Os desafios de formar os líderes do futuro, segundo a diretora da Wharton School

Em entrevista à Bloomberg Línea, Erika James contou como enfrenta questões que vão do impacto da IA à polarização política e a busca por diversidade em uma das principais escolas de negócios do mundo

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Bloomberg Línea — Transformação de carreiras com tecnologias como a IA (Inteligência Artificial), polarização política exacerbada, mudanças de prioridades de novas gerações. Não faltam desafios e incertezas na educação, e isso inclui as melhores escolas de negócios do mundo. Foi nesse contexto que Erika James assumiu a direção da Wharton School, da Universidade da Pensilvânia, que faz parte da Ivy League.

“Além da pandemia, os desafios geopolíticos e a polarização política mudaram a natureza das responsabilidades de um diretor em uma escola de negócios. Tivemos que ser muito mais cuidadosos com os fatores geopolíticos que podem influenciar nosso engajamento ao redor do mundo”, disse Erika James, Dean da Wharton School, em entrevista à Bloomberg Línea no último sábado (8).

Ela esteve em passagem por São Paulo para a 56ª edição do Wharton Global Forum, que reuniu lideranças empresariais, ex-alunos e autoridades da escola de negócios pela primeira vez no Brasil.

James assumiu o cargo em julho de 2020, sendo a primeira mulher e a primeira pessoa negra à frente da mais antiga escola de negócios do mundo, fundada em 1881, e de uma das mais bem avaliadas - Wharton ficou em oitavo lugar no ranking deste ano para os EUA da Bloomberg.

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É Ph.D em psicologia organizacional pela Universidade de Michigan, integrante do conselho de administração do Morgan Stanley e referência em temas como liderança estratégica e diversidade corporativa, sendo autora de livros como “The Prepared Leader: Emerge from Any Crisis More Resilient Than Before”. Foi Senior Associate Dean para educação executiva da Darden School of Business, da Universidade de Virgínia.

Com uma lista de ex-alunos como Elon Musk e Sundar Pichai, CEO do Google, a Wharton School atrai talentos globais, incluindo um número crescente de estudantes da América Latina, apoiados por bolsas de estudo e redes de ex-alunos como Roberto Sallouti, sócio e CEO do BTG Pactual, Marcos Galperin, cofundador do Mercado Livre, e João Paulo Ferreira, CEO da Natura, entre outros.

Além de enfrentar os desafios impostos pela pandemia e pela polarização política, Erika James tem trabalhado para fazer avançar a agenda da diversidade. Sob sua liderança, a Wharton se tornou a primeira escola de negócios dos EUA a alcançar a paridade de gênero em seu programa de MBA.

Na entrevista exclusiva à Bloomberg Línea, James compartilhou sua visão ao assumir o cargo e contou como a pandemia de covid impactou seu plano e levou a escola a se tornar mais abrangente.

“Quando comecei, a pandemia já estava em pleno andamento”, lembrou. “Tive que pensar em como fazer a transição para uma experiência de aprendizado remoto e treinar nossos professores para usar a tecnologia de maneiras muito diferentes.”

Esse desafio levou ao desenvolvimento posterior de um programa híbrido de MBA executivo, que combina aulas online síncronas e presenciais, que permite que estudantes de todo o mundo obtenham um diploma de Wharton.

Além da pandemia, as tensões geopolíticas e a crescente polarização política também impactaram as operações e relações da escola.

Nos últimos meses, uma série das mais prestigiosas universidades americanas tiveram acampamentos e protestos pró-Palestina. Ela assumiu no momento de eclosão de protestos no país contra a discriminação racial após o assassinato de George Floyd por um um policial em Minneapolis em maio de 2020.

“Havia uma grande oportunidade para Wharton ser uma líder em criar acesso e democratizar a educação”, disse ela. Iniciativas durante seu mandato incluíram programas de alfabetização financeira para comunidades carentes e esforços para tornar a educação empresarial mais acessível para mulheres.

À medida que a inteligência artificial (IA) continua a transformar diferentes indústrias, James disse que Wharton tem a oportunidade de se colocar na vanguarda dessa evolução, na preparação de líderes empresariais para que usem a IA de forma ética e eficaz, integrando-a no currículo e promovendo a colaboração interdisciplinar entre negócios e outras áreas, como saúde e engenharia.

Veja abaixo a entrevista com a diretora Erika James, editada para fins de clareza e concisão:

Quais eram as principais missões que você tinha ao assumir a direção da Wharton?

Quando fui nomeada [em fevereiro de 2020], a pandemia ainda não havia atingido os Estados Unidos. Comecei a pensar em como aproveitar a marca Wharton e quais novas iniciativas poderíamos implementar. No entanto, quando realmente comecei, a pandemia já estava em pleno andamento, e a universidade estava operando remotamente, o que mudou drasticamente minhas responsabilidades como líder.

E o que você conseguiu realizar?

Tive que pensar em como fazer a transição para uma experiência de aprendizado remoto, treinar e desenvolver nossos professores para usar a tecnologia de maneiras muito diferentes. Em como manter a cultura da comunidade. Assim, enquanto trabalhávamos para sair da pandemia, o que penso que surgiu para mim foi a constatação de que tínhamos feito investimentos bastante significativos no nosso corpo docente e nos nossos edifícios para acomodar o ambiente de trabalho remoto à pandemia.

E agora, fora da pandemia, como podemos usar essa tecnologia e esses novos conjuntos de habilidades para levar a Wharton a um lugar muito diferente e sermos mais progressistas na forma como pensávamos sobre a educação? Como resultado, lançamos um novo formato do nosso programa de MBA executivo, que é o primeiro programa de Wharton em grande parte híbrido, com uso de tecnologia.

Isso abriu novos mercados, pois permite que estudantes de todo o mundo trabalhem de forma síncrona com professores e uma turma para obter um diploma. Nosso objetivo é fazer de Wharton a escola de negócios líder na preparação da próxima geração de alunos para usar essa nova tecnologia de IA de maneira ética e eficaz, proporcionando uma vantagem competitiva para as empresas em que irão trabalhar.

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A era de IA também representa um desafio para os professores, não?

Sim, é um desafio, mas um percentual significativo de nossos professores já trabalhava na área. Para alguns, é uma oportunidade de aprender algo novo, e isso cria uma maneira pela qual a Wharton desenvolve uma competência e um conjunto de habilidades mais amplas do que a maioria das outras escolas de negócios.

Uma das grandes áreas de foco para Wharton é a inteligência artificial. Estamos trabalhando para ajudar nossos alunos a usar essa ferramenta de maneira ética, apoiar nossos professores na construção de novos conhecimentos, colaborar com outros setores como saúde e engenharia em suas relações com IA e para compartilhar os benefícios da IA com comunidades que não têm acesso a essa tecnologia.

Quais foram os avanços que Wharton obteve em termos de inclusão e diversidade?

Além de começar em Wharton durante a pandemia, assumi o cargo no verão em que houve muita atenção ao assassinato de George Floyd nos EUA. As conversas sobre diversidade e inclusão foram intensificadas, e Wharton teve a oportunidade de ser líder nesse espaço: criamos oportunidades para as pessoas terem acesso, para democratizar a educação. Buscamos aproveitar a experiência do nosso corpo docente em planejamento financeiro para ajudar os jovens que não foram expostos à alfabetização financeira.

Outro ponto é que os negócios tradicionalmente não têm sido um lugar atraente para muitas mulheres e as escolas de negócios têm sofrido com a atração de mulheres para o corpo docente e com a atração de mulheres para obter seus diplomas de graduação ou MBA. Há muito tempo estamos realmente focados em como podemos tornar os campos de negócios em lugares convidativos para mulheres. E fomos a primeira escola de negócios a alcançar a paridade de gênero em nosso programa de MBA.

Ainda há espaço para progresso em termos de diversidade e inclusão?

Certamente, isso é verdade em todos os países desenvolvidos e não desenvolvidos. Até que todos sintam que têm um caminho para obter cuidados de saúde eficazes, educação de qualidade, acesso a recursos financeiros e a possibilidade de participar da economia, haverá trabalho a ser feito. A escola de negócios é uma ferramenta que pode ajudar a abordar alguns desses problemas, mas não é a única.

Como Wharton tem feito para atrair alunos em países emergentes como o Brasil? Qual o peso de bolsas de estudo, por exemplo?

Nossos ex-alunos são fundamentais nesse aspecto. Eles ajudam a apoiar a filantropia, que entra na escola para dar suporte aos alunos de suas comunidades. O Wharton Club do Brasil, por exemplo, formou um fundo para bolsas para apoiar vários estudantes brasileiros para a escola de negócios.

Já temos uma posição bastante forte na América Latina e no Brasil em particular. Fiquei sabendo que temos 550 ex-alunos no Brasil. E, portanto, creio que nossa capacidade de alavancar esse grupo de pessoas para expandir a marca Wharton, o nosso nome e a nossa reputação certamente contribuirá para que um número maior de estudantes conheça a Wharton.

Trouxemos alguns de nossos professores aqui em São Paulo para educar e apresentar Wharton a um grupo de alunos do ensino médio. E agora eles estão participando de uma sessão sobre empreendedorismo e inovação e são todos estudantes brasileiros. E é assim que você começa a construir o reconhecimento da marca entre os jovens.

Quais foram os desafios inesperados que você enfrentou desde que se tornou diretora de Wharton?

Além da pandemia, os desafios geopolíticos e a polarização política mudaram a natureza das responsabilidades de um diretor em uma escola de negócios. Tivemos que ser muito mais cuidadosos com os fatores geopolíticos que podem influenciar nosso engajamento ao redor do mundo.

A polarização tem influenciado a dinâmica que se coloca para nossos alunos, nosso corpo docente nas empresas com as quais trabalhamos e nas empresas para as quais nossos alunos vão trabalhar.

Como fomentar um diálogo construtivo dentro da comunidade da Wharton, especialmente em períodos de polarização política?

Passamos muito tempo pensando nisso e trabalhando para esse objetivo. Nossos alunos tendem a ser muito práticos e focados na experiência acadêmica, mas também temos um grupo muito diversificado de estudantes com diferentes pontos de vista. Temos várias iniciativas para proporcionar oportunidades para que estudantes com diferentes visões políticas e sociais se reúnam e, de maneira segura, tenham essas conversas, às vezes facilitadas por professores ou clubes estudantis.

Não podemos fugir do fato de que há tensão no mundo neste momento. E acho que, se há um lugar seguro para tentar descobrir como se envolver em conversas tensas, é no ambiente universitário.

A relevância do MBA tem sido mais questionada hoje em dia. Como manter o MBA atraente para estudantes e outros perfis que desejam, por exemplo, se tornar empreendedores?

O MBA introduz conceitos fundamentais de finanças, economia e princípios contábeis e de gestão que são críticos para o comércio e a criação de novos produtos e serviços, que, por sua vez, são alguns dos pilares de qualquer sociedade. E ainda não houve outro diploma tão eficaz na criação dessas competências quanto o MBA.

Mas o MBA também tem sido ampliado. Empreendedorismo não fazia parte do currículo do MBA há 20 anos, mas, à medida que novos projetos são lançados e e as pessoas têm ideias para startups, quanto mais isso é impulsionado pela sociedade, mais precisamos colocar esse tipo de conteúdo no currículo no MBA.

Portanto, o currículo do MBA está em constante mudança e evolução, assim como acontece com a inteligência artificial, para atender às necessidades atuais com as tecnologias disponíveis.

Além das responsabilidades profissionais, o que mais captura sua atenção e seu tempo?

Eu gosto de viajar e tenho a oportunidade de fazê-lo muitas vezes com a Wharton School porque vamos aonde quer que nossos ex-alunos estejam - e eles em todo o mundo.

E gosto muito de leitura também. Atualmente, estou lendo um livro de Neil deGrasse Tyson, que explora como os princípios do universo afetam decisões e comportamentos individuais. Você não pensaria necessariamente que esses princípios universais têm alguma relação com o que faço no dia-a-dia. Mas o livro expõe o argumento sobre como este mundo está interconectado. E é fascinante para mim.

Há um livro chama “The Perennials” e ele analisa a maneira como as gerações têm evoluído. Antes eram mais contidas. Nos primeiros 20 anos, você está na educação, nos segundos 20 anos, no mercado de trabalho, nos últimos 20 anos, aposentado. Mas agora todas as gerações também estão interligadas. Os jovens estão criando empresas, algo que as pessoas só faziam quando eram muito mais velhas. Agora, os idosos voltam à escola, o que não acontecia antes. É um livro interessante de que tenho gostado.

Também estou lendo “Playing From the Rough”, escrito pelo meu marido [Jimmie James], que é sobre a sua história de jogar nos cem melhores campos de golfe dos EUA tendo como pano de fundo a sua jornada de passagem da pobreza extrema para a riqueza por meio de trabalho e educação.

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