

“Neste ano, temos o foco em desenvolver o canal de distribuidores e, assim, conseguirmos naturalmente melhorar a rentabilidade e atender com mais eficiência contas regionais importantes nas quais não estamos presentes por sermos uma foodtech. Não termos uma estrutura grande como uma Nestlé ou uma Unilever.”

Além da “conversa” com um maior número de consumidores, a movimentação será importante para reduzir a concentração da marca ao estado de São Paulo, em que gera cerca de 50% da receita.

“No curto prazo, nós enxergamos um crescimento muito importante no Rio de Janeiro, que é o segundo maior mercado do país, e temos planos de avançar em outros estados.”

Novos rumos do Giuseppe

Outra avenida de crescimento que a foodtech pretende acelerar é a do modelo de B2B, em que oferece a tecnologia do Giuseppe para que outras companhias aprimorem ou criem novos produtos.

Globalmente, a operação é comandada pela brasileira Giulia Braghieri, diretora de Desenvolvimento de Novos Negócios B2B da NotCo, e desembarcou no país nos últimos meses de 2024.

Em parceria com a foodtech, a Kraft Heinz já lançou produtos em oito categorias, como mac & cheese e salsichas, desde 2022. A startup também anunciou um acordo com a Mars.

“Se pensarmos nas dez maiores empresas de alimentos no mundo, nós estamos em conversa com a maioria delas ou com projetos já rodando”, disse Braghieri sobre o alcance da NotCo.

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No mercado doméstico brasileiro, a NotCo quer fechar negócios também com marcas locais que buscam entregar novas opções aos consumidores, seja na substituição por ingredientes mais saudáveis, seja com versões diferentes. A nova unidade vai além do plant-based.

“Dos projetos em que estamos trabalhando hoje em B2B, 90% deles não são exclusivamente plant-based”, afirmou a executiva. ”Ajudamos essas empresas a criar a versão NotCo dos produtos delas. É uma versão melhorada, em que conseguem aprimorar o perfil nutricional e deixá-la mais sustentável.”

Os clientes que batem à porta da startup buscam por agilidade no desenvolvimento e redução de vieses em relação aos ingredientes que irão compor os novos produtos, segundo ela.

“Enquanto as empresas em que eu trabalhava demoravam de 18 a 36 meses para lançar algum tipo de produto - e às vezes atrasavam -, nós desenvolvemos um chocolate em quatro meses e um sorvete em três semanas”, afirmou Weinmann.

Dentro da NotCo, a perspectiva é que a nova área possa transformar a operação nos próximos três anos e se tornar o principal negócio da startup.

“Nós estamos trabalhando para caminhar com as próprias pernas”, resumiu o CEO.

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