SYN avança na gestão de shopping e vai além do aluguel. Falta convencer o mercado

Em entrevista à Bloomberg Línea, o CEO Thiago Muramatsu conta os próximos passos da estratégia que deu peso crescente à vertical de shoppings e menor, por ora, aos escritórios

Fachada do Shopping Cidade de São Paulo, que faz parte do portfólio da SYN Prop & Tech (ex-CCP ou Cyrela Commercial Properties)
29 de Novembro, 2023 | 05:05 AM

Bloomberg Línea — Os impactos da pandemia sobre o mercado imobiliário têm sido cada vez mais superados pelos principais players do segmento no Brasil. Mas cada um ao seu modo particular. Um dos casos mais destacados pela transformação da estratégia de negócios é o da SYN Prop & Tech, anteriormente conhecida como CCP (Cyrela Commercial Properties), controlada por Elie Horn.

“Mudamos de uma empresa que até hoje tem um recall muito grande de escritórios, como operadora de propriedades na área, para uma em que mais de 80% do top line [receita] vem de shoppings”, disse Thiago Muramatsu, CEO da SYN, em entrevista à Bloomberg Línea.

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O foco tem sido o aumento da produtividade da operação de shoppings, com estratégias que vão além da receita tradicional dependente do aluguel com lojas, de estacionamento e entretenimento.

Os dois principais ativos em termos de receitas são o Shopping Cidade São Paulo, na movimentada avenida Paulista, e o Grand Plaza Shopping, na parte mais nobre de Santo André, no ABC paulista.

O CEO da SYN (SYNE3) apontou que a necessidade de investimento em shopping para ampliar ou mesmo preservar o seu público tem sido ainda maior no contexto de retomada pós-pandemia, citando dados do mercado geral que apontam um tráfego ainda inferior ao de 2019.

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“O que percebemos é que se paramos de investir e de levar novidades para os shoppings, de acompanhar o que é tendência, o ativo, por melhor que seja, começa a perder relevância”, explicou.

O Shopping Cidade São Paulo está exposto ao impacto do modelo de trabalho híbrido ainda adotado por muitas companhias, com três ou quatro dias presenciais.

“Um dia a menos pode significar 20% a menos de fluxo de pessoas. Só agora no segundo semestre temos visto uma volta mais consistente do público”, disse Muramatsu, com a ressalva de que, em termos de vendas das lojas e do aluguel cobrado, os números já haviam se recuperado.

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Percepção ‘equivocada’

Um dos desafios da gestão é reduzir ou eliminar uma percepção de mercado que se reflete na precificação aquém do que realmente vale a companhia e seus ativos, segundo o CEO da SYN. O valor de mercado estava em cerca de R$ 640 milhões na terça-feira (28), com a ação estável no ano.

“Muitos investidores e analistas ainda nos enxergam como uma empresa de escritórios, ainda que hoje só uma parcela reduzida da receita venha dessa vertical. Por outro lado, nossos números operacionais e financeiros são próximos dos pares de shoppings”, disse o executivo.

Ele deu como exemplo de percepção equivocada a venda de quatro edifícios de escritórios no fim de 2021 para a Brookfield, por um valor - R$ 1,77 bilhão - cerca de 10% acima do market cap da SYN em bolsa naquele dia. “A empresa ainda tinha todo o portfólio de shoppings e uma parte importante do de escritórios.”

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A atual falta de apetite do investidor estrangeiro também pesa para essa menor percepção de valor, segundo o executivo, diante da visão de que shoppings no Brasil enfrentarão dificuldades semelhantes às enfrentadas no mercado americano, como se este fosse uma proxy do setor no país.

Um dos caminhos para esse objetivo de mostrar que a SYN hoje é uma das principais empresas do setor de shoppings é estreitar o relacionamento com as marcas. “Ainda há quem nos veja como uma operadora de escritórios que tem shoppings. E hoje, na verdade, é o contrário.”

Thiago Muramatsu, CEO da SYN Prop & Tech, ex-CCP ou Cyrela Commercial Properties

Atração de marcas

“Pensamos em novas formas de rentabilizar os ativos em um cenário em que há uma consolidação de marcas, o que resulta em maior poder de negociação da parte delas, e de desafios para o varejo. As vendas sobem, mas os custos também. Não tem varejista em situação folgada, confortável”, disse o CEO.

Uma estratégia é trabalhar o real estate como espaço para propaganda, com exposição de mídia, o que inclui marcas que não necessariamente têm presença no varejo de lojas físicas. “Buscamos mostrar para essa empresa que o shopping é uma oportunidade para exposição de marca também.”

“Vemos uma oportunidade gigante de aproximação com a indústria. Vou dar um exemplo: Gomes da Costa. É uma marca de atum que entrou pensando em como oferecer experiência para o seu consumidor”, disse Ricardo Loducca, diretor executivo de Vendas e Marketing da SYN, à Bloomberg Línea. A ação do Shopping Cidade São Paulo incluiu a montagem de uma “praia” na avenida Paulista com direito à pescaria pelas pessoas.

Loducca lidera uma equipe responsável pelas negociações com marcas, em uma nova estrutura que difere da que existia anteriormente, em que havia uma pessoa para cada shopping para negociar com lojistas e que acabava acumulando a frente de mídia, mas em segundo plano.

Inicialmente à frente “apenas” do time comercial - desde 2021 -, Loducca passou a acumular há dois meses também a área de marketing, diante do entendimento de que é possível obter sinergias em ações coordenadas.

Houve uma reestruturação da área de atendimento ao cliente, com investimento em CRM, para que os shoppings consigam entender qual é o seu público e direcionar campanhas, além de apresentar tais informações no momento de negociar com a indústria.

Neste ano, outra parceria já acertada é com a Disney, para a promoção de novos filmes e de personagens clássicos como o Mickey.

São iniciativas que acontecem em outros ativos da SYN, como no Tietê Plaza Shopping, na zona norte, um dos que mais crescem. Ele fica em uma região de adensamento acelerado: há na vizinhança um bairro planejado em construção pela MRV (MRVE3) com previsão de receber 30.000 pessoas.

Segundo Muramatsu, o contato do shopping deixa de ser apenas com a varejista tradicional, algo que continua a acontecer, mas passa a se dar também com agências de marketing que planejam ações promocionais. “É uma maneira de capturar mais valor para o shopping. Isso gera receita e aumenta o número de pessoas que passam, o que gera mais vendas e atrai as marcas. É um ciclo virtuoso”, disse.

No Shopping D, que tem uma taxa de vacância mais elevada, na casa de dois dígitos, a SYN substituiu cerca de 4.000 metros quadrados em lojas por áreas de lazer; e metragem semelhante de estacionamento - uma espécie de tabu para o modelo tradicional de shoppings - com a mesma finalidade. Hoje a receita que advém dessa nova área de lazer supera a que era obtida com o aluguel das lojas removidas.

O ganho relativo de relevância de shoppings para a SYN aconteceu, segundo o CEO, como consequência de uma mudança de estratégia adotada principalmente a partir do segundo ano da pandemia, em 2021. Até aquele momento, de 55% a 60% da receita ainda tinha origem na vertical de escritórios.

Visão para escritórios

Segundo o executivo, a pandemia ofereceu uma oportunidade de “reciclagem” do portfólio de escritórios, o que incluiu a venda de ativos em negócios com condições atrativas. O racional tem sido o de perseguir o ganho de eficiência do capital, em um modelo asset light.

Isso não significou, no entanto, a redução do trabalho em si, ressaltou Muramatsu. “Continuamos a operar os prédios de escritórios que vendemos. A diferença é que agora somos remunerados por esse serviço, embora a receita e o upside de locação agora fiquem com os proprietários.”

Essa frente de negócios com a gestão inclui dez prédios comerciais, dos quais quatro são de terceiros. E se justifica pela escala operacional, explicou. Além disso, isso permite a continuidade do deals flow, ou seja, da capacidade de acertar novos negócios se e quando a empresa assim decidir por meio do contato com o mercado, sejam inquilinos ou proprietários.

“Temos vontade de voltar a fazer negócios com escritórios, mas no momento ainda está difícil para fechar a conta com juros altos aqui e lá fora. É difícil concorrer com yields de Treasuries de 5%, enquanto aqui se consegue entregar 10%, 11% em real”, disse o executivo.

Como operadores com a expertise para edifícios de escritórios triple A, vão continuar a procurar tais ativos, mas eles estão escassos e caros, ponderou.

Na ponta vendedora, o CEO da SYN fez questão de ressaltar que, como players que atuam há muitos anos nesse mercado, conhecem o business de escritórios, sabem quanto valem e não vão vender a qualquer preço e “queimar’ ativos. “O mercado sabe que somos duros na negociação.”

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Marcelo Sakate

Marcelo Sakate é editor-chefe da Bloomberg Línea no Brasil. Anteriormente, foi editor da EXAME e do CNN Brasil Business, repórter sênior da Veja e chefe de reportagem de economia da Folha de S. Paulo.