De Shein à Temu: asiáticos enfrentam risco de tarifas sobre importações nos EUA

Medida sinalizada pela Casa Branca pode gerar impacto importante sobre plataformas que vendem produtos importados a baixo custo, assim como ocorre no Brasil

A Shein disse que seu modelo de negócios depende mais de uma operação eficiente e de entender os desejos dos consumidores do que de tarifas ou não de importações
Por Olivia Poh - Jeanny Yu
16 de Setembro, 2024 | 10:05 AM

Bloomberg — A repressão prevista pelo governo dos Estados Unidos à importação isenta de impostos de produtos chineses impõe mais uma camada de incerteza para gigantes asiáticas de e-commerce, do Alibaba Group à Temu, que já enfrentam o desafio de lidar com uma crise de consumo em seu país.

As ações do Alibaba e sua rival JD.com caíram cerca de 2% em Hong Kong nesta segunda-feira (16), com investidores analisando as possíveis consequências dos planos de Washington.

Na sexta-feira (13), autoridades da Casa Branca anunciaram que pretendem propor regras que controlariam o uso da chamada isenção dos chamados “minimis”, que permite que produtos com valor inferior a US$ 800 sejam enviados diretamente aos consumidores sem declarações alfandegárias ou impostos. As medidas têm como objetivo reduzir a evasão tarifária e evitar remessas de fentanil.

Leia mais: Amazon planeja loja online com descontos para competir com Temu e Shein

PUBLICIDADE

Isso praticamente fecharia uma brecha que a Temu, da PDD Holdings, e a Shein, especializada em moda, empregaram durante anos para enviar centenas de milhões de pacotes para os EUA anualmente, o que criou um novo mercado às custas da Amazon e de outras empresas varejistas.

As ações da PDD caíram 2,4% na sexta-feira, enquanto a Shein tem capital fechado.

A medida ameaça remodelar partes do mercado de varejo dos EUA e reduzir o entusiasmo que acompanhou a ascensão meteórica de plataformas como Temu, Shein e AliExpress, do Alibaba.

O cerco a importações também acontece em outros países como o Brasil, em maior ou menor grau. No país, o governo federal criou o Remessa Conforme, um programa para certificar e cobrar impostos de empresas que fazem importações de produtos de valores mais baixos, como peças de vestuário.

Essa perspectiva também atingiu as ações de outros varejistas que dependem do consumo nos EUA, como a loja de moda australiana Cettire, nesta segunda-feira.

“Embora o mercado esperasse que o governo dos EUA anunciasse medidas para alterar ou reformar a isenção dos minimis, a notícia ainda foi considerada um desenvolvimento negativo”, escreveu Alicia Yap, analista do Citigroup, em um relatório.

“A falta de visibilidade sobre o prazo de implementação e o impacto potencial continuarão sendo obstáculos para o desempenho do preço das ações no curto prazo.”

PUBLICIDADE

Leia mais: Índice Zara: por que a Shein custa 70% mais no Brasil que nos EUA, segundo o BTG

Os investidores têm se preparado para essa medida há algum tempo. A Comissão Europeia tem mantido o setor de moda fast fashion em sua mira desde pelo menos 2021, quando a presidente Ursula von der Leyen o denunciou como um “veneno” devido ao impacto ambiental das roupas descartáveis.

As autoridades dos EUA também se preocupam com a possibilidade de outros itens ilegais - como drogas - entrarem no país.

Em declarações separadas, a Temu e a Shein disseram que seu crescimento não depende da política de isenção de impostos dos EUA. As duas empresas ligadas à China disseram que se concentrariam na eficiência dos negócios e em manter os consumidores satisfeitos.

“Nosso sucesso está ancorado em nosso modelo de negócios exclusivo sob demanda”, disse a Shein em sua declaração, acrescentando que ela “solicitou uma reforma de minimis para criar um ambiente nivelado e transparente - em que as regras são aplicadas de maneira uniforme e igualitária”.

Por enquanto, investidores adotam uma atitude de esperar para ver, embora se espere que o impacto seja amplo.

A Amazon, por exemplo, sofreu pressão de Temu e Shein - tanto que desenvolve um mercado de descontos em sua plataforma para que os comerciantes chineses enviem diretamente para os EUA.

“O aspecto claramente positivo é a possível redução das pressões competitivas dos exportadores baseados na China, com impacto sobre o custo de marketing e a demanda”, escreveram analistas do Morgan Stanley, liderados por Nathan Feather, ao descrever como varejistas dos EUA como eBay e Etsy podem se beneficiar.

Ainda assim, segundo eles, ambas as empresas “têm bases de vendedores chineses”.

A Shein, que se prepara para uma oferta pública inicial em Londres que pode atribuir à gigante chinesa de vestuário um valor de mercado mais de US$ 60 bilhões, foi pioneira no modelo de segmentação voltado a americanos preocupados com os custos, ao vender blusas por US$ 2 e camisas por US$ 10 na pandemia.

A Temu entrou em cena por volta de 2022 com o slogan “Shop Like a Billionaire”, tornando-se rapidamente um dos maiores impulsionadores de crescimento da PDD em todo o mundo.

Os analistas estimam que a Temu é responsável por cerca de 10% dos negócios gerais da PDD - e que uma grande parte disso venha dos EUA.

Leia mais: Como o bilionário fundador da loja online Temu se tornou a pessoa mais rica da China

A Temu provavelmente movimentou cerca de US$ 20 bilhões de volume bruto de mercadorias no primeiro semestre de 2024, dos quais cerca de 40% vieram dos Estados Unidos, estimou um analista da Jefferies, Thomas Chong.

E o crescimento explosivo que coroou a PDD como a “queridinha” do mercado dá sinais de se esgotar, prejudicado pela implacável desaceleração do consumo na China.

A Shein, por sua vez, não pode se dar ao luxo de enfrentar qualquer incerteza antes de sua estreia no mercado de capitais. E ambas estão sendo submetidas a um escrutínio cada vez mais intenso nos EUA, à medida que seu relacionamento com a China entra em foco antes das eleições de novembro.

“Os riscos geopolíticos há muito tempo preocupam os investidores, em especial a questão tarifária relacionada ao comércio eletrônico internacional”, escreveu Chong.

- Com a colaboração de Catherine Ngai.

Veja mais em bloomberg.com

Leia também

Casa de Negócios: como a Shein tem construído uma rede de fornecedores no Brasil

©2024 Bloomberg L.P.