Na Itaúsa, o desafio é encontrar novos investimentos com retorno acima de 16%

CEO da holding que tem o Itaú como principal investida diz em call que o cenário é de cautela e que a área de M&A segue ativa, embora sem negócios no radar para o curto prazo

Alfredo Setubal, chief executive officer of Itausa Investimentos Itau SA
13 de Agosto, 2024 | 04:32 PM

Bloomberg Línea — Não é apenas a Berkshire Hathaway de Warren Buffett que se queixa da dificuldade de encontrar boas oportunidades de investimento no mercado. No Brasil, esse dilema de dispor de caixa, mas não encontrar ativos reais para alocação, também atormenta a Itaúsa, liderada por Alfredo Setubal.

Segundo o executivo que comanda uma das maiores holdings de participações (ITSA4) do país, o desafio tem sido amplificado pelo patamar de juros ainda elevados no mercado brasileiro.

“Continuamos na busca por novos investimentos, mas é difícil encontrar ativos com retorno acima de 16%, 17% [ao ano], o mínimo a se considerar para um novo investimento. Nossa área de M&A está ativa, mas sabemos das dificuldades de encontrar ativos com esse retorno neste momento”, disse Setubal em conversa com jornalistas nesta terça-feira (13).

O patamar de referência citado leva em conta a taxa básica de juros (10,50% ao ano) e os prêmios de risco do Brasil e de execução do negócio e setorial.

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Diante desse cenário, ele disse que a holding não tem planos de ampliar o portfólio no curto prazo. Ao fim do segundo trimestre, a holding tinha R$ 3,8 bilhões em caixa (apesar da semelhança de situação, no tamanho do caixa não há comparação: a Berkshire tinha US$ 277 bilhões em junho).

Dentro do portfólio atual, as investidas não-financeiras da holding, como a Alpargatas (ALPA4) e a Dexco (DXCO3), têm recuperado níveis considerados adequados de vendas, margens e rentabilidade.

A performance das empresas de infraestrutura, como a CCR (CCRO3) e a Aegea, em saneamento, também tem evoluído positivamente.

Em junho, o valor de mercado do portfólio da Itaúsa alcançou R$ 128,6 bilhões, dos quais R$ 118,3 bilhões referentes ao Itaú Unibanco. O valor de mercado da Itaúsa chegou a R$ 101,4 bilhões, o que reflete um desconto de 21,1%.

A Itaúsa alcançou R$ 7,2 bilhões em lucro líquido recorrente no primeiro semestre, o que representou um crescimento anual de 29,7%. O patrimônio líquido chegou a R$ 83,6 bilhões. Já o ROE recorrente (retorno sobre o patrimônio líquido) teve alta de 2,6 pontos percentuais em 12 meses, para 17,5%.

O executivo destacou que a Itaúsa continuou a executar uma estratégia de desalavancagem no primeiro semestre. Os resultados mostraram, segundo ele, um portfólio resiliente, com aumento do dividend yield, o que confirmou a holding como uma das maiores pagadoras de proventos da B3.

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Ele reafirmou o plano de abrir o capital da Engea, empresa de saneamento básico, em que a Itaúsa tem participação minoritária, mas lembrou que a janela de IPO (oferta inicial de ações) segue fechada.

“Gostamos de investir em empresas abertas, que têm mais governança e cobrança do mercado por resultados de longo prazo. Vemos a Engea em algum momento sendo listada na Bolsa, pois precisamos desalavancar a empresa e fazer novos investimentos. Mesmo sendo de capital fechado, temos melhorado a governança da Engea”, afirmou.

As ações da Itaúsa acumula levem valorização de 0,29% no acumulado do ano até a segunda-feira (12) e de 14,23% em 12 meses, ante um desempenho negativo do Ibovespa no período (-2,29%).

Cenário macro e risco de juro mais alto

Segundo Alfredo Setubal, a Itaúsa trabalha com um cenário macroeconômico que requer cautela e posições defensivas diante da maior aversão ao risco, principalmente em razão de conflitos geopolíticos, da eleição americana e de incertezas fiscais no Brasil.

“Se o cenário internacional se deteriorar, sofreremos mais. É possível que aconteça até uma alta do juro [no Brasil] a depender do que ocorrer lá fora”, afirmou Setubal.

O executivo ressaltou, por outro lado, que a Itaúsa ainda trabalha com um cenário-base que projeta a manutenção da Selic em 10,50% ao ano, crescimento de PIB em torno de 2,50% em 2024 e inflação oficial entre 4,00% e 4,50%, acima da meta de 3,00%, mas dentro da margem de 1,50 ponto percentual.

“Não estamos trabalhando com a hipótese de alta do juro, apesar de eventualmente isso ser possível.”

Ele disse que ainda aguarda medidas de cortes de despesas e de controle do déficit fiscal pelas autoridades brasileiras, o que pode ajudar a melhorar as avaliações de riscos sobre as perspectivas das contas públicas e, por consequência, criar condições mais favorável ao crescimento das empresas.

“A economia está um pouco mais aquecida do que era esperado. Para o banco, isso é bom porque aumenta a carteira de crédito, a inadimplência fica mais mais controlada, à medida em que a massa salarial cresce. É um cenário OK, mas não é exuberante, pois traz riscos de longo prazo em relação ao déficit fiscal”, avaliou Setubal.

Por outro lado, o executivo apontou que o cenário internacional está mais “agitado” com a disputa eleitoral para a Casa Branca, a guerra entre Rússia e Ucrânia e o conflito entre Israel e Palestina.

“Não devemos esquecer que o cenário internacional se reflete no Brasil, e ele é bastante complexo, implica riscos. O juro continuará alto no Brasil nos próximos anos”, avaliou o executivo.

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Sérgio Ripardo

Jornalista brasileiro com mais de 29 anos de experiência, com passagem por sites de alcance nacional como Folha e R7, cobrindo indicadores econômicos, mercado financeiro e companhias abertas.