NFL expõe ambição global com sua primeira partida oficial em São Paulo

Liga aposta que o Brasil pode ser um mercado-chave para aumentar a base de fãs fora dos Estados Unidos; país já representa o segundo maior mercado no exterior, atrás apenas do México

Mural NFL Sao Paulo
Por Andrew Rosati - Leonardo Lara - Randall Williams
05 de Setembro, 2024 | 04:51 PM

Bloomberg — A NFL quer criar milhões de fãs como Renan Ribeiro.

O fã de 38 anos cresceu no Brasil obcecado pelo futebol em que o país ganhou cinco Copas do Mundo e não sabia quase nada sobre futebol americano. Ele aprendeu um pouco sobre o esporte em filmes como aquele em que Jim Carrey tenta resolver o sequestro do mascote do Miami Dolphins. Anos mais tarde, ele assistiu a um Super Bowl na TV e ficou viciado.

No Brasil, o futebol está “inserido em sua vida, quer você goste ou não”, disse Ribeiro, artista plástico de São Paulo, que agora assiste com frequência a três jogos da NFL aos domingos. “Não sei se realmente gosto de futebol ou se é simplesmente uma cultura imposta a mim. O futebol americano foi uma escolha.”

A NFL pretende conquistar ainda mais brasileiros com o primeiro jogo de temporada regular realizado na América do Sul nesta noite de sexta-feira (6), entre dois dos times mais tradicionais da liga, o Philadelphia Eagles e o Green Bay Packers, na Neo Química Arena, o estádio do Corinthians, em São Paulo.

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O embate faz parte de um esforço para tornar o futebol americano um esporte global, e a liga vê o Brasil — com mais de 200 milhões de habitantes e a oitava maior economia do mundo — como um mercado-chave.

Há cerca de uma década, a NFL aumentou o investimento no país e agora diz que tem 36 milhões de fãs no Brasil, o que, de acordo com pesquisas de uma empresa de pesquisa independente, o coloca em segundo lugar, atrás do México, entre os fãs internacionais da NFL.

“Isso pode ser um ponto de virada”, disse Bruno Koerich, diretor executivo da Destra Licenciamento de Marcas, a empresa brasileira responsável pelo licenciamento da NFL no país. O jogo pode criar uma relação mais forte entre os torcedores e a marca, disse ele. “Isso amplia a oportunidade de negócios.”

O jogo, que é o segundo confronto da temporada após a abertura da noite de quinta-feira entre o atual campeão Kansas City Chiefs e o Baltimore Ravens, também foi “arrastado” para a política.

Alguns políticos republicanos nos EUA pediram que a NFL cancelasse a partida depois que o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), proibiu a plataforma X no Brasil na semana passada porque o proprietário Elon Musk desafiou as ordens de nomear um representante legal no país.

A NFL é, de longe, o esporte profissional mais popular e lucrativo dos Estados Unidos. Empresas de mídia e big techs continuam a fazer lances cada vez mais altos pelos direitos de transmissão. A liga gerou cerca de US$ 12 bilhões em receita em 2022, de acordo com os últimos números disponíveis.

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Mas a NFL quer mais, sabendo que ser tão dependente dos EUA pode acabar limitando seu crescimento.

A NBA já tem grandes bases de fãs no exterior, e a Major League Baseball (MLB) possui milhões de seguidores no leste da Ásia, na América do Sul e no Caribe. Ambas as ligas também se beneficiam do fato de terem jogadores de todo o mundo, uma forma de atrair fãs internacionais que a NFL não tem.

Apesar de todo o sucesso da NFL nos Estados Unidos, suas primeiras iniciativas para criar uma base de fãs internacionais foram esporádicas e, em sua maioria, não atingiram o objetivo.

Na década de 1980, a liga começou a realizar jogos em solo estrangeiro. Depois, por mais de uma década, ela apoiou uma pequena liga com equipes na Europa. A entidade teve dificuldades para criar raízes, e a NFL encerrou a liga em 2007.

Desde então, a NFL mudou sua estratégia e pressionou por uma presença mais consistente e maiores participações em mercados estrangeiros.

Um grande obstáculo para conquistar os fãs internacionais é que o futebol americano quase não é jogado fora dos EUA. O esporte também tem muitas regras peculiares que podem dificultar o aprendizado.

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“90% da população brasileira não entende as regras. Quantas jardas precisam ser percorridas? Quando você precisa chutar a bola? O que é um touchdown?”, disse Nicolas Caballero, que coordena o programa de MBA em gestão e marketing esportivo da Trevisan Business School, em São Paulo. “Mas existe um segmento muito apaixonado entre os que jogam e os que assistem ao jogo.”

Em resposta, a liga começou a investir no flag football no exterior por meio de seu programa NFL Flag, com o objetivo de ensinar o jogo e connquistar torcedores. A iniciativa estreou no Brasil no ano passado.

O esporte, que agora é praticado em mais de 100 países por um número estimado de 20 milhões de pessoas, fará sua estreia olímpica na Olimpíada de 2028, em Los Angeles.

Há alguns anos, a NFL também iniciou um programa de mercados globais, que permite que os clubes se concentrem na construção de bases de fãs em mercados estrangeiros. As equipes agora têm direitos em 19 países, desde a Nigéria até a Irlanda e a Coreia do Sul.

O New England Patriots e os Dolphins têm direitos de transmissão para o Brasil. Desde que obteve acesso ao Brasil, há dois anos, o Miami realizou watch parties, organizou clínicas de treinamento e usou ex-jogadores para envolver os torcedores.

Para aumentar o interesse, em 2007 a NFL começou a realizar jogos da temporada regular fora dos Estados Unidos. A liga disse que já realizou três dúzias de partidas em Londres, quatro na Cidade do México e três na Alemanha. Agora, as equipes são obrigadas a jogar uma partida internacional a cada quatro anos.

Há cinco desses confrontos nesta temporada e eles podem chegar a oito em 2025. A liga também passou a vender mais direitos de TV para aumentar a exibição de jogos em mercados estrangeiros.

Brasil tem o segundo maior mercado do mundo depois do México para os fãs da National Football League

A chegada de um jogo da NFL no Brasil foi planejada há anos. A liga contratou a agência de marketing Effect Sport na década passada para aumentar o awareness sobre o esporte e a liga, com eventos que incluíram o início de um evento patrocinado pela NFL para assistir ao Super Bowl.

A Effect Sport também promoveu a BFA, uma liga profissional de futebol americano iniciada na década passada e que agora tem cerca de três dúzias de equipes. Muitos dos clubes de futebol mais populares também possuem times de futebol americano.

“Vimos a paixão crescer“, disse Peter O’Reilly, vice-presidente executivo de negócios de clubes, grandes eventos e internacional da NFL.

A liga nomeou recentemente um general manager para o Brasil e planeja abrir um escritório no país. Para jogos internacionais, “o Brasil foi um próximo local natural, dado o tamanho da base de fãs”.

Os organizadores tratam o jogo como um dos maiores eventos esportivos do ano no Brasil. A estrela pop brasileira Anitta fará o show do intervalo.

Os ingressos para a Arena Corinthians, com capacidade para 49.000 pessoas, esgotaram-se em menos de duas horas e agora estão à venda na StubHub por entre R$ 1.100 e R$ 9.300 (US$ 195 a US$ 1.647).

Enquanto isso, as camisas da NFL apareceram em aeroportos e vitrines de lojas. Influenciadores brasileiros de mídia social inundam seus feeds com conteúdo, inclusive explicando as regras do jogo.

E um mural gigante com o quarterback do Eagles, Jalen Hurts, e o do Packers, Jordan Love, está instalado na lateral de um prédio no centro de São Paulo.

“Estou em êxtase”, disse Ribeiro, que vai assistir ao jogo de sexta-feira.

Ele se considera um torcedor do Pittsburgh Steelers porque o time tem uma história de classe trabalhadora como a do Corinthians, seu clube de futebol brasileiro favorito. “Sempre quis ver um jogo, mas não tenho condições de ir aos EUA, muito menos de pagar por um jogo lá.”

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