Bloomberg — A decisão da Coreia do Sul de sediar um sistema antimísseis dos Estados Unidos causou a repentina queda no fluxo lucrativo de turistas vindos da China. Quando a Austrália acusou Pequim de interferir em sua política interna e exigiu respostas sobre a origem da covid-19, a China parou de comprar produtos como carvão, vinho e carne bovina.
Somente quando Pequim tentou punir a Lituânia por abrir um escritório de ligação com Taiwan em 2021, Washington interveio.
Um dos principais resultados desse episódio foi a criação de uma equipe dentro do Departamento de Estado dos Estados Unidos para ajudar quando Pequim responde a disputas políticas com armas econômicas e comerciais — o que os EUA e seus aliados chamam de coerção econômica. A demanda por essa ajuda tem sido forte, segundo o funcionário do governo americano responsável pelo programa.
“Os países estão chegando, e muitos estão chegando dizendo ‘queremos o tratamento dado à Lituânia’”, disse Jose Fernandez, subsecretário para crescimento econômico e meio ambiente, em uma entrevista à Bloomberg News, referindo-se a um pacote de financiamento comercial, acordos de compras e acesso ao mercado que Washington ofereceu à nação báltica.
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Desde então, cerca de uma dúzia de outros países na Ásia, na África, na América Latina e na Europa procuraram orientação sobre como se preparar ou para mitigar a pressão econômica da China, segundo pessoas familiarizadas com o programa, que pediram para não serem identificadas por estarem discutindo informações privadas.
Pequim está “usando seu poder econômico para atrair ou isolar países”, disse Jose Manuel Romualdez, embaixador da Filipinas nos EUA, que está sendo orientada pelo Departamento de Estado sobre possíveis novos mercados de exportação e outras formas de apoio ao seu setor agrícola no caso de um boicote por parte de Pequim.
Essas medidas podem incluir o uso de instalações de armazenamento refrigerado para os produtos agrícolas das Filipinas que a China possa boicotar.
O grupo de oito pessoas do Departamento de Estado, conhecido informalmente como “a empresa” e liderado por Melanie Hart, coordenadora de política para a China no escritório de Fernandez, opera como uma consultoria.
Entre os primeiros passos para seus “clientes” está uma análise das vulnerabilidades comerciais com a China pelos economistas do departamento. Depois, eles buscam maneiras de ajudar a diversificar os mercados de exportação fora da China e, se solicitado, oferecem um apoio público. A equipe também realizou simulações para prever diferentes respostas a Pequim, disseram as fontes.
Um dos motivadores para essa estratégia é o reconhecimento de que os EUA não apoiaram suficientemente a Coreia do Sul ou a Austrália quando a China tentou coagi-las, segundo Wendy Cutler, da Sociedade Asiática, uma ex-negociadora comercial dos EUA que coescreveu um relatório recente sobre as ações chinesas contra a Lituânia.
“Decidimos que já vimos esse filme antes e que era hora de ‘parar a fita’”, disse Fernandez. Questionado sobre a percepção de que os EUA não fizeram o suficiente em casos anteriores, Fernandez disse: “acho que é uma crítica justa.”
China também acusa os EUA
O governo dos EUA também usa o poder econômico em assuntos externos, com a China acusando Washington de “coerção econômica”.
Os EUA têm buscado cada vez mais usar ferramentas econômicas e comerciais em sua competição com a China, incluindo sanções, tarifas e controle de exportações, promovendo o “friend-shoring” para fortalecer cadeias de suprimentos e aumentando o escrutínio de investimentos e fluxos de dados.
Eles também apontam que divisões políticas internas também significam que os EUA geralmente não podem criar novos acordos comerciais, que abririam mercados internos para nações amigas.
“É um desafio para os Estados Unidos porque eles não têm uma agenda comercial ofensiva”, disse Deborah Elms, fundadora do Asian Trade Center em Cingapura. “Não há muito que Washington esteja oferecendo a parceiros atuais ou potenciais no lado econômico.”
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Mesmo se houvesse uma política comercial ativa, “tem se tornado cada vez mais difícil para as partes acreditarem que os EUA seguiriam adiante e entregariam”, disse ela, observando que as nações asiáticas viram os EUA sob o ex-presidente Donald Trump se retirarem de um acordo comercial Ásia-Pacífico e depois viram a administração atual falhar em finalizar o “pilar comercial” de seu próprio framework Indo-Pacífico.
‘Resposta legítima’, diz China. E retaliações
O ministério das Relações Exteriores da China rejeitou a acusação de que tentou coagir a Lituânia, afirmando que suas ações eram uma “resposta legítima” para proteger seus direitos e interesses.
“Os Estados Unidos são o inventor e o detentor da patente da ‘diplomacia coercitiva’, então é extremamente irônico que os Estados Unidos queiram ajudar outros países a lidar com a chamada ‘coerção econômica’”, disse um porta-voz do ministério por meio do WeChat.
No caso da Lituânia, a China intensificou a pressão após um novo escritório comercial de Taiwan no país ter recebido autorização para usar a palavra “Taiwan” em seu nome, em vez de “Taipei”, que tem aprovação de Pequim.
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Em poucos meses, Pequim bloqueou o comércio, inclusive ao remover a Lituânia de seu sistema de alfândega, pressionou multinacionais no país para pararem de comprar produtos lituanos, cancelou créditos comerciais e invalidou os cartões de identidade oficiais dos diplomatas lituanos em Pequim.
Fernandez conseguiu uma oferta de crédito comercial de US$ 600 milhões do Export-Import Bank dos EUA, um acordo recíproco de compras com o Departamento de Defesa e melhor acesso ao mercado dos EUA para produtos agrícolas, como ovos.
Houve também uma série de gestos diplomáticos, incluindo reuniões de alto nível e declarações, e esforços para ajudar empresas lituanas a vender mais para aliados dos EUA na Ásia. Os EUA também assinaram a queixa da União Europeia na Organização Mundial do Comércio em janeiro de 2022.
“A reação foi muito rápida, realmente muito rápida”, disse Gabrielius Landsbergis, ministro das Relações Exteriores da Lituânia, em uma entrevista, elogiando o apoio dos EUA e outras nações do Grupo dos Sete (G7) como um forte sinal. “Eu diria que a maior assistência foi política, porque, geralmente, era uma questão política.”
Ele também ofereceu um aviso para outras nações.
“Tenho 100% de certeza de que não somos o último caso”, disse ele. “Se você é dependente, saiba que isso pode se tornar uma arma e provavelmente será uma arma um dia.”
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