Investimento em vinícola no Brasil não é hobby e tem retorno, diz fundador da WNT

Valério Marega Jr. começa a produzir vinho em Uberaba e diz à Bloomberg Línea que vê potencial de ganhar dinheiro com a bebida e com o enoturismo; ‘Ninguém entra para perder dinheiro’

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Bloomberg Línea — Uma brincadeira popular no mundo dos vinhos diz que a melhor forma de fazer uma pequena fortuna com uma vinícola é começar com uma grande fortuna. São tantos custos, riscos e desafios para quem investe que é difícil obter um retorno financeiro satisfatório - em qualquer parte do mundo.

Apesar das dificuldades, mais de duas centenas de novas vinícolas estão sendo instaladas no Brasil, especialmente no Sudeste. Somente na região de Andradas e Espírito Santo Pinhal, entre São Paulo e Minas Gerais, há em torno de 60 novas fazendas que plantam uvas para produzir vinhos.

Para quem olha de fora, pode parecer, portanto, um gasto com lazer ou em busca de status, ou até uma “brincadeira” de milionários, dado que a perspectiva de ganhar dinheiro seria baixa. Mas essa é uma interpretação equivocada, segundo Valério Marega Jr., sócio da gestora WNT e dono da vinícola Arpuro, a 50 quilômetros de Uberaba, em Minas Gerais, que acaba de lançar suas primeiras garrafas.

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“Ninguém entra para perder dinheiro. Todo mundo embarca porque o potencial de ter retorno é muito alto”, disse o investidor à Bloomberg Línea durante almoço em São Paulo, enquanto tomava duas garrafas de um aclamado vinho da vinícola Pioli, de Jacutinga, Minas Gerais.

“Não é hobby para ninguém. Empresário não entra em negócio para perder dinheiro. Não estamos fazendo vinho como se estivéssemos comprando uma obra de arte, um Monet. Não é coisa de bilionário excêntrico. Vai dar retorno”, reiterou Marega Jr., fazendo questão de rebater o estereótipo.

Grandes investidores e empresários do país, como André Esteves, do BTG Pactual, e Rubens Menin, da MRV, do Inter e da CNN Brasil, entre outros negócios, também possuem as suas vinícolas.

De ativos estressados ao vinho

Marega Jr. se consolidou no mercado financeiro com investimento em empresas que passam por problemas, conhecido como ativos estressados. Ele se especializou em recuperá-las e depois revendê-las a valores mais altos. No dia-a-dia, “ganho dinheiro com empresas em dificuldade”, resumiu em tom de brincadeira.

Durante a pandemia, ele se refugiou na fazenda de criação de gado da família em Uberaba e percebeu que não conseguia fazer churrasco à noite porque era muito frio, mesmo que tivesse feito calor durante o dia.

“Nessa época, percebi que a amplitude térmica seria boa para plantar videiras, e então conheci a técnica da dupla poda, que agora permite fazer bons vinhos no inverno no Sudeste”, disse. “Decidi plantar uva.”

O empresário se refere a uma técnica que inverte o ciclo natural das videiras para permitir que a colheita ocorra na época mais seca no Brasil, o que rende frutas com maior qualidade para gerar bons vinhos.

Para isso, contou com a experiência da fazenda da família e com a ajuda de especialistas contratados para desenvolver a cultura vinícola no interior de Minas Gerais.

Passou a experimentar em uma área de cinco hectares da fazenda, avaliou que o projeto tinha futuro e ampliou para os atuais 16 hectares dedicados às uvas.

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“O Brasil é o maior exportador de soja, de milho, de carne de porco. Somos os mais eficientes produtores de alimentos do mundo”, disse. “Já tínhamos a área e agora, com a dupla poda, contamos com uma técnica única, que nenhum outro lugar do mundo tem. E investimos em maquinário novo e moderno, com a melhor tecnologia do mundo.”

A ideia de transformar parte da propriedade em uma vinícola também é uma forma de tentar valorizar a cultura local, segundo ele.

“A fazenda de soja tem dificuldade em fazer um sucessor na família. Ninguém quer ficar no campo. Não tem glamour. A vinícola é diferente. A cultura da uva atrai mais os jovens, traz de volta a segunda ou a terceira geração para o campo. A vinícola tem glamour e desafia a soja.”

Enoturismo: retorno antecipado

Marega Jr. não revelou o total investido na instalação da vinícola, mas deu informações que permitem uma dimensão. Segundo ele, os gastos oscilam entre R$ 500 mil e R$ 1 milhão por hectare dedicado ao vinho.

Ele disse que os custos são altos e têm que ser pensados a longo prazo, já que o tempo de plantação até uma colheita de qualidade é longo, e o tempo de preparo e maturação do vinho com qualidade também demora.

Apesar do foco na produção da bebida, o empresário desde o princípio percebeu que o retorno não viria só da venda da bebida. Ele tem dado atenção especial ao potencial do enoturismo, que tem feito a diferença no investimento em vinícolas no país.

“Por que existem mais de 200 vinícolas em construção [no país]? O retorno em enoturismo já é maior do que na venda de vinhos. Cerca de 14.000 pessoas visitam a Vinícola Goes, em São Roque, todo fim de semana. Todo mundo que investe em vinícola pensa no enoturismo”, disse.

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No caso da Arpuro, antes mesmo de ter o vinho pronto para a distribuição, a fazenda já oferecia uma experiência de visita à vinícola. Em seu primeiro ano em atividade, a vinícola já recebia em média entre 70 e 80 pessoas por dia nos fins de semana, segundo ele.

Os turistas podem conhecer a propriedade por R$ 390, experimentar outros vinhos da região (enquanto os da vinícola não estavam prontos), passear e tirar fotos.

“Na minha opinião, a visita já vale muito antes mesmo de o vinho estar pronto. Não é só o vinho, é a experiência”, afirmou. Somente as visitas já geram um retorno de até R$ 250 mil por mês. “Estou ganhando dinheiro desde antes de ter o vinho para vender”, disse Marega Jr.

No total, segundo ele, o apelo do enoturismo deve responder por 50% do retorno que espera ter com o investimento na vinícola.

Bebida de qualidade

Mas Marega Jr. quis deixar claro que os vinhos não são coadjuvantes e que o objetivo é produzir uma bebida de alta qualidade na Arpuro.

O primeiro lote da bebida começou a ser envasado na virada para este ano de 2025. A vinícola começa com quatro variedades de vinhos tintos, brancos e rosés, em um total de mais de 15.000 garrafas. A produção deve incluir espumantes e chegar a 60.000 garrafas por ano no futuro.

A venda deve ocorrer especialmente na própria Arpuro, com foco no público do enoturismo e em quem passa pela região. “Mais de 20.000 carros passam todos os dias pela estrada em frente à fazenda. É um público em potencial para visitar a vinícola e comprar o vinho.”

Um dos principais desafios, segundo ele, é vencer o preconceito de quem não conhece o vinho brasileiro, e muito menos aquele produzido no Sudeste. Isso porque muitos consumidores ainda se preocupam com o suposto status de beber vinhos importados, por exemplo. Mas, segundo ele, a qualidade que a sua vinícola e outras novas entregam é capaz de convencer quem tiver interesse.

“O que vai virar a chave é a nossa eficiência e a qualidade do produto quando for degustado às cegas, e sem preconceito”, disse. Esse alto nível é garantido, segundo ele, justamente pelo enoturismo, que oferece uma margem de manobra para a vinícola. Eles não precisam produzir grandes quantidades ou fazer vinhos que deem lucro em si, e podem investir na qualidade dos vinhos.

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