Bloomberg — Ellen Kessler visitava sua mãe na Flórida em 2022 quando a situação teve uma reviravolta.
“Ela me ligou histérica de madrugada, com medo de que sua casa tivesse sido invadida”, disse Kessler, que estava hospedada em um hotel próximo. “Cheguei lá e parecia que ela não era a mesma pessoa. Eu não sabia o que fazer.”
Preocupada em deixar sua mãe de 91 anos sozinha, Kessler decidiu levá-la para sua cidade, o que ela disse ter sido “o pior erro que já cometi”. Estar longe de casa exacerbou a ansiedade da mãe e acrescentou um fardo exigente à vida diária de Kessler, uma diretora sênior de 60 anos da rede de hotéis Hilton.
O problema de Kessler tem se tornado cada vez mais comum.
Mais da metade da força de trabalho dos Estados Unidos tem responsabilidades de cuidado de terceiros fora do trabalho, e cerca de 37 milhões de americanos podem passar, em média, quase quatro horas por dia cuidando de um idoso, de acordo com dados do governo dos EUA.
Os trabalhadores que cuidam de pais idosos e têm filhos em casa, a chamada “geração sanduíche”, relatam níveis ainda mais altos de tensão emocional e financeira, de acordo com a AARP (American Association of Retired Persons), associação que reúne pessoas aposentadas.
As estimativas do custo econômico de cuidados nos EUA variam de US$ 264 bilhões a até US$ 600 bilhões.
“O impacto é sentido por uma parcela surpreendentemente grande da população e tem um custo enorme”, de acordo com um relatório da seguradora Blue Cross Blue Shield. Muitas pessoas que tentam equilibrar suas vidas profissionais com a prestação de cuidados são forçadas a faltar ao trabalho, tirar licença ou pedir demissão.
O problema é tão evidente que tem atraído a atenção de empreendedores. Uma startup busca maneiras de ajudar cuidadores que também trabalham fora. Quando Kessler explicou sua situação ao chefe, ela descobriu que o Hilton possui um novo benefício de cuidados com idosos gerenciado por uma startup chamada Wellthy.
Outras grandes empresas, incluindo a varejista de eletrônicos Best Buy, a big tech Meta (META) e a gigante de fundos Vanguard Group, também oferecem os serviços da Wellthy aos funcionários.
Apenas 12% das empresas, por outro lado, oferecem alguma forma de suporte para cuidados com idosos, de acordo com a Gallagher Surveys.
Embora um número cada vez maior de grandes empregadores ofereça aos funcionários uma licença remunerada para cuidadores e muitos tenham serviços de aconselhamento, quase nenhum oferece orientação personalizada e especializada sobre como lidar com os desafios complexos de cuidar de familiares idosos. Isso significa que a Wellthy tem pouca concorrência direta.
Essa relativa falta de opções de cuidados com idosos contrasta com a maior disponibilidade de benefícios para cuidar de crianças, como o fundo para despesas com creches e serviços de assistência de emergência.
A Wellthy ajuda os trabalhadores a lidar com as inúmeras questões que podem surgir quando um membro mais velho da família precisa de cuidados. Quando Kessler entrou em contato com a startup, eles a colocaram em contato com a cuidadora Lynda Cooke.
A mãe de Kessler tem degeneração macular, que prejudica sua visão, mas sempre resistiu a se mudar para um lugar de cuidados intensivos e em tempo integral, então Cooke orientou a família a buscar um auxiliar de saúde domiciliar.
Uma queda brusca que resultou em uma costela quebrada, contudo, fez com que a mãe de Kessler mudasse sua maneira de pensar sobre a moradia assistida. Cooke foi fundamental para ajudar Ellen com as perguntas certas a serem feitas aos estabelecimentos, bem como para dar orientação sobre a negociação de taxas e apoio emocional.
“Entre o hospital, a reabilitação e tentar trabalhar, é muita coisa”, disse Kessler. “Você sente o desgaste de ter que cuidar de seus pais.”
Os programas de assistência ao funcionário (EAP, na sigla em inglês) que muitas grandes empresas oferecem normalmente não podem ajudar os funcionários a navegar pelo labirinto de provedores de cuidados de longo prazo, regulamentos e opções de pagamento.
Alguns empregadores oferecem serviços que direcionam os funcionários a fornecedores, mas a escassez de auxiliares de saúde domiciliar e outros trabalhadores em funções de cuidados de saúde com baixa remuneração e alta rotatividade pode dificultar a obtenção de ajuda.
“É uma grande brecha”, disse o diretor administrativo e sócio do Boston Consulting Group, Suchi Sastri, que faz parte de uma equipe cuja pesquisa estimou que a escassez de cuidadores no país somada ao envelhecimento da população custará aos EUA US$ 290 bilhões por ano a partir de 2030. “Não acho que esse seja um assunto prioritário no momento, mas precisa estar na agenda dos CEOs.”
Lindsay Jurist-Rosner foi cofundadora da Wellthy em 2014, depois de lutar para equilibrar uma carreira exigente em marketing com o cuidado de sua mãe, que tinha esclerose múltipla e faleceu em 2017.
Ela começou a oferecer o serviço de concierge para pessoas físicas, mas rapidamente expandiu o foco para vendê-lo a empregadores como um benefício patrocinado, o que significa que é gratuito para os funcionários.
As empresas geralmente pagam entre US$ 3 e US$ 6 por funcionário por mês. Isso lhes dá acesso à rede de especialistas em cuidados da Wellthy – muitos deles assistentes sociais experientes – que estão disponíveis 24 horas por dia.
“As pessoas nos procuram em momentos de crise”, disse Jurist-Rosner. “Você tem poucos momentos em sua vida como esse, por isso temos que oferecer o melhor atendimento possível”.
Christopher Cowan, diretor de recursos humanos da ChristianaCare, uma rede de assistência médica que emprega 13.700 pessoas, deu uma chance à Wellthy em agosto do ano passado.
Embora Cowan reconheça que “não é barato”, ele disse que a empresa se pagará se o ajudar a manter 11 enfermeiras ou três executivos que, de outra forma, poderiam ter deixado a empresa devido à responsabilidade de cuidados com idosos.
Joseph Fuller, professor da escola de negócios de Harvard, que estudou o efeito desses cuidados com a força de trabalho e aconselhou Jurist-Rosner quando ela estava lançando a Wellthy, disse que essas obrigações são o principal fator de rotatividade de funcionários.
“Não é preciso muita utilização do serviço para justificar a cobertura”, disse ele. Além dos cuidados com os idosos, a Wellthy também oferece ajuda para crianças pequenas, adolescentes e para os próprios funcionários.
Laura Fuentes, chefe de recursos humanos do Hilton, disse que o Wellthy economizou 20.000 horas de seus 49.000 funcionários nos EUA em menos de um ano, o que a convenceu a expandi-lo para os funcionários da empresa no Reino Unido e na Irlanda.
Kamy Scarlett, vice-presidente executiva sênior de recursos humanos, assuntos corporativos e Canadá da Best Buy, disse que o Wellthy economizou cerca de 60.000 horas para seus 90.000 funcionários nos últimos dois anos e tem um dos mais altos índices de satisfação entre todos os benefícios para funcionários.
“Passei por isso anos atrás e, se eu tivesse a Wellthy naquela época, teria tomado decisões diferentes”, disse Scarlett.
Apesar de tudo o que a Wellthy faz (seus especialistas também entrevistam cuidadores em nome dos trabalhadores) ela não pode compensar os custos do tratamento, que podem ser imprevisíveis e altos. A Wellthy também não pode diagnosticar doenças nem prescrever medicamentos.
Para os trabalhadores que não têm acesso a benefícios de assistência a idosos, principalmente aqueles que ainda têm filhos que moram com eles, equilibrar o trabalho e a família pode ser muito difícil.
Kelly Mann, de 50 anos, ocupa um cargo corporativo de alto nível, ajudando as empresas a mapear o trabalho híbrido. Ela tem uma filha adolescente com transtorno de déficit de atenção e hiperatividade e pais idosos que enfrentam sérios problemas de saúde.
Recentemente, sua mãe de 79 anos foi levada às pressas para o hospital com diverticulite, e uma ressonância magnética de acompanhamento constatou um sangramento cerebral, exigindo uma consulta neurológica.
A internação em uma clínica de reabilitação foi inicialmente rejeitada pelo plano de saúde da mãe, o que obrigou Mann a passar cinco horas ao telefone para recorrer da decisão. Em seguida, sua mãe teve um derrame, o que a levou de volta ao hospital.
Na mesma época, seu pai, de 85 anos, foi diagnosticado com demência em estágio intermediário, exigindo um auxiliar de saúde domiciliar durante o dia. O marido de Mann, que trabalha com imóveis residenciais, ajuda, mas Mann diz que fazer malabarismo com tudo é um fardo. “Tenho tempo livre ilimitado”, disse Mann.
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