Os planos de Pedro Arnt, novo co-CEO do unicórnio uruguaio dLocal

Executivo fala em entrevista à Bloomberg Línea sobre os desafios na nova empresa, dias depois de deixar o cargo de CFO do Mercado Livre após 12 anos

Pedro Arnt, ex-CFO do Mercado Livre, agora nomeado co-CEO da dLocal
17 de Agosto, 2023 | 04:46 AM

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Bloomberg Línea - Buenos Aires — As ações da dLocal (DLO) dispararam 32% na quarta-feira (16) depois de a empresa uruguaia de pagamentos informar ao mercado a nomeação de Pedro Arnt como co-CEO, ao lado do executivo Sebastián Kanovich - e em meio a rumores de que seria alvo de uma aquisição. Arnt, que foi CFO do Mercado Livre (MELI) por 12 anos, havia anunciado a saída do cargo na gigante de comércio eletrônico dias atrás.

A chegada do executivo ocorre em um momento em que a dLocal busca se recuperar de um período de notícias conturbadas. No fim do ano passado, a ação desabou 50% depois da publicação de um relatório da gestora americana Muddy Waters que revelava que tinha posição short - apostava na queda - em razão do que seriam alegadas inconsistências contábeis.

Em maio, autoridades fiscais argentinas divulgaram que estariam investigando a dLocal por supostas manobras para a evasão de divisas do país.

Recentemente, uma reportagem da Bloomberg News informou que a empresa teria contratado escritórios especializados e explorava alternativas, o que incluiria uma possível venda. A notícia também contribuiu para a valorização da empresa na bolsa nos últimos dias. No entanto, mesmo com os ganhos recentes em Nova York, o preço do papel ainda é negociado cerca de 10% abaixo do valor de dezembro de 2022.

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Em entrevista à Bloomberg Línea, Arnt disse que seu papel não é corrigir algo que está errado, mas garantir que a dLocal possa crescer de forma sustentada e classificou a companhia como “uma empresa que está indo incrivelmente bem”.

“O desafio aqui não é, como algumas pessoas erroneamente entendem, que algo precisa ser corrigido. O que precisamos fazer aqui é preparar essa organização para o próprio sucesso. E acredito que tive o privilégio nos últimos 24 anos de construir e ver o crescimento na área de tecnologia como poucos na região”, afirmou em conversa ao lado do co-fundador Sergio Fogel.

Fundada em 2016 por Fogel e Andrés Bzurovski, a dLocal se estabeleceu como uma plataforma para pagamentos online em mercados emergentes usadas por empresas de e-commerce e de serviços digitais, concorrendo com companhias como a brasileira Ebanx e a holandesa Adyen.

No segundo trimestre de 2023, a dLocal registrou um Volume Total de Pagamentos (TPV) de US$ 4,4 bilhões, um aumento anual de 80% e trimestral de 22%. A empresa também relatou uma receita de US$ 161 milhões, um crescimento de 59% em relação ao ano anterior. Além disso, o Ebitda ajustado foi de US$ 52 milhões, o que representa uma alta de 36% em relação ao ano anterior.

“O que eu aprendi nesses anos de interação com os mercados de capitais, em primeiro lugar, é que você deve deixar seus resultados falarem por você”, afirmou Arnt.

Sobre a notícia de a empresa estaria avaliando opções, o cofundador, Sergio Fogel, afirmou que não poderia comentar.

Leia a seguir a entrevista com os executivos, editada para fins de clareza.

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Bloomberg Línea: Há quanto tempo vocês vinham conversando com o Pedro para trazê-lo para esse papel e por que decidiram procurá-lo?

Sergio Fogel: Não faz muito tempo, cerca de um mês e pouco. Originalmente, tínhamos outro plano, mas, quando começamos a interagir com ele, vimos tudo o que ele poderia trazer para a empresa, toda a experiência que tinha em escalar uma empresa para um tamanho muito maior que o nosso. E vimos como interagíamos bem e como poderíamos trabalhar juntos.

Obviamente, já nos conhecíamos de antes e em certo momento pensamos: “Possivelmente, ele é a pessoa de que precisamos para fortalecer nossa equipe de gestão sênior”.

Quais serão seus principais objetivos nesta nova etapa na dLocal?

Pedro Arnt: A dLocal é uma empresa que está indo incrivelmente bem. Olhe os resultados que anunciamos. Pegue o nosso maior mercado, o Brasil. Ele dobrou em relação ao ano anterior. Pegue alguns dos mercados mais novos, como a nossa geografia África-Ásia. Ela cresceu 2,5 vezes.

Portanto, o desafio aqui não é, como algumas pessoas erroneamente entendem, que algo precisa ser corrigido. O que precisamos fazer é preparar essa organização para o próprio sucesso, para esses níveis de crescimento de forma sustentada. E acredito que tive o privilégio nos últimos 24 anos de construir e ver o crescimento na área de tecnologia como poucos na região.

Esse é o meu principal mandato, garantir que tudo o que a dLocal está gerando de bom com esses resultados para nossos clientes possa crescer para duas, cinco, dez vezes em volume.

Pedro Arnt, novo co-CEO da dLocal

A sua mudança após tanto tempo no Mercado Livre não deixa de surpreender. O que o atraiu para a dLocal?

Arnt: Quando se olha para esse ativo, e como ex-CFO que analisa muitas empresas, ele tem um tamanho de mercado, um mercado endereçável que é enorme, e no mundo digital, nada vai crescer mais nos próximos anos do que os mercados emergentes onde operamos.

A empresa tem uma carteira de clientes que inclui muitas das maiores empresas de tecnologia do mundo, e isso me indica duas coisas: todo o crescimento que está acontecendo, mas o mais importante, e isso é pouco mencionado, é que a tecnologia da dLocal é usada pelos merchants mais exigentes do mundo, e muito poucos nos deixam. Ela tem uma cultura muito focada em fazer o que for necessário para ajudar nossos merchants a crescer, e isso me atraiu muito.

Por fim, a empresa tem um modelo financeiro que é bastante raro nos dias de hoje, que é um alto crescimento, alta margem e alta geração de caixa, então esse ativo é uma verdadeira joia.

Como vão dividir as funções de co-CEO com Sebastián Kanovich? Não é muito comum ver dois CEOs. Podemos falar de uma transição?

Arnt: Não falamos sobre uma transição. Quando você olha para nossos perfis rapidamente, percebe que somos muito complementares e isso foi confirmado durante todo esse processo. Há muito a ser feito na dLocal, então não temos mãos de sobra e, precisamente por essas complementaridades, bem como pela química entre nós, percebemos que isso não se trata de títulos ou estruturas organizacionais, mas, sim, de todos nós nos empenharmos para construir a melhor empresa possível.

Então, estamos confortáveis em adotar o modelo de co-CEO, que por enquanto é o melhor para a dLocal.

Desde novembro, quando a Muddy Waters revelou a operação de venda a descoberto (short selling) das ações e acusou seu modelo de negócios de fraude, até o fechamento de hoje (terça-feira, 15 de agosto), suas ações caíram mais de 30%. Acham que reconquistaram a confiança dos investidores após esse incidente e a investigação na Argentina?

Arnt: O que aprendi ao longo desses anos ao interagir com os mercados de capitais é que, em primeiro lugar, você precisa deixar que seus resultados falem por si. E os resultados desta empresa ao longo do último ano têm sido excepcionais.

Em segundo lugar, a confiança é construída a longo prazo, as estratégias são construídas a longo prazo, e é isso que vamos fazer. Não sei se recuperamos ou não a confiança, mas tenho confiança de que, se continuarmos entregando os resultados que temos entregado, isso é o que importa para um investidor. E o que mais importa para nós é a confiança de nossos clientes.

Como sempre dizemos aqui, nossos clientes estão usando cada vez mais nossos serviços e nos pedindo para acompanhá-los no crescimento de seus negócios em mais e mais países.

Sergio Fogel, co-fundador da dLocal

A General Atlantic é uma das acionistas da dLocal e recentemente fez o fechamento de capital da Arco. Poderia acontecer algo semelhante com vocês?

Fogel: Se surgirem opções desse tipo, as avaliaremos. Não posso comentar mais do que isso.

Arnt: Temos um compromisso fiduciário com nossos acionistas, mas é como qualquer outra empresa de capital aberto.

Vocês poderiam comentar algo sobre os rumores de uma possível venda?

Fogel: Como política, não comentamos rumores.

A dLocal teve um crescimento constante nos últimos três anos, apesar de um ciclo de aumento das taxas de juros, que agora está começando a se encerrar. É possível ver algum tipo de desaceleração nesse ritmo de expansão?

Fogel: Temos quatro vetores diferentes de crescimento. Um deles é que nossos clientes crescem nos mercados em que atuam, e o volume que eles movimentam cresce também. Então, se eu não fizesse nada, deveria continuar crescendo junto com meus clientes. Além disso, obviamente, temos uma força de vendas que está adicionando mais e mais clientes.

O terceiro fator, a terceira dimensão de crescimento que temos, é que adicionamos novas geografias conforme nossos clientes as solicitam. E o quarto fator de crescimento é que adicionamos novos produtos. Portanto, em comparação com esses quatro fatores impulsionando o crescimento, o que pode subir ou descer com base nas taxas de juros ou na taxa de câmbio, ciclos econômicos, nesta fase, ainda não.

Não preveem uma desaceleração no ritmo em que estão crescendo?

Arnt: Mantivemos nosso guidance anual que havíamos fornecido, o que significa que acreditamos que atingiremos os números que havíamos planejado no início do ano. Não alteramos nosso guidance anual.

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Francisco Aldaya

Jornalista argentino com 10 anos de experiência. Francisco cobriu o setor financeiro da América Latina na S&P Global Market Intelligence e também trabalhou nas seções de economia e política do Buenos Aires Herald. Ele também contribuiu para o Buenos Aires Times.