Esta startup brasileira atraiu o fundo de VC de uma gigante global de consumo

Mais Mu, de alimentos saudáveis, é avaliada em R$ 125 milhões pre-money com aporte da Btomorrow Ventures, CVC da britânica BAT, diz o cofundador Otto Guarnieri à Bloomberg Línea

Produtos da startup brasileira Mais Mu, que acaba de receber aporte do fundo de CVC da britânica BAT (Foto: Divulgação)
13 de Novembro, 2023 | 05:15 AM

Bloomberg Línea — Com um negócio que aposta na alimentação saudável e em suplementos, uma startup brasileira, a Mais Mu, acaba de atrair um dos maiores CVC (Corporate Venture Capital) da indústria de bens de consumo do mundo como sócia, a BTV (Btomorrow Ventures), que pertence à BAT (British American Tobacco).

A rodada de montante não revelado avalia a Mais Mu em R$ 125 milhões pre-money, ou seja, antes do aporte. A negociação durou cerca de um ano. Os recursos serão liberados em tranches ao longo de três a quatro anos.

A entrada da BTV representa um momento significativo na trajetória da startup, dado que, desde o começo, os sócios fundadores buscaram manter o controle da startup - eles detinham o equivalente a 85% do capital pré-rodada, apesar de já terem levantado recursos em diferentes momentos. Com o aporte, seguem acima de 50%.

“O Corporate Venture Capital nos pareceu o melhor dos dois mundos, trazendo funding e também estratégia para o negócio, mas sem que haja um executivo deles dentro da nossa gestão”, disse Otto Guarnieri, cofundador da Mais Mu, em entrevista à Bloomberg Línea. Ele ressaltou o aprendizado já iniciado com times que vão de vendas a marketing da empresa britânica.

PUBLICIDADE

Haverá também, com o tempo, uma pessoa da BTV no conselho de administração da startup.

Até a chegada da BTV, houve em cinco anos apenas uma entrada de fundo de venture capital, da Grão, de valor não revelado; além disso, houve rodadas de captação por meio de crowdfunding - são centenas de investidores-anjo. O valor total levantado anteriormente foi da ordem de R$ 10 milhões.

“Em 2020, não nos víamos como uma empresa com uma tese para VC, por sermos de bens de consumo, nem para private equity, porque não tínhamos tamanho para atrair interesse”, disse Guarnieri sobre as modalidades antes consideradas.

Com o crescimento da Mais Mu, que deve encerrar o ano com receitas da ordem de R$ 60 milhões e que já atingiu o breakeven, os sócios concluíram que era momento de mudar a estratégia de captação, mas sem abrir mão de algumas premissas.

“Não queríamos um fundo de private equity, por exemplo, para evitar uma ingerência externa na condução dois negócios ou até um executivo de fora”, disse Guarnieri. “Nem um M&A.”

No acordo com a BTV, não há cláusula de compra ou venda obrigatória da startup.

Alimentação saudável e cigarros?

A escolha da BAT, uma gigante mundial em cigarros e tabaco, pode parecer contraditória à primeira vista para uma startup de alimentação saudável, mas teve um racional “bem pensado” que levou em conta também eventuais riscos de reputação, segundo os sócios.

PUBLICIDADE

Guarnieri explicou que a Mais Mu ajudará justamente a trazer uma destinação mais saudável aos recursos da BAT e que outras investidas com essa finalidade não teriam reportado efeitos adversos. Além disso e mais importante, há um ganho mais evidente com a parceria, afirmou.

“Nós vendemos muito para supermercados, farmácias e lojas de produtos naturais. São os nossos principais canais de distribuição. Qualquer parceria que acertássemos com empresas de bens de consumo tradicionais geraria uma redundância grande”, disse Guarnieri. São cerca de 11.000 pontos de venda no país, além de presença em certos países da Europa e do Oriente Médio.

Segundo ele, por outro lado, enquanto a BAT tem venda reduzida em supermercados e praticamente inexistente em farmácias e lojas de produtos naturais, dispõe de ampla presença em lojas de conveniência, padarias e até bancas de jornal, nas quais a Mais Mu não tinha distribuição.

Os sócios Anderson Mulin, Alexandre Capella, Otto Guarnieri e Antonio Neto, da startup brasileira Mais Mu, de alimentos saudáveis e suplementos (Foto: Divulgação)

“É uma grande oportunidade para impulsionarmos nossa marca e nossos produtos para lugares que antes eram impossíveis de alcançar. Enxergamos uma complementaridade no acordo.” No caso da BAT Brasil, a rede de distribuição chega diretamente a cerca de 140 mil pontos de venda, disse.

São pontos de venda igualmente de difícil acesso para concorrentes, segundo ele.

Expansão para outros mercados

O cofundador disse que o sucesso da parceria de distribuição pode abrir caminho também para uma expansão da startup inicialmente pela América do Sul, dada a presença da BAT globalmente. Um segundo momento poderia incluir outros mercados na Europa e na Ásia.

Os recursos do aporte serão utilizados para financiar o crescimento da Mais Mu, de marketing à contratação de profissionais, de olho no esperado aumento da demanda.

A Mais Mu foi fundada por Guarnieri e Antonio Neto em 2014, como uma startup que oferecia um mix de proteínas em pó e pretendia quebrar o estigma de suplementos.

Mais tarde entraram como sócios Anderson Mulin e Alexandre Capella e a startup ampliou o portfólio de produtos, que vão de snacks e barras de proteína a bebidas prontas.

Do lado da BTV, ou seja, especificamente da Btomorrow Ventures, segundo Guarnieri, a Mais Mu representa o primeiro caso do fundo - que tem mais de 20 investidas - em que o acordo vai além do aporte e inclui também a rede de distribuição, o que se traduz em um interesse estratégico mais amplo.

A BAT Brasil já faz a distribuição de produtos de alimentos e bebidas de outras marcas, rentabilizando a sua operação para além do seu portfólio tradicional. O contato inicial com a Mais Mu partiu da BTV.

“Temos o objetivo global de oferecer aos consumidores um portfólio de produtos multicategoria e este investimento é um marco importante”, disse Victor Loria, presidente da BAT Brasil e Latam South, em comunicado.

“A Mais Mu é uma das startups brasileiras mais promissoras, com marca forte, ótima gestão e base de clientes fiéis. Esperamos que essa parceria única com a BAT Brasil, por meio do investimento da Btomorrow Ventures, impulsione a expansão da Mais Mu a novos patamares”, disse Lukasz Garbowski, diretor de Investimentos da BTV, também em comunicado.

Este não foi o primeiro investimento da BTV no Brasil. Anteriormente, o CVC da BAT investiu na startup de logística Uello, que depois foi adquirida pela Renner no ano passado.

Leia também

Petz aposta em super app para clientes e rejeita ‘M&A do Excel’, diz CEO

Domo.VC mira nova fase e terá captação para fundo pela 1ª vez também no exterior

Chocolate ESG: a aposta da Dengo no modelo que fez da Natura uma gigante global

Marcelo Sakate

Marcelo Sakate é editor-chefe da Bloomberg Línea no Brasil. Anteriormente, foi editor da EXAME e do CNN Brasil Business, repórter sênior da Veja e chefe de reportagem de economia da Folha de S. Paulo.