Bloomberg Línea — Quando Bia Haddad entrar na quadra de saibro montada no Ginásio do Ibirapuera, em São Paulo, no fim da tarde desta sexta-feira (12) para enfrentar a alemã Laura Siegemund, pela fase de classificação da Billie Jean King Cup, a principal competição feminina entre nações, o tênis brasileiro vai concretizar mais um passo representativo de sua retomada como um dos esportes mais populares do país.
É um movimento que tem atraído de volta - e com mais ímpeto - grandes empresas, de olho não só na exposição de marca e associação com os valores do esporte mas também no networking de uma das modalidades mais populares entre executivos e profissionais do mercado financeiro.
O aumento de interesse corporativo se reflete no crescimento do número de torneios internacionais no país, dado que permite ampliar o orçamento da CBT, a Confederação Brasileira de Tênis.
“Este será o maior ano da história do tênis brasileiro em termos de premiação, com R$ 8 milhões que serão pagos em cerca de 30 torneios [veja mais abaixo]”, disse Rafael Westrupp, presidente da CBT, em entrevista à Bloomberg Línea. “O pilar prioritário neste ano é o calendário profissional de torneios que serão realizados no Brasil.”
O orçamento deve chegar - por ora - a um valor próximo de R$ 40 milhões neste ano, o que representa um avanço aproximado de 30% em relação a 2023. Sete anos atrás, havia sido perto de R$ 7 milhões.
A CBT conta com o banco BRB como principal patrocinador, seguido da Engie Brasil Energia (EGIE3), empresas que estão com apoio há mais tempo e cujos CEOs, Paulo Henrique Costa e Eduardo Sattamini, respectivamente, são entusiastas do esporte.
A entidade acabou de acertar um contrato de dois anos com a Wilson, tradicional marca de bolas e raquetes, para que seja a fornecedora de uniformes dos times brasileiros na Billie Jean King Cup e na Davis Cup, a competição entre países para homens.
Para a etapa da Billie Jean King Cup (antes conhecida como Fed Cup e que não é um torneio do circuito da WTA, mas que atrai por vezes uma atenção maior do público, especialmente em jogos “em casa”), foram fechados contratos com Chevrolet (GM) e Stella Artois (Ambev), por meio da NSports, uma sportech que atua com a transmissão de eventos esportivos, o que também reflete a volta do interesse do público e de marcas. Há ainda a parceria com a Secretaria Municipal de Esportes e Lazer da Prefeitura de São Paulo.
Leia mais: Pacaembu é um ativo imobiliário que vai muito além do futebol, diz CEO
“Vendemos os direitos dessa etapa para a NSports. A CBT cuida de toda a área técnica do evento, e a NSports fica responsável não só pela transmissão por streaming e pela Claro/NET como pela realização e pela entrega promocional. E temos outras contrapartidas, como a exibição das marcas dos nossos patrocinadores e um hospitality para convidados”, disse o presidente da CBT.
O acordo com a NSports permitirá, segundo ele, que a CBT tenha ganhos com essa etapa da competição, já incluídos os direitos a percentuais de bilheterias e outras receitas. A organização de um evento como esse é estimada em uma faixa de R$ 1,5 milhão a R$ 1,6 milhão, valor que habitualmente precisa ser levantado pela entidade para garantir ao menos o breakeven, explicou.
“Foi o melhor acordo que já acertamos na minha gestão para transmissão seja da Billie Jean King Cup ou da Davis Cup”, disse Westrupp, que está à frente da entidade desde 2017.
Os 8.900 ingressos previstos para cada um dos dias praticamente se esgotaram, o que significa que a disputa do Brasil contra a Alemanha vai alcançar o status de evento com maior público na história do tênis feminino no país - que já teve uma das maiores atletas do mundo, Maria Esther Bueno, nos anos 1950 e 1960.
Há a expectativa de que possa ser o maior público no mundo para essa etapa da competição, que terá o confronto de outros países neste mesmo fim de semana. Além de Bia Haddad, o país será representado por Luisa Stefani, Laura Pigossi, Ingrid Martins e Carol Meligeni, sobrinha de Fernando Meligeni, um dos grandes tenistas do país nos anos 1990 e 2000.
Será também o maior público do tênis nacional desde as etapas no início dos anos 2000 da Davis Cup, ainda na “Era Guga”, de Gustavo Kuerten, quando chegou a número 1 do mundo. Mais especificamente, desde o confronto contra a Austrália de Lleyton Hewitt e Patrick Rafter em abril de 2001 em Florianópolis, pelas quartas-de-final, que levou cerca de 16.000 pessoas por dia em uma arena especial montada.
A quadra central do Rio Open, o principal torneio de tênis da ATP realizado hoje no país, abriga pouco mais de 5.000 torcedores. É um ATP 500, categoria que só fica abaixo dos quatro torneios de Grand Slam e dos Masters 1000, com a Claro como principal patrocinadora.
A própria volta de um torneio desse porte a São Paulo, com montagem de quadra no Ginásio do Ibirapuera, reflete o novo momento do tênis no Brasil, segundo o presidente da entidade. O último torneio de peso havia sido o Brasil Open em 2019, uma competição da ATP justamente nesse local.
Se passar pela Alemanha no confronto de hoje e amanhã em São Paulo, o Brasil passará para a fase final da Billie Jean King Cup, que será disputada em Sevilha, na Espanha, em novembro.
De Bia Haddad a João Fonseca
O interesse crescente foi alavancado no último com a ascensão de Bia Haddad, que chegou às semifinais de Roland Garros em 2023 e entrou de forma inédita para o top 10 do ranking da WTA (Women’s Tennis Association), ou seja, para o seleto grupo das dez melhores do mundo. Hoje é a 13ª.
Leia mais: Não só alta renda: como o Itaú fez do Miami Open um de seus principais palcos
Mas, antes da boa fase de Bia Haddad, o tênis feminino brasileiro já havia ganhado os holofotes de mídia e público com a também inédita medalha de bronze conquistada pela dupla formada por Luisa Stefani e Laura Pigossi na Olimpíada de Tóquio em 2021.
Luisa é uma das melhores tenistas de duplas do mundo, atualmente na 11ª colocação do ranking da WTA, em que Bia é a 22ª. Laura é a 125ª no ranking de simples.
No início de 2023, Bia atraiu o patrocínio do Itaú Unibanco, que a tornou embaixadora do Personnalité, o segmento de alta renda do maior banco brasileiro. O Itaú anunciou há um mês o patrocínio ao espanhol Carlos Alcaraz, que se tornou no ano passado o mais jovem tenista a liderar o ranking mundial.
O interesse tem aumentado não apenas em razão das mulheres. O país conta atualmente com um tenista no top 100 de simples do ranking da ATP - a entidade que rege o principal circuito profissional -, Thiago Wild, como 68° colocado. No ano passado, ele venceu o então número 2 do mundo, o russo Daniil Medvedev, no Grand Slam francês, o que gerou repercussão à época.
Outro destaque é João Fonseca, 17 anos, que se tornou em fevereiro o quinto tenista mais jovem do mundo a alcançar as quartas-de-final de um torneio da ATP desde 2000 e que, no ano passado, foi campeão juvenil do US Open.
O surgimento e o desenvolvimento de novos talentos como Fonseca ou Victória Barros - tenista de 14 anos que é apontada como uma das grandes promessas do país e do mundo, treinada por Patrick Mouratoglou, ex-coach de Serena Williams -, passa pela realização de um número crescente de torneios de menor porte, conhecidos como challengers no circuito masculino.
Os cerca de 30 torneios previstos para 2024 no país, dos quais nove já realizados, contrastam com o quadro visto há sete anos, quando houve seis eventos da ordem de US$ 15 mil em premiação cada um. Neste ano, as competições pagam de US$ 25 mil a US$ 82 mil no caso de torneios masculinos e de US$ 15 mil a US$ 60 mil para mulheres.
No início dos anos 2000, na Era Guga, houve um ano em que foram organizados cerca de 30 torneios para o masculino e 30 para o feminino. Mas, como destacou o presidente da CBT, a premiação em dólares era menor.
É um interesse que tem ido além dos grandes ídolos. No último fim de semana, a quadra central de tênis do Clube Harmonia, em São Paulo, estava lotada para a final do Roland Garros Junior Series, um torneio para adolescentes com até 16 anos.
Leia também
Venda do Manchester United simboliza nova era para o futebol em Wall St
Gigante de private equity explica por que decidiu investir no Chelsea