Inflação e caixa restrito: como a Vale enxerga a mineração nos próximos anos

Executivos dizem no Investor Day que o aumento dos custos de produção e as incertezas na China devem ser os principais desafios do setor no curto e no médio prazos

vale
03 de Dezembro, 2024 | 06:35 PM

Bloomberg Línea — A Vale (VALE3) se prepara para atravessar um período de desafios que incluem incertezas na China, principal consumidor global de commodities, e aumento significativo de custos de produção, o que deve dificultar a implantação de novos projetos e restringir o caixa.

Durante o evento Vale Day, promovido pela companhia em Nova York nesta terça-feira (3), o CEO Gustavo Pimenta disse que os preços do minério de ferro no próximo ano dependerão do que a China fará para estimular sua economia.

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“O país vem adotando medidas [para isso], estamos vendo alguns sinais de melhoria da economia chinesa, mas é um pouco cedo para termos certeza sobre a força dessa recuperação. Há indícios que nos deixam encorajados, principalmente nos próximos seis meses. Nós continuamos otimistas, acreditamos que o mercado ficará equilibrado no próximo ano”, disse a investidores.

Leia mais: Vale, Rio Tinto e BHP: como a fraqueza da China deve impactar o preço do minério

No entanto o executivo ressaltou que os chineses ainda não estão dispostos a pagar pelo minério de ferro de alta qualidade. Nesse contexto, a companhia acredita que os prêmios pagos pelo insumo de teor mais elevado devem apresentar volatilidade.

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“Vai ficar mais caro implantar novos projetos, mas estou muito confiante em nossa nova forma de operação”, disse Pimenta, que assumiu como CEO em 1º de outubro, em substituição a Eduardo Bartolomeo.

Ele acrescentou que a decisão de manter os níveis de investimentos (capex) nos próximos anos visa criar espaço no balanço para reduzir a dívida líquida.

“O caixa vai ficar restrito dependendo do preço do minério de ferro. Os próximos dois anos vão ser mais restritos, mas depois vamos voltar à regularidade.”

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Em 2024, a companhia projetou investimento (capex) total de aproximadamente US$ 6,1 bilhões e, para 2025, cerca de US$ 6,5 bilhões. A meta, segundo executivos, é manter esse patamar nos próximos anos.

O vice-presidente executivo interino de finanças da Vale, Murillo Muller, disse que a companhia e seus competidores enfrentam, desde 2019, aumentos de custos de produção. “A inflação atingiu a nossa indústria, temos uma nova forma de operar agora.”

Ele disse acreditar que a Vale terá um custo de produção de minério de ferro, em 2026, inferior a US$ 20 por tonelada. A meta até 2030 é ter um custo, da mina ao porto, de US$ 18 a US$ 19,5 por tonelada.

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Pimenta avaliou que o ponto de equilíbrio (breakeven) do segmento de minério de ferro é de US$ 90 por tonelada. “Nos últimos dois ou três anos, sempre que a cotação ficou abaixo de US$ 90, o mercado reagiu e começou a remover volumes [de capacidade].”

O executivo salientou que a dinâmica de mercado segue desafiadora.

“As siderúrgicas estão com as margens apertadas, embora queiram fazer a transição [energética]. É difícil tomar decisões estratégicas quando estão tentando manter os negócios lucrativos e as plantas funcionando”, acrescentou.

Para 2024, a companhia estima que a produção de minério de ferro deva atingir 328 milhões de toneladas. O guidance para 2025 prevê um intervalo entre 325 milhões e 335 milhões; no ano seguinte, 340 milhões a 360 milhões e, em 2030, volume de 360 milhões de toneladas.

Regulação e tarifas

Questionado sobre a hipótese de barreiras comerciais no próximo governo de Donald Trump, Pimenta disse que “é um pouco cedo para falar sobre aumento de tarifas”.

“Todo mundo está atento a isso, mas eu diria que tudo vai depender de como a dinâmica de mercado vai se desenrolar, porque é um mercado global, se não colocarem [o produto] aqui [EUA], vão colocar em outros lugares”, destacou.

Ele salientou ainda que, no Brasil, há espaço para modernizar os processos de licenciamento ambiental.

“A legislação está um pouco ultrapassada. Para obter qualquer tipo de licença de mineração são sete anos, enquanto na Austrália e no Canadá são quatro.”

“Acreditamos que a modernização do processo de licenciamento permitirá o desenvolvimento da mineração, dentro de uma pegada ambientalmente responsável.”

Divisão de metais

Para 2024, a Vale projeta capex de aproximadamente US$ 2,5 bilhões a US$ 3 bilhões para o negócio de metais para transição energética. Em 2025, o intervalo de investimentos será o mesmo.

Neste ano, a projeção é a de uma produção de 345 mil toneladas de cobre e 160 mil toneladas de níquel. A companhia prevê dobrar a produção de cobre somente em 2035, para 700 mil toneladas.

Em relatório, analistas do Itaú BBA afirmaram que a Vale precisa priorizar o crescimento da produção de cobre. “Acreditamos que é estratégico para a Vale aumentar a contribuição de metais básicos para seu Ebitda consolidado. As principais áreas para a companhia avançar nesta agenda incluem alavancar investimentos e aumentar a eficiência”, escreveram.

O CEO da Vale Metais Básicos, Shaun Usmar, afirmou que as projeções da companhia são realistas. “É o que podemos executar e entregar, mas temos ainda oportunidades greenfield que não estão incluídas nas previsões.”

Pimenta ponderou que o plano da Vale é ousado, porém realista. “Queremos ter certeza de que começamos o novo ciclo com o pé direito, entregando tudo o que prometemos.”

O executivo acrescentou que ainda há muitas oportunidades para a companhia se tornar mais enxuta. “O mercado não está muito bom, a indústria não está remunerando como vimos no passado. Pensamos que teríamos um ritmo melhor, mas está mais lento, isso teve impacto nos preços”, afirmou o CEO. “Mas nós queremos ser a melhor plataforma da indústria nos próximos anos.”

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Juliana Estigarríbia

Jornalista brasileira, cobre negócios há mais de 12 anos, com experiência em tempo real, site, revista e jornal impresso. Tem passagens pelo Broadcast, da Agência Estado/Estadão, revista Exame e jornal DCI. Anteriormente, atuou em produção e reportagem de política por 7 anos para veículos de rádio e TV.