Bloomberg Línea — No escritório da Visa na região da Faria Lima, em São Paulo, uma palavra é dita frequentemente por executivos que lideram a companhia americana no Brasil: “agnóstico”.
O termo tem sido adotado por executivos e empreendedores nos últimos anos e, no caso da Visa, ele é usado para indicar a abertura para um mundo novo.
O modelo tradicional das bandeiras de pagamento foi desenhado com um regime fechado, em que cada operadora desenvolvia as próprias tecnologias e guardava os segredos a sete chaves dentro de casa. Mas isso mudou.
A estratégia agora passa por levar produtos consolidados e recém-desenvolvidos ao mercado, usando a força e o peso reputacional que a empresa construiu ao longo dos anos.
“Hoje, conseguimos ajudar os nossos clientes com inteligência artificial e dados de décadas, em análise de transações de outras bandeiras”, afirmou Gustavo Carvalho, diretor executivo da Visa Acceptance Solutions (VAS), divisão voltada para oferecer serviços de valor agregado aos clientes.
É o caso de serviços como o VAA (Visa Advanced Authorization) e o VRN (Visa Risk Manager), de análise de score e controle de fraudes, que entrou em operação em 2024.
De acordo com as projeções da Visa, o VAA evitou o equivalente a US$ 27 bilhões em fraudes pelo mundo em 2022. “Esses produtos estão entre os nossos focos para o ano de 2025″, disse Carvalho.
Leia mais: Visa e Mastercard fazem acordo com o varejo para limitar taxas de cartões nos EUA
Quadro semelhante é projetado para o Visa Protect for account to account (A2A), serviço para análise de pagamentos em tempo real que analisa o risco das transações tanto na originação quanto em relação à conta que recebe os valores.
Iniciado nos Reino Unido, o recurso começou a ser testado em um piloto no Brasil com uma base que deve chegar a 30% de volume de pagamentos do Pix para definir a modelagem mais adequada para o mercado doméstico.
Segundo a companhia, nos últimos 13 meses a tecnologia melhorou a detecção de fraudes e golpes em 63% no Reino Unido, evitou 370 milhões de libras em perdas e melhorou em 40% os casos de falsos positivos, quando o sistema barra uma uma transação que é legítima.
Essas e outras cerca de 200 iniciativas - distribuídas por áreas de soluções de emissão e de aceitação, produtos de risco e Identidade, Open Banking e consultoria - são uma resposta às mudanças no mercado.
Novos entrantes, funcionalidades e modalidades de pagamento instantâneo que se espalham pelo mundo desafiam o duopólio construído pela Visa (V) e a concorrente Mastercard (MA).
É o caso do Pix, tecnologia desenvolvida e gerida pelo Banco Central e hoje o método de transferências mais usado pelos brasileiros. De acordo com o BC, 76,4% da população utiliza o meio de pagamento; cartão de débito, com 69,1%, e dinheiro físico, 68,9% aparecem na sequência.
“Em vez de discutir se o Pix é nosso competidor ou não, o que acho muito menos importante, queremos usar o nosso know-how e nossa tecnologia para agregar valores de serviço em arranjos que não são nossos. Para o Pix, por exemplo, trazemos para o Brasil essa ferramenta de combate à fraude”, afirmou Fernando Amaral, vice-presidente de Soluções e Inovação da Visa do Brasil.
“Não precisamos nos restringir ao nosso modelo de negócio.”
Leia mais: Bancos se unem para criar ‘Pix europeu’ e rivalizar com Visa e Mastercard
O movimento de serviços de valor agregado, conhecido pela sigla VAS, começou a tomar corpo na gigante de pagamentos há quatro anos e tem ganhado tração nos últimos dois.
O próprio Amaral, com passagens por Credicard e pela área de cartões do Itaú Unibanco, chegou faz menos de três anos. “Nós acreditamos que vai crescer muito ainda.”
No terceiro trimestre do ano fiscal de 2024, a divisão de novos negócios representou 24% de toda a operação, finalizada com uma receita de US$ 8,9 bilhões.
No ano fiscal encerrado em junho, a Visa teve um faturamento de US$ 36 bilhões, mas não apresentou a participação específica para a unidade de negócios. A empresa não abre a participação por países.
Globalmente, os novos produtos e serviços miram um mercado anual calculado em US$ 200 trilhões, com a digitalização dos pagamentos tanto por pessoas físicas quanto por corporações e governos. O montante exclui a China e a Rússia.
No modelo desenhado pela Visa, a diversificação de receita caminha lado a lado com o tradicional arranjo fechado, com o processamentos dos pagamentos pela VisaNet. À medida que as tecnologias são testadas e validadas internamente, elas ganham as ruas e são oferecidas a outros negócios, desde os tradicionais até as startups, como as fintechs.
“Quanto mais você investe em AI e dados na VisaNet, mais você aprende e mais você pode usar na expansão do modelo de negócio. E isso cria um ciclo virtuoso”, disse Amaral.
O Brasil desempenha um papel importante nesse processo, pela sofisticação do mercado e pela agilidade com a qual os consumidores aderem às novas tecnologias.
“O Brasil é um país em que é muito importante estar atento, fazer os investimentos cedo e rapidamemte porque as coisas ganham tração. Dá para fazer testes e escalar para a Visa como um todo. Qualitativamente, temos essa importância muito grande”, disse.
Leia também
Mastercard quer eliminar uso de números de cartão em compras online
Visa compra fintech brasileira Pismo por US$ 1 bi após disputa com Mastercard
Flash, de benefícios corporativos, acerta parceria com Visa de olho em expansão