Na Amazon, temor com perda de cultura motivou a volta integral ao escritório

Segundo fontes à Bloomberg News, alta liderança avalia que novos contratados não têm conseguido assimilar práticas como trabalho intenso e eficiente e debates francos e acalorados

A Amazon tem cerca de 350 mil funcionários corporativos que serão afetados pelas novas políticas (Foto: Brent Lewin/Bloomberg)
Por Matt Day
17 de Outubro, 2024 | 06:12 AM

Bloomberg — A decisão controversa da Amazon de trazer os funcionários corporativos de volta ao escritório em tempo integral reflete as preocupações dos executivos de que os novos funcionários não entendem a cultura considerada única da gigante de tecnologia.

No mês passado, o CEO Andy Jassy surpreendeu os funcionários com um memorando em que ordenou que começassem a comparecer ao escritório cinco dias por semana a partir de janeiro de 2025. Atualmente, a Amazon permite que muitos trabalhem de casa dois dias por semana.

O decreto de retorno compulsório ao escritório surpreendeu muitos dos mais de 350 mil funcionários corporativos da empresa e reacendeu um debate acalorado na indústria de tecnologia sobre benefícios dos colaboradores e o valor do trabalho presencial.

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Funcionários e especialistas se perguntaram se isso era uma forma de Jassy de reduzir ainda mais a equipe, após uma série de demissões nos últimos anos. Afinal, o CEO também expressou sua intenção de reduzir os níveis de gerência, em um esforço para cortar a burocracia que, segundo ele, tem desacelerado a Amazon.

Mas a alta liderança fez a mudança, ao menos em parte, porque acredita que a próxima geração de trabalhadores tem sido deixada para trás, sem aprender o “jeito Amazon”, de acordo com três pessoas familiarizadas com as deliberações que falaram com a Bloomberg News.

Jassy mencionou a palavra “cultura” uma dúzia de vezes em seu memorando. “Manter sua cultura forte não é um direito adquirido”, escreveu ele. “Você tem que trabalhar nisso o tempo todo.”

Ciente de que o novo cronograma de trabalho seria controverso, os líderes passaram semanas ponderando os prós e contras, segundo duas pessoas próximas à situação. Brad Glasser, porta-voz da Amazon (AMZN), recusou-se a comentar para a Bloomberg News além do memorando de Jassy.

A Amazon, que se vê como uma coleção de equipes que operam como startups, reconhece há muito tempo que sua cultura pode parecer peculiar para pessoas de fora.

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Funcionários que apresentam novas ideias são incentivados a escrever memorandos detalhados e evitar apresentações em slides. Há uma forte preferência por análises rigorosas de dados e tendências, e bastante tolerância para debates francos e acalorados.

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A gigante do e-commerce e da computação em nuvem também é famosa por ser um ambiente desafiador.

Espera-se que as pessoas trabalhem muito, com inteligência e eficiência, como o fundador Jeff Bezos dizia aos primeiros funcionários da empresa. Prazos agressivos são comuns, assim como sessões de trabalho tarde da noite para muitos profissionais.

Jassy, que começou na Amazon logo após terminar o MBA em 1997, é um produto e um defensor dessas abordagens, segundo colegas.

Desde que sucedeu Bezos no comando há três anos, ele tem sido um embaixador solitário da cultura Amazon, fala frequentemente para grupos de funcionários e até grava vídeos nos quais explica cada um dos princípios de liderança sacrossantos da empresa.

O CEO Andy Jassy, um veterano com 27 anos de Amazon, tem sido um incansável defensor da cultura instaurada pelo fundador Jeff Bezos

Durante a pandemia, a Amazon dobrou seu número de funcionários e eliminou a exigência de que os novos contratados estivessem fisicamente localizados em um grande centro com suas equipes.

Desde então, os executivos têm ponderado abertamente que muitos dos novos colaboradores, especialmente recém-formados, estão perdendo elementos da cultura da empresa que não podem ser transmitidos efetivamente por videoconferências ou janelas de chat, de acordo com as pessoas que pediram anonimato para discutir um assunto interno.

“A cultura é uma parte muito importante de como realizamos o trabalho e como mantivemos a inovação e o ritmo do que fazemos nos últimos 25 anos”, disse Matt Garman, chefe da Amazon Web Services (AWS), em um evento recente, quando questionado sobre os planos de retorno ao escritório da empresa.

“E isso é muito difícil de comunicar, muito difícil de ensinar aos novos funcionários e muito difícil de manter quando você está em uma videoconferência.”

No entanto é improvável que os argumentos da liderança acalmem os funcionários. Salas de chat internas focadas em questões de retorno ao escritório ficaram movimentadas depois que Jassy enviou seu memorando.

Em pesquisas internas, os trabalhadores expressaram insatisfação e pressionaram a empresa a reconsiderar. Alguns funcionários da Amazon já se demitiram, e outros buscam emprego em outros lugares.

Da última vez que a Amazon ordenou o retorno dos funcionários ao escritório, houve uma paralisação na sede da empresa em Seattle. Não está claro se eles farão uma tentativa semelhante novamente.

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