Da liderança aos ativos: como a Prio se tornou a melhor aposta de Nelson Tanure

Em uma década, a ação da ex-PetroRio saltou de centavos para quase R$ 40; diferentes decisões levaram ao crescimento da empresa que é hoje a maior operadora independente de óleo e gás do país

PRIO
07 de Março, 2025 | 05:10 AM

Bloomberg Línea — Depois que as principais empresas do grupo EBX entraram em recuperação judicial em 2014, o investidor e empresário Nelson Tanure e seu filho, Nelson Queiroz Tanure, foram atrás de executivos que tiraram do papel e viabilizaram algumas das ideias mais ousadas de Eike Batista para impulsionar a então HRT, produtora de petróleo que deu origem à PetroRio – hoje PRIO.

Roberto Monteiro, que à época era diretor financeiro da OGX e da OSX, foi escolhido para integrar a diretoria da PRIO, posteriormente assumindo como CEO. Milton Rangel, que também trabalhou nas duas empresas, é hoje CFO da PRIO (PRIO3).

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Desde então, há uma década, as ações da operadora independente saíram de um preço inferior a R$ 1 para o patamar atual próximo a R$ 40.

O sucesso da companhia no período, reconhecido por investidores, se deve, em parte, à atuação de Monteiro à frente das operações da empresa, do chão de fábrica às decisões estratégicas, de acordo com quase uma dezena de fontes ouvidas pela Bloomberg Línea nas últimas semanas.

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Em paralelo, o papel ativo de Tanure e de seu filho, conhecido como “Nelsinho”, no dia a dia da companhia tem se mostrado determinante para esse desempenho. Nelson Queiroz Tanure é presidente do conselho de administração da PRIO.

Procurados pela Bloomberg Línea nas últimas semanas, Nelson Tanure, Nelson Queiroz Tanure e a diretoria da PRIO não quiseram comentar sobre os temas abordados nesta reportagem.

A PRIO lidera atualmente a produção de petróleo entre as operadoras independentes do país, as chamadas junior oils. A empresa produziu em média 70.000 barris por dia (bpd) no terceiro trimestre de 2024, seguida da Brava (BRAV3) (nome do grupo resultante da fusão entre 3R e Enauta no ano passado), que somou uma produção diária média de 58.000 barris no período.

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Segundo levantamento da Rystad Energy, realizado a pedido da Bloomberg Línea, a PRIO deve se tornar a quarta maior produtora de petróleo do Brasil em 2025, desbancando grandes petroleiras globais, com produção estimada de 114,9 mil barris para este ano.

De acordo com fontes próximas à companhia ouvidas pela Bloomberg Línea, que falaram sob condição de anonimato ao tratar de assuntos privados, o “ambiente” na PRIO se assemelha ao de uma startup.

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As decisões são tomadas com agilidade, o que facilita não só a organização da operação mas também da cadeia de fornecedores, em amplo contraste, por exemplo, com a Petrobras (PETR3, PETR4), responsável por 90% da produção de petróleo e gás no país.

Para se tornar um fornecedor direto da estatal brasileira, uma empresa postulante precisa cumprir uma série de requisitos para obter um certificado, o CRC (antigo CRCC), que pode demorar de três a seis meses para ser emitido. Em alguns casos, isso pode levar até dois anos.

Embora a PRIO tenha ritos rigorosos e cumpra as normas da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), há uma celeridade maior nas contratações, relatou um grande fornecedor da empresa, que falou sob condição de anonimato porque as discussões são privadas.

A negociação dos contratos, por exemplo, é feita por meio de concorrência aberta com três empresas, mas a relação é mais próxima, o que acaba favorecendo processos mais céleres, acrescentou a fonte.

Conforme um alto executivo ligado à PRIO, que falou sob condição de sigilo, demonstrar capacidade de entrega e resultado vale mais para a companhia do que apenas “tradição” de mercado, o que facilita as negociações com fornecedores.

Cultura e incentivos

Na PRIO, há uma cultura que incentiva todos os funcionários a deter ações da companhia, desde um analista até um engenheiro. Embora essa seja uma prática comum em outras empresas listadas, na operadora de petróleo isso é acima da média, segundo apurou a Bloomberg Línea.

O próprio CEO tem uma participação relevante na empresa, com boa parte do seu patrimônio proveniente da PRIO, o que o deixa altamente exposto à companhia – é o caso de “skin in the game”, disse uma fonte do mercado, que destacou o seu forte interesse no sucesso da operação.

Monteiro é visto no setor de óleo & gás como um executivo que se envolve ativamente na resolução de todos os problemas críticos da companhia. Também tem a reputação de agilizar os negócios e priorizar uma equipe altamente técnica. Com sua experiência nessa indústria, acabou se tornando uma escolha acertada de Tanure, disse uma fonte.

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Outra decisão elogiada no mercado é a política de remuneração dos executivos da empresa, considerada “bastante agressiva”. É algo que parte ativamente de Tanure e Queiroz Filho, segundo fontes ouvidas pela reportagem.

Em 2023, o valor da maior remuneração paga a um membro da diretoria executiva da PRIO foi de R$ 40 milhões, segundo o formulário de referência da companhia, o que colocou Monteiro como um dos cinco CEOs mais bem remunerados entre as companhias listadas do país no período.

Para o exercício de 2024, o documento previa remuneração total de R$ 182,3 milhões para os três membros da diretoria executiva, composta pelo CEO (Roberto Monteiro), o CFO (Milton Rangel) e o diretor de operações ou COO (Francisco Fernandes).

No entanto a PRIO informou à Bloomberg Línea ter desembolsado no ano passado o valor de R$ 178 milhões de remuneração total a “cinco diretores da companhia e suas subsidiárias, além dos oito membros do conselho de administração”.

A empresa disse que, “em respeito ao compromisso com a privacidade e a confidencialidade de seus colaboradores”, a empresa “não divulga informações detalhadas sobre valores salariais”.

Acrescentou que “a composição da remuneração é formada por um salário fixo, acrescido de bonificações relacionadas ao cumprimento de metas individuais e de desempenho da companhia”.

Por fim, a PRIO destacou que, em 2023, a empresa “alcançou marcos significativos com a revitalização do campo de Frade e a aquisição do campo de Albacora Leste, iniciativas que resultaram em um expressivo aumento da produção e, consequentemente, nos resultados financeiros da companhia.”

Pai e filho

Conforme apurou a Bloomberg Línea com pessoas próximas à empresa, o grande mérito de Tanure foi enxergar uma oportunidade na PRIO, que dez anos atrás tinha geração de caixa negativa. O faturamento saltou de R$ 250 milhões, à época, para mais de R$ 14 bilhões atualmente.

O desempenho passou a melhorar após mudanças drásticas na gestão da companhia. E o resultado começou a evoluir de maneira mais evidente principalmente a partir de 2020.

Naquele ano, a PRIO comprou 80% do campo de Tubarão Martelo, então detido pela Dommo (ex-OGX) – que dois anos depois foi comprada pela própria PRIO.

Para uma fonte ligada à empresa, o negócio idealizado por Eike acabou servindo de base para o mercado atual de operadoras independentes no Brasil, o que não passou despercebido por Tanure e Queiroz Tanure.

PRIO

Não só Tanure teria o mérito de balizar o crescimento vertiginoso da PRIO, como segundo uma fonte próxima, “Nelsinho” trabalhou fortemente para promover no mercado a tese da revitalização de campos maduros logo que a família chegou à HRT, batendo à porta dos agentes mais importantes do setor.

Na área social, o filho do empresário tem promovido ações de educação e capacitação para gerar mão de obra qualificada e local, em um setor altamente competitivo, apontou uma fonte.

Investimentos em outras empresas

Tanure está na base de acionistas da PRIO há uma década, um longo prazo que nem sempre caracterizou o seu modus operandi no mercado de capitais.

O empresário ganhou reputação ao longo de muito anos por comprar participações em empresas com dificuldades financeiras, buscar promover melhorias na operação e sair depois de esperada - e eventual - valorização das ações.

Uma de suas últimas apostas foi a aquisição de uma fatia de 35% na Light (LIGT3) - por meio da gestora WNT, ligada a Tanure -, após uma crise financeira profunda que levou a companhia do setor elétrico do estado do Rio de Janeiro a entrar em recuperação judicial em 2024.

Há casos também de empresas em melhores condições operacionais e financeiras - mas igualmente com ampla perspectiva de valorização das ações, na visão do experiente investidor.

Tanure montou posição na Ambipar (AMBP3), empresa líder na gestão de resíduos ambientais, em 2023. Chegou ao equivalente a 15% do capital em agosto passado.

Depois de uma valorização de mais de 700% nos preços das ações em 2024 - de uma cotação de cerca de R$ 15 há um ano para o patamar de R$ 120 -, a Trustee DTVM, que, segundo uma fonte do mercado, é ligada ao empresário, reduziu sua fatia na empresa para 8,9% em janeiro deste ano.

Apesar da valorização expressiva, há preocupação de investidores com a alavancagem da companhia, que apresentava uma dívida líquida de R$ 4,5 bilhões ao fim do terceiro trimestre de 2024, com um Ebitda (métrica de geração de caixa operacional) de R$ 515,3 milhões.

Tanure também montou uma posição de 9% no capital do GPA (PCAR3). Além disso, assumiu o controle da rede de supermercados Dia, em recuperação judicial, por meio do fundo de investimentos Arila.

Seu plano, segundo fontes do mercado, seria promover uma fusão do Dia com o Grupo Pão de Açúcar.

Segundo uma fonte do mercado, uma eventual saída de Tanure da PRIO dependeria da evolução de outros investimentos em empresas como a Ambipar.

Futuro da operação

Na avaliação de Gabriel Barra, analista de óleo e gás do Citi, os fundamentos da PRIO continuam “intactos”. “É uma companhia que gera muito caixa, tem um bom management, com histórico de execução de alocação de capital e com um upside [potencial de ganhos] em relação ao preço atual. Gostamos da tese”, disse à Bloomberg Línea.

Ele acrescentou que a operadora pode atingir uma curva de produção perto de 200 mil bpd “nos próximos dois ou três anos” e, mesmo em cenários de petróleo ao redor de US$ 40 dólares, ainda geraria caixa. Barra disse, porém, que a curva de produção é um ponto de atenção.

A PRIO obteve no último dia 28 de fevereiro a licença de perfuração do Ibama para o campo de Wahoo, na bacia de Campos, no Espírito Santo. O ativo deve adicionar cerca de 40.000 bpd à produção da companhia.

“O mercado tem acompanhado de perto se a PRIO vai conseguir começar essa perfuração para ajudar na geração de caixa”, disse Barra.

Segundo comunicado ao mercado, a próxima etapa do projeto de Wahoo é a avaliação do estudo de impacto ambiental, o que é “crucial para a emissão da licença prévia e para a licença de instalação da infraestrutura submarina que viabilizará a produção.”

Para o head de petróleo, gás e petroquímica na equipe de equity research do Santander (SANB3), Rodrigo Almeida, a PRIO demonstra que tem ampla capacidade de operar ativos depois de fusões e aquisições.

“O histórico mostra que a empresa fez boas alocações de capital. Além disso, a produção segue crescente e resiliente, exceto por alguns percalços no ano passado. Entre seus principais pares, vemos a PRIO de forma mais destacada no operacional”, disse Almeida à Bloomberg Línea.

Ele acrescentou a avaliação de que a PRIO tem uma atuação “extremamente alinhada com o acionista”, o que é difícil encontrar em outras empresas da bolsa. Por ora, ele disse não enxergar riscos em relação à administração da companhia.

Por outro lado, na avaliação do especialista, enquanto não houver visibilidade sobre a entrada em operação do campo de Wahoo, não deve haver um grande catalisador para os papéis da companhia. “Além disso, um grande risco para a empresa está relacionado aos preços do petróleo”, disse.

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Juliana Estigarríbia

Jornalista brasileira, cobre negócios há mais de 12 anos, com experiência em tempo real, site, revista e jornal impresso. Tem passagens pelo Broadcast, da Agência Estado/Estadão, revista Exame e jornal DCI. Anteriormente, atuou em produção e reportagem de política por 7 anos para veículos de rádio e TV.