Bloomberg Línea — Com o avanço da oferta de programas de fidelidade no mercado brasileiro, que se estendem de cartões de bancos a empresas do varejo, a Smiles, controlada pela Gol Linhas Aéreas (GOLL4), aposta na flexibilidade para uso dos benefícios e na agilidade de suas operações para manter a liderança do setor.
Para 2025, as principais apostas para continuar a crescer são as verticais de hotéis e de benefícios corporativos, contou a CEO da Smiles, Carla Fonseca, em entrevista à Bloomberg Línea.
“O setor vem mudando muito. Não só as companhias aéreas mas também os bancos, os supermercados e o varejo em geral buscam fidelizar o cliente. O mercado está mais maduro, no geral, e nós temos acompanhado essa tendência”, disse a executiva.
A CEO da Smiles, no cargo desde janeiro de 2022, disse que o acúmulo de milhas tem levado o brasileiro a usar mais o cartão de crédito, sendo as viagens aéreas seguem como principal objeto de resgate.
“Os clientes que acumulam pontos querem viajar, isso não mudou. Os bancos são nossos concorrentes e também nossos parceiros, pois a Smiles é uma opção para viagens”, afirmou.
Um exemplo é a parceria recém-anunciada com o Inter para a troca de pontos Loop por milhas da Smiles para clientes do segmento de alta renda do banco digital, o Win.
Em 2024, a Smiles completou 30 anos de existência com marcas que expressam a sua dimensão no mercado: chegou a 24 milhões de clientes e alcançou um faturamento de R$ 5,3 bilhões. Nas duas métricas, o crescimento foi de 6,5% na comparação anual.
No ano passado, o resgate de milhas cresceu 16,9% sobre 2023, para 10,1 milhões: do total, de 80% a 85% foi destinado a passagens aéreas, e o restante, a serviços como viagens rodoviárias, diárias em hotéis, locações de veículos, compra de combustível e até viagens com a Uber.
O Clube Smiles, um programa de assinatura com valores de R$ 39,90 a R$ 778,00 por mês - ou seja, que gera recorrência de receita - em troca de mais benefícios, cresceu 7,2% e chegou a 1,2 milhão de membros.
“Foi um ano muito especial para a empresa, com resultados sólidos apesar dos desafios remanescentes da pandemia e do Chapter 11 do grupo”, disse a executiva em referência ao processo equivalente à recuperação judicial da Gol desde o início de 2024, o que em tese impactaria essa fonte de demanda.
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A Smiles conseguiu manter a liderança do mercado de fidelidade no país, com 40% de market share (pelo critério de pontos gerados), segundo dados da ABEMF.
Nesse contexto, Fonseca - que ocupou até março também o cargo de Vice-Presidente da Gol para a área comercial - disse que a palavra que melhor define o setor aéreo é resiliência.
“Riscos vão sempre existir, ainda mais quando falamos de companhias aéreas, pois esse é um mercado difícil. Mas somos resilientes”, disse. “Apesar dos 30 anos de existência, temos agilidade de uma startup e mudamos a rota o tempo todo.”
Como exemplo da cultura de agilidade, a executiva disse que a companhia é uma “máquina de promoções”, com uma média de 300 ações realizadas por mês para estimular os negócios.
Fonseca destacou ainda que a Smiles também tem se beneficiado das sinergias com a Gol, que vem apresentando avanços em suas operações, como o aumento das rotas internacionais -- o que acaba se convertendo em crescimento para sua controlada.
Avenidas de crescimento
Uma das principais apostas da Smiles para continuar a crescer é o segmento de hotéis. Segundo a CEO, no ano passado houve um aumento de 73% dos resgates da companhia no negócio de hotelaria, com estratégias que incluem, por exemplo, uma parceria com a plataforma Booking.
“Temos fortalecido nossa operadora, que desde o ano passado consegue oferecer pacotes. Estamos investindo na experiência do cliente e esse volume vai ser cada vez maior.”
Outra experiência cuja oferta a companhia quer ampliar é o resgate de pontos para acesso a salas VIP de aeroportos. Fonseca disse que, após a pandemia, o comportamento do cliente mudou, e muitos passageiros utilizam esses espaços por mais tempo para trabalhar antes das viagens, por exemplo.
A Gol possui quatro salas VIP no Brasil, e a Smiles lançou no ano passado a opção de resgate de pontos para esse tipo de serviço também ao redor do mundo por meio de uma parceria com a DragonPass, que administra cerca de 1.300 salas VIP globalmente.
Para além do turismo, a Smiles lançou no ano passado um clube de assinatura que pode ser oferecido pelas empresas como benefício corporativo. O serviço consiste na oferta de milhas mensais aos funcionários.
“É uma vertical nova, uma grande oportunidade de negócio para continuar trazendo mais resultado para a Gol e para a Smiles”, disse Fonseca.
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Em um cenário global de incertezas para os negócios, o planejamento assertivo é crucial, disse a executiva, que, por outro lado, ressaltou que também surgem oportunidades.
“Em momentos difíceis, as companhias aéreas precisam de canais para fortalecer as vendas e nós somos uma boa saída para o setor. Diante de uma eventual retração do mercado, recebemos mais disponibilidade de assentos”, disse a CEO da Smiles.
Mercado também cresce
O avanço da Smiles vai em linha com a expansão do mercado de fidelidade no país como um todo.
Segundo a Associação Brasileira das Empresas do Mercado de Fidelização (ABEMF), programas de fidelidade no país atingiram um total de 320,2 milhões de cadastros no terceiro trimestre de 2024 (dado mais recente), com um avanço de 3,2% sobre igual período do ano anterior.
O volume de pontos ou milhas acumulados pelos participantes alcançou 240,6 bilhões no período, o que representou um aumento muito maior, de 41,9% na mesma base de comparação. Já os pontos e as milhas resgatados cresceram 31,6% no período, totalizando 206 bilhões.
Ou seja, brasileiros têm acumulado mais pontos e resgatado mais benefícios, o que indica o aumento da recorrência de uso dentro de uma base de cadastros que supera com folga o tamanho do mercado endereçável em termos de população.
De acordo com a entidade, os pontos e as milhas originados no trimestre vieram majoritariamente do varejo, da indústria e de serviços, incluindo bancos e emissores de cartões de crédito. Esses três setores representaram 93,4% do volume acumulado pelos consumidores.
Os demais 6,6% dos pontos e das milhas vieram da aquisição de passagens aéreas.
Por outro lado, as passagens aéreas continuam a representar a grande maioria dos resgates e responderam por 77,4% dos pontos trocados no período, de acordo com a associação, o que corrobora a visão de mercado da CEO da Smiles sobre a vantagem competitiva da companhia.
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