Bloomberg Línea — As montadoras chinesas estão ganhando participação cada vez maior no mercado de carros elétricos. No Brasil, marcas como BYD já conquistaram posição de destaque no ranking de vendas de elétricos e híbridos e a expectativa é que, ao longo desta década, grupos chineses como Chery, JAC Motors e Great Wall Motor (GWM) também sejam decisivos no processo de eletrificação da frota brasileira.
Segundo projeção da Bright Consulting, obtida com exclusividade pela Bloomberg Línea, os veículos eletrificados – elétricos e híbridos – devem representar 10% da frota total do Brasil até 2030, independentemente de incentivos fiscais para carros dessa categoria. Hoje, modelos eletrificados respondem por cerca de 0,5% dos veículos que circulam no país.
Com uma estratégia que une preços competitivos e autonomia mais ampla, essas marcas têm contribuído para a expansão do segmento no país.
Carros elétricos e híbridos chineses saltaram de uma participação de 8% do segmento no Brasil em 2022 para 30% no acumulado deste ano. “O market share das chinesas pode aumentar ainda mais em 2023 com novos modelos chegando ao país”, disse o sócio-diretor da Bright, Murilo Briganti, à Bloomberg Línea.
Em sua visão, a disputa em eletrificados deve se intensificar cada vez mais, dado que todas as montadoras estão em busca de garantir uma fatia desse bolo. “As chinesas estão entrando [no mercado] com muita qualidade e baterias maiores, um game changer para o segmento.”
Briganti disse que o tíquete médio dos veículos eletrificados no Brasil é de cerca de R$ 300 mil. Nesse cenário, o preço é uma barreira para a expansão do segmento, já que modelos a combustão nessa faixa representam apenas 6% das vendas totais do mercado automotivo brasileiro.
“O consumidor de carros premium está disposto a pagar mais para ter um elétrico. Já nas categorias de altos volumes, o preço é, sem dúvida, uma barreira. Por essa razão as chinesas podem de fato despontar no mercado”, afirma o especialista.
A chegada de novos modelos ao mercado brasileiro nos últimos meses, especialmente da BYD, levou a uma redução do patamar de preços dos carros híbridos e elétricos, segundo mostrou reportagem da Bloomberg Línea em julho.
Vendas de carros elétricos no Brasil
De acordo com o levantamento da Bright, as vendas de veículos eletrificados no Brasil triplicaram em 2019, o último ano cheio pré-pandemia. Em 2020 e 2021, os emplacamentos no segmento cresceram a um ritmo de 70% ao ano, desempenho que deve se repetir em 2023.
Ainda segundo o estudo, cerca de 45% dos veículos eletrificados vendidos em 2022, no Brasil, eram da família Corolla, da Toyota. Em 2023, entretanto, essa participação deve cair para 25%, principalmente devido à ofensiva das montadoras chinesas.
Os chineses são um fenômeno global. A BYD, por exemplo, vem disputando a liderança do mercado mundial de veículos elétricos com a Tesla (TSLA) e também no segmento a combustão com montadoras tradicionais como Toyota, General Motors, Volkswagen, entre outras.
No Brasil a briga se concentra no segmento de eletrificados. A chinesa Chery (localmente CAOA Chery), por exemplo, já tem um amplo portfólio de modelos híbridos -- Tiggo5X, Tiggo7, Tiggo8 e Arrizo6 -- além do elétrico Icar. Os preços vão de R$ 119.990 (compacto Icar) a R$ 239.990 (SUV Tiggo8).
Já a BYD, que começou a operar no Brasil em dezembro de 2021, atualmente oferece sete modelos elétricos e híbridos no mercado local, que vão de R$ 149.800 (Dolphin) a R$ 539.990 (HAN). O seu modelo de entrada é o mais vendido do segmento no país.
A Great Wall Motor (GWM), com sede em Xangai, chegou ao país em janeiro do ano passado também com uma proposta de portfólio totalmente eletrificado. Os preços vão de R$ 150 mil a R$ 315 mil.
A também chinesa JAC Motors, que opera no país desde meados de 2011, transformou recentemente seu portfólio local e agora aposta nos eletrificados para crescer com modelos que partem de R$ 126.900, entrando na disputa pelo título de montadora com o elétrico mais barato do país.
Além da oferta de modelos com preços competitivos, as montadoras chinesas planejam se instalar no Brasil com produção nacional. A BYD vai assumir a fábrica da Ford (F)em Camaçari, na Bahia, como parte da estratégia de abastecimento do mercado local e, no futuro, da América Latina.
A GWM negociou para assumir a unidade fabril da Mercedes-Benz em Iracemápolis, interior de São Paulo, com expectativa de começar os testes na linha de montagem em meados de maio do ano que vem. Na fábrica, serão produzidos dois modelos, uma picape e um utilitário esportivo (SUV). O plano também é exportar a partir do Brasil.
Desafios para expansão
Briganti explica que um dos principais desafios para a expansão dos elétricos é a bateria, que representa aproximadamente 40% dos custos totais de um veículo zero emissões. Em sua avaliação, essa barreira eventualmente vai ser superada, mas enquanto isso não acontece os preços ainda vão limitar o crescimento do mercado.
Outro problema no Brasil é a infraestrutura de carregamento. Considerando que o país tem dimensões continentais, o altíssimo investimento para espalhar postos de recarga pelo território nacional deve ser um entrave, possivelmente restringindo o segmento aos grandes centros urbanos.
Segundo o estudo da Bright, atualmente existem cerca de 3.650 pontos públicos de recarga de carros elétricos no Brasil. Algumas montadoras vêm estruturando parcerias que visam ampliar essa oferta, que ainda é extremamente tímida perante as necessidades do país.
A expectativa é que empresas ligadas ao setor de energia contribuam com essa infraestrutura, incluindo companhias elétricas e redes de postos de combustíveis. Por ora, esses movimentos são incipientes.
Briganti aponta ainda outro grande desafio para a expansão das vendas no segmento: a falta de definição sobre o caminho que o Brasil quer seguir rumo à eletrificação da frota.
“Não sabemos se haverá migração para um mercado de carros 100% elétricos com incentivos governamentais ou por meio de medidas restritivas aos modelos a combustão”, esclarece. “Também não temos clareza se haverá incentivos para a cadeia industrial”, acrescenta.
Até 2030, a projeção da Bright é que os veículos híbridos “não plug-in” – que não são carregados na tomada – representem cerca de 43,8% das vendas totais no país. Já os híbridos plug-in e 100% elétricos devem atingir somente 15,3% do total emplacado no Brasil até o final da década.
“O carro elétrico é o futuro, mas há outras tecnologias disponíveis para iniciar o processo de eletrificação no Brasil. Já temos alternativas mais baratas”, diz Briganti.
- Matéria atualizada às 10h15 para corrigir a participação de híbridos (plug-in e não plug-in) e elétricos no total de emplacamentos no país.
Leia também
Caminhões com motor elétrico? Para a Scania, há outras alternativas melhores
Vale investe para contratar ex-executivos do Bradesco BBI e do Itaú