Como a Globo Ventures mira além do retorno com seus investimentos em startups

Luis Lora, managing partner do braço de investimentos do Grupo Globo, conta à Bloomberg Línea sobre o racional que levou à construção de um portfólio com cerca de 30 startups

Por

Bloomberg Línea — Em um momento de transformação dos hábitos de consumo de mídia, impulsionada pelo crescimento dos serviços de streaming, a Globo Ventures, “braço” de investimentos do conglomerado de mídia brasileiro, tem buscado criar oportunidades e diversificar os negócios e o patrimônio do grupo.

Em entrevista à Bloomberg Línea, Luis Lora, managing partner da Globo Ventures, disse que a estratégia de investimentos é baseada em uma visão de longo prazo. Isso significa que as decisões sobre em quais empresas investir são tomadas com base em fundamentos dos negócios, e não com o único objetivo de obter retorno e liquidez com eventual venda ou oferta pública inicial (IPO, na sigla em inglês).

“Reconhecemos o poder da tecnologia para criar novas oportunidades de negócio, mas também que o Brasil é um mercado que tem suas particularidades, entre elas a liquidez“, disse Lora.

“Você tem que sempre considerar o potencial de uma empresa escalar e ser independente, sem necessariamente precisar de um IPO nos Estados Unidos. Apostamos em empresas que sabemos que podem ser independentes.”

A Globo Ventures tem participações em cerca de 30 empresas e faz uso estratégico do modelo de media for equity, em que recebe uma fatia da empresa em troca de exposição em mídia. Foi o caso do QuintoAndar, maior plataforma digital de aluguel e venda de imóveis residenciais do país, em agosto de 2023.

Outras startups já aderiram a esse modelo, como Stone, Petlove e Daki, plataforma de supermercado online, que recentemente levantou R$ 25 milhões com o 4Equity Media Ventures, fundo da América Latina específico no mercado de media for equity.

O media for equity é comumente usado por startups ou empresas em crescimento que podem não ter orçamento suficiente para publicidade, mas que estão dispostas a compartilhar sua participação acionária como forma de pagamento.

“Mídia é uma parceria estratégica. Tem muita coisa que não é só mídia. O resultado final é um plano de mídia executado, mas aí tem muita inteligência, muito apoio, e é muito raro que uma empresa pequena esteja pronta para esse tipo de investimento em mídia. Portanto, ajudamos com isso”, disse Lora.

Lora, que é porto-riquenho, ocupou anteriormente o cargo de managing director no banco de investimento americano Allen & Company por quase uma década, supervisionando relacionamentos e operações.

Posteriormente, foi convidado a participar do comitê de investimentos interno da Globo, no qual analisou oportunidades de diversificação e investimentos em novas ideias e tecnologias.

“Conheci eventualmente membros da família Marinho e fizemos muito trabalho como assessoria de operações, como a venda do Zap para o Grupo Viva Real”, disse. “Também fizemos muitos estudos sobre mídia.”

O comitê de investimentos foi criado em 2007, inspirado em modelos de sucesso em outros mercados, e depois evoluiu para se tornar uma empresa de investimento independente.

Fundo com liquidez

A Globo Ventures tem um capital permanente com liquidez própria que é utilizado em seus veículos de investimento em busca da geração de valor. Em investimentos diretos, a empresa aporta aproximadamente US$ 60 milhões por ano. “Acho que no curto prazo isso vai continuar”, disse Lora.

O fundo da Globo Ventures tem o próprio Grupo Globo como sócio-investidor exclusivo. O capital do fundo permanece na gestão da Globo Ventures, sendo retornado de maneira estratégica. O objetivo final da Globo Ventures é “retorno financeiro e diversificação de riscos em áreas potenciais de criação de valor a longo prazo.”

O managing partner disse que considera importante ter relevância na estrutura de capital, mas que não há um tamanho pré-determinado para a participação.

“Depende de cada caso: tem aqueles nos quais entramos em empresas já mais avançadas, mais maduras. Por causa da relação estratégica, às vezes temos uma participação pequena mas muita presença dentro da uma área de muita influência. Não somos investidores passivos”, disse.

Um dos casos de maior retorno foi o investimento na Rappi, quando a startup de entregas colombiana entrou no mercado brasileiro. “Adoramos a ideia de uma empresa que está entrando no Brasil de uma maneira agressiva, ou que já está no Brasil e podemos ser um parceiro local”, afirmou.

A Globo comprou recentemente a participação do fundo DGF na Ingresse, que faz a gestão de ingressos para eventos. Lora destacou a relação com a startup, na qual a Globo Ventures já era acionista.

“É uma empresa que conhecemos muito bem, que fez um trabalho sensacional durante o ano, tem uma gestão incrível e que agora está com um dos melhores resultados da sua história”, disse.

Lora enfatizou a preferência por conhecer profundamente a equipe de gestão e outros investidores, optando por entrar nas empresas de preferência em uma rodada de investimento primária do que com a compra de participação de outros investidores.

O que atrai a atenção?

Lora disse que a oportunidade de entrar em mercados grandes, relevantes e em áreas em que a Globo Ventures se sinta confortável é um dos racionais para as decisões de investimento.

“São negócios nos quais, por meio de nossos ativos, nossos conhecimentos, teremos algum insight sobre o mercado de atuação. Somos uma empresa de cobertura nacional e conseguimos capturar a temperatura do brasileiro”, disse, em referência ao fato de que o Grupo Globo está presente em todo o país, seja por meio da televisão aberta ou de outros canais de distribuição de conteúdo.

Essa abrangência nacional, portanto, acaba sendo valiosa para gerar insights de negócios sobre diferentes regiões e públicos, disse.

Ele também pontuou que é fundamental passar tempo com os empreendedores e com os fundadores que tenham ambição, inteligência, mas também uma certa dose de realismo.

“[É importante saber] como combinar essa grande ambição, essa inteligência, esses sonhos grandes, com muito pouco tempo de execução e capacidade de entender também que as coisas podem ser bem diferentes”, disse.

Leia também

Novo streaming de esporte com ESPN pode acelerar derrocada da TV paga

Como a Unilever cresceu 50% em alimentos em 3 anos de olho nas novas gerações

Quem são os brasileiros de mídia e entretenimento entre os 500 mais influentes da América Latina