Esta fintech chegou ao Ebitda positivo e busca ir além de meios de pagamento

A iugu, que tem o Goldman Sachs como investidor, escolheu como estratégia desenvolver serviços de tecnologia de maior valor adicionado, diz o CFO, André Luiz Gonçalves, à Bloomberg Línea

Região da Faria Lima, em São Paulo, setembro de 2022. Foto: Victor Moriyama/Bloomberg
10 de Junho, 2024 | 05:00 AM

Bloomberg Línea — Nos últimos anos, o mercado de fintechs no país tem se mostrado um dos mais concorridos da economia, dado o número de players e a competição com bancos digitais e incumbentes. O desafio aumentou com o encarecimento do custo de capital no mundo e no Brasil, o que levou a indústria de startups de modo geral a buscar refinar o modelo de negócios e a perseguir o breakeven da operação antes do planejado.

Para a iugu, fintech que atende o segmento B2B de médias e grandes empresas e que conta com investimento do Goldman Sachs, esse caminho foi alcançado com a visão de transformação para uma empresa de tecnologia financeira que oferece serviços de maior valor agregado. Números recém-divulgados sinalizam que a estratégia começou a se refletir nos resultados.

A fintech encerrou 2023 com um crescimento anual de 62% na receita líquida, totalizando R$ 233 milhões. O volume total transacionado saltou de R$ 13 bilhões em 2022 para R$ 35 bilhões em 2023. E, pela primeira vez, a fintech entregou um Ebitda (métrica de geração de caixa operacional) positivo em um ano completo, de R$ 2,8 milhões. No ano anterior, esse indicador havia sido negativo em R$ 17 milhões.

“A iugu enxerga que meios de pagamento, como boleto, cartão de crédito e Pix, se tornaram commodities. A estratégia consiste em oferecer ao menor custo serviços de valor adicionado que tenham margem bruta maior”, disse André Luiz Gonçalves, CFO da fintech, à Bloomberg Línea.

PUBLICIDADE

Leia mais: Unicórnio Olist agora aposta em serviços financeiros para o e-commerce, diz CEO

São serviços que, sob a ótica da demanda, possam melhorar a eficiência dos negócios dos clientes e criar condições para o seu crescimento (veja mais abaixo), afirmou.

O executivo disse que a disciplina de capital tem sido outro pilar da estratégia e citou o dado de que, apesar do crescimento, o quadro de colaboradores se manteve estável: havia 244 pessoas ao fim de 2023, versus 240 um ano antes.

“Fazemos um acompanhamento sistemático e periódico das premissas orçamentárias definidas para cada exercício, que inclui a análise pelo conselho”, disse Gonçalves.

O aumento da lucratividade e a busca por um resultado mais robusto em geração de caixa operacional foram colocados como prioridades na definição da estratégia para o ano de 2024 pelo conselho e pela diretoria, mais do que o crescimento - que deve ficar abaixo do alcançado em 2023, afirmou o CFO.

Gonçalves chegou à iugu pouco depois do aporte de R$ 120 milhões em Série B liderada pelo Goldman Sachs com sua divisão de Merchant Banking em setembro daquele mesmo ano.

Leia mais: Kanastra, startup para investimentos alternativos, compra Limine e mira boom de FIDC

PUBLICIDADE

Naquele momento, segundo ele, a missão na fintech era estruturar times e processos para o financiamento do crescimento da operação tendo em vista sua experiência de ter trabalhado em empresas listadas como CSN, Fibria Celulose e Votorantim na área de finanças e no mercado de capitais, em operações como ofertas de ações primárias e emissão de dívida no Brasil e no exterior.

Ao longo de sua trajetória de doze anos, a iugu passou de uma empresa com soluções para a gestão financeira de clientes com foco em meios de pagamento - essencialmente o boleto - para uma plataforma de tecnologia financeira que conta com fontes adicionais de receitas e uma marca mais conhecida.

Diversificação das receitas

“Principalmente a partir de 2020, buscamos não só diversificar as fontes de receita como aumentar a eficiência operacional”, disse Gonçalves.

O executivo destacou a evolução da margem bruta ao longo dos trimestres, algo que relacionou a uma preocupação do fundador e CTO, Patrick Negri, em desenvolver tecnologia proprietária em produtos que foram gradualmente incorporados à plataforma, reduzindo a necessidade de fornecedores.

“Isso nos garante uma competitividade de custos importante.”

André Luiz Gonçalves, CFO da iugu, fintech que conta com investimento do Goldman Sachs desde 2020 por meio de sua divisão de Merchant Banking (Foto: Divulgação)

São serviços nativos de tecnologia associados a meios de pagamento, como antecipação de recebíveis de cartão de crédito e gestão de capital de giro - e a oferta de infraestrutura financeira.

Um exemplo específico foi o desenvolvimento de uma tecnologia própria para boletos, o que permitiu que a fintech pudesse abrir mão do uso do equivalente do Banco do Brasil e do Bradesco.

Outro teve origem na decisão de se habilitar para operar o Pix desde o seu início de operação pelo Banco Central em novembro de 2020 como “participante direto, igualmente com redução de custos - condição viabilizada pela licença para atuar como instituição de pagamento (IP) em agosto do mesmo ano.

A visão do fundador é transformar a iugu em uma plataforma de serviços financeiros B2B variados, nativos ou de terceiros, cuja integração seja realizada de maneira automática de forma digital.

O ganho de eficiência se traduziu na capacidade de financiar a operação com os investimentos de 2020 e a sua própria geração de caixa, sem que houvesse necessidade de nova captação via equity.

Isso incluiu a aquisição, em setembro de 2022, de parte da carteira de clientes e da marca de uma fintech concorrente, a Juno. A integração do portfólio e das plataformas se deu no começo de 2023.

Leia mais: Com foco no cliente tech, Itaú BBA chega a 1.500 startups e prevê onda de M&As

Para financiar a antecipação de recebíveis, a iugu realizou a emissão de duas séries de um FIDC (Fundo de Investimento em Direitos Creditórios), de R$ 100 milhões no segundo semestre de 2022 e de R$ 75 milhões no ano seguinte. Nas duas operações, o Bradesco adquiriu as cotas sêniores.

“Os clientes conseguem antecipar recebíveis sem pegar no telefone, por meio de APIs que automatizam todo o processo”, disse o executivo ao citar a priorização da experiência do cliente.

São empresas de setores como educação, saúde e de prestação de serviços diversos de contabilidade ao imobiliário -, que, segundo ele, chegaram a um patamar em termos de tamanho em que podem enfrentar dificuldades para continuar a crescer se não tiverem uma gestão financeira bem administrada.

Entre os clientes da iugu estão empresas como Conta Azul, Eduzz, Alice, Olist, Ingresso Prime, Sestini, Contabilizei, Suno, Clinicorp e FreteBras.

Em geral, muitos dos potenciais clientes recebem atendimento considerado aquém de suas necessidades de bancos tradicionais, segundo Gonçalves. “Uma empresa que depende do internet banking para realizar suas operações não vai conseguir, por exemplo, parametrizar regras para o seu negócio. É nesse ponto que enxergamos oportunidade para entregar valor.”

Leia também

Stone, em nova fase, quer avançar além da maquininha e mira mercado de R$ 100 bi

Fintech Qred Brasil capta R$ 25 milhões em FIDC e prevê ampliar crédito em 60%

Este brasileiro ganhou uma bolsa de Peter Thiel para largar Stanford e empreender

Marcelo Sakate

Marcelo Sakate é editor-chefe da Bloomberg Línea no Brasil. Anteriormente, foi editor da EXAME e do CNN Brasil Business, repórter sênior da Veja e chefe de reportagem de economia da Folha de S. Paulo.