O ‘turnaround’ da Alliança chegou ao fim. Foco agora é crescer, diz Isabella Tanure

Em primeira entrevista desde que assumiu o comando em fevereiro, CEO do grupo de saúde diz à Bloomberg Línea como será a estratégia com novo modelo ‘asset light’ e M&As no radar

Isabella Tanure, CEO e vice-presidente do conselho de administração da Alliança, um dos maiores grupos em medicina diagnóstica e análises clínicas do país (Foto: Divulgação)
09 de Agosto, 2024 | 05:10 AM

Bloomberg Línea — Há quase seis meses como CEO da Alliança, Isabella Tanure disse que a companhia chegou a um ponto de inflexão depois de concluir um turnaround iniciado há dois anos. O momento agora é de liderar o grupo, um dos maiores em medicina diagnóstica do país, em um novo ciclo de crescimento, com receitas diversificadas e mais parcerias comerciais no segmento B2B, em um modelo que define como asset light.

“Com a companhia mais saudável, o crescimento passa a ser o norte da estratégia. Organizamos a casa e vamos crescer, pautados pela qualidade do serviço”, disse Isabella Tanure à Bloomberg Línea, em sua primeira entrevista concedida desde que assumiu como CEO no fim de fevereiro.

O novo momento coincide, não por acaso, segundo a gestora com experiência de uma década em clínicas no Rio de Janeiro, que também é médica por formação, com resultados financeiros recordes da Alliança (AALR3) no segundo trimestre, divulgados na noite de quinta-feira (8) depois do fechamento do mercado. A receita bruta ajustada chegou a R$ 338 milhões, valor inédito para o grupo e alta de 5% na base anual.

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A geração de caixa operacional medida pelo Ebitda ajustado também foi recorde, de R$ 84,7 milhões, com alta de 28,2% na comparação anual. A margem Ebitda ajustado subiu de 22,1% para 26,9% na mesma base. O terceiro indicador que reflete a conclusão do turnaround foi o primeiro lucro líquido em quase três anos, de R$ 3 milhões, em reversão ao prejuízo de R$ 50 milhões no mesmo período de 2023.

“Os resultados são frutos de um trabalho de pouco mais de dois anos em que estamos à frente da companhia, mas, principalmente, do que temos feito neste ano”, disse Isabella, que explicou as razões para a mudança no comando da Alliança em comum acordo com o então CEO.

“Senti necessidade de estar mais dentro da empresa e mostrar o quão comprometidos os controladores estão e acreditam nela”, disse Isabella sobre a sua substituição a Pedro Thompson, que havia sido escolhido pela família assim que ela e o pai, o investidor Nelson Tanure, assumiram o controle em 2022.

No primeiro momento, ela atuou como acionista controladora e vice-presidente do conselho, cargo que passoiu a acumular. A presidência é ocupada justamente por Nelson Tanure.

O crescimento pode se dar tanto por meio das já citadas parcerias comerciais em B2B como de forma orgânica e também por meio de M&A (fusões e aquisições), respeitados os preceitos da disciplina de capital e de qualidade do serviço. A expansão geográfica para além dos 13 estados é outro objetivo.

“Hoje o que olhamos é principalmente diagnóstico, que é o sabemos fazer melhor e em que encontramos um modelo de eficiência, mas também análises clínicas e genética. E praças em que já temos demanda ou enxergamos como promissoras. Estamos em diálogo constante com parceiros e fontes pagadoras para identificar essas oportunidades”, disse a CEO.

Há também uma estrutura de integração e captura de sinergias decorrente justamente do trabalho desenvolvido com as 13 marcas então existentes quando a família assumiu (veja mais abaixo).

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A alavancagem da Alliança medida pela dívida líquida sobre o Ebitda ajustado nos últimos doze meses caiu para 2,7x, abaixo do patamar de 3,8x no primeiro trimestre e de 4,6x no mesmo período de 2023. Para tanto, além do crescimento do Ebitda ajustado, foi fundamental um aporte de R$ 250 milhões realizado pela família em duas fases, em março e abril deste ano.

Segundo Isabella, o aporte reflete a confiança da família com a estratégia e a visão de longo prazo na companhia - e a deixa pronta para aproveitar uma eventual oportunidade de M&A.

A médica e gestora lembrou o quadro encontrado na companhia, então chamada Alliar, há dois anos. “Havia muitas oportunidades, mas era uma empresa fragilizada na saída da pandemia de covid.”

Um dos primeiros desafios foi integrar as 13 marcas citadas, que, segundo ela, não conversavam entre si em áreas fundamentais como custos e compras e na frente comercial.

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Ricardo Sartim, COO (Chief Operating Officer), apontou como principais objetivos à época reforçar a estrutura de capital da companhia e melhorar os processos.

“Fizemos uma revisão da estrutura de custos para deixá-la mais leve”, disse o executivo à Bloomberg Línea na mesma entrevista. Ele chegou em 2023 egresso na rede Américas de hospitais, da Amil.

Segundo ele, o novo modelo de operação da Alliança proporciona uma capacidade de adaptação e agilidade na tomada de decisões estratégicas e implica custos menores.

“A empresa sempre foi marcada por um crescimento em diagnóstico por imagem, que é mais intensivo em capital, diferente de players como Fleury e Dasa, que têm presença relevante de análises clínicas.”

“A chegada da Isabella trouxe a visão de uma empresa asset light, que busca fazer muitas parcerias para acelerar o crescimento”, disse o COO da Alliança. “Conseguimos aumentar a nossa capilaridade e diversificar as receitas sem ter que fazer tantos investimentos e com uma estrutura de capital saudável.”

As receitas no B2B cresceram 235% no segundo trimestre na base anual, para R$ 14,6 milhões, mas ainda representam menos de 5% da receita bruta ajustada, o que ilustra o potencial de expansão. Segundo Isabella, há novos acordos já “costurados” que devem aparecer nos próximos meses trimestres.

Há também planos de crescimento não só em medicina diagnóstica, que continua a ser o core do grupo, mas também em “especialidades em que há muitas sinergias, como oncologia e ortopedia”.

Sartim destacou que a medicina diagnóstica possibilita uma variedade de parcerias e citou como exemplo uma firmada com uma grande rede de hospitais do país, em que a Alliança tem assumido a operação dessa área de imagens - o nome da rede não pode ser divulgada, segundo ele.

São parcerias que permitem capturar receitas de maneira mais célere, dado o ciclo financeiro menor, com recorrência e previsibilidade, uma vez que são contratos de longo prazo, e ampliam a exposição de marca. E viabilizam a diversificação de fontes pagadoras - operadoras de saúde em geral.

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“Hoje nossa maior fonte pagadora responde por 8% de nossas receitas brutas totais, o que mostra como reduzimos a nossa dependência.”

Segundo ele, há poucas parcerias em diagnósticos por imagem em redes hospitalares, o que significa muitas oportunidades. “A maioria das parcerias na nossa área está concentrada em análises clínicas.”

A parceria, uma vez acertada, por sua vez, abre a oportunidade de cross-sell (venda cruzada de soluções) na área de diagnósticos, como ocorreu com a rede de hospitais acima citada, em que um aditivo do contrato foi assinado após três meses do início do mesmo. “Mostramos a qualidade do nosso serviço.”

“Outra avenida de crescimento que estudamos e da qual temos nos aproximado é com o mercado público de maneira mais seletiva, principalmente na área de alta complexidade de diagnóstico, como genética, ressonância magnética e tomografia”, disse o executivo.

As ações da Alliança acumulam ganhos perto de 17% desde o início do ano, mas ainda estão com queda de quase 60% em doze meses, em razão dos efeitos da OPA (Oferta Pública de Aquisição) conduzida pela família há um ano. A operação deixou Tanure com 93,1% do capital da companhia.

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Marcelo Sakate

Marcelo Sakate é editor-chefe da Bloomberg Línea no Brasil. Anteriormente, foi editor da EXAME e do CNN Brasil Business, repórter sênior da Veja e chefe de reportagem de economia da Folha de S. Paulo.