Bloomberg Línea — Depois de muitos anos com diferentes tentativas, montadoras chinesas finalmente conquistaram espaço significativo no Brasil com a aposta no segmento de carros elétricos. Em um mercado em transformação, a expectativa é que as empresas do país asiático sejam decisivas na transição energética da frota brasileira, segundo fontes ouvidas pela Bloomberg Línea.
As chinesas BYD, GWM e Caoa Chery já respondem por metade das vendas de carros híbridos no país, segundo dados da Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores (Fenabrave) referentes ao primeiro trimestre de 2024. Nos emplacamentos de automóveis 100% elétricos, as três montadoras e a também chinesa JAC Motors possuem quase 90% de participação de mercado.
No período pré-pandemia, o mercado de eletrificados no Brasil era dominado pelas montadoras pioneiras no segmento, como as japonesas Toyota (TM) e Nissan (NSANY) e a francesa Renault.
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Em 2019, a Toyota liderou as vendas de híbridos no país, com 86% de market share, enquanto a Renault dividiu a liderança de carros 100% elétricos com a Chery, com 24% de participação cada uma, segundo levantamento da Bright Consultoria Automotiva a pedido da Bloomberg Línea.
A primeira onda de expansão das montadoras chinesas no Brasil aconteceu há cerca de 15 anos, com a chegada agressiva de marcas como JAC Motors e Chery. Depois de rápida escalada das vendas, entretanto, mudanças na tributação do setor automotivo afetaram marcas que não produziam localmente.
Desta vez, montadoras chinesas emergem com uma proposta que vai além do preço competitivo e inclui novas tecnologias e design aprimorado. A decisão de produção local também deve garantir vantagens em termos de tributação e, consequentemente, de preços ao consumidor. A Caoa Chery já produz veículos no país; a BYD e a GWM planejam linhas de montagem em território brasileiro.
A oferta mais ampla de modelos eletrificados no mercado brasileiro, com destaque para as marcas chinesas, foi um fator decisivo para o aumento das vendas.
Os cinco modelos elétricos mais vendidos do país no primeiro trimestre deste ano são chineses: quatro são da BYD, e um, da GWM, segundo dados da Associação Brasileira do Veículo Elétrico (ABVE).
A entidade projeta um crescimento das vendas de mais de 60% em 2024, para cerca de 150 mil unidades. “O Brasil entrou na eletrificação de forma consistente, com várias ações nos últimos anos, como a exclusão dos elétricos do rodízio de São Paulo. Faltavam políticas públicas que tivessem repercussão na decisão de compra do consumidor”, disse o presidente da ABVE, Ricardo Bastos.
Ele disse que tais modelos são mais completos e oferecem diferentes tecnologias de segurança e multimídia, o que encarece os produtos. “Mas, quando há escala, é possível diluir esse custo.”
Avanço agressivo em concessionárias
As montadoras chinesas aceleraram a oferta também de modelos mais acessíveis em termos de preços, o que acirrou a disputa no mercado. No segmento de híbridos, cujo volume de vendas é maior do que a de elétricos, BYD, Toyota e GWM vêm disputando de perto a preferência do consumidor.
Segundo o ranking da Fenabrave, em híbridos a briga por market share é mais acentuada principalmente entre a BYD e a Toyota. Já em elétricos, a chinesa lidera com folga em emplacamentos, com 71% de participação.
A estratégia agressiva da BYD impactou todo o mercado em 2023, levando a uma redução dos preços pelas concorrentes. “O preço do carro elétrico vem caindo sequencialmente. Vimos o efeito BYD puxando o mercado para baixo”, disse Filipe Nielsen, analista responsável pelo setor de transportes no Citi (C) no Brasil.
A montadora que ultrapassou a Tesla (TSLA) de Elon Musk globalmente no quarto trimestre de 2023 vem crescendo de forma significativa também no Brasil.
O representante com maior fatia de vendas da BYD no país é o grupo Dahruj. “Vamos chegar a 15 lojas [da marca] no estado de São Paulo. Hoje 20% das vendas da BYD no Brasil é da Dahruj”, afirmou o diretor do grupo, André Scinocca.
A aposta em expansão da rede vem trazendo resultados.
Além do crescimento do número de lojas da BYD, o grupo transferiu a unidade da marca para um espaço maior na avenida Europa, endereço icônico da cidade de São Paulo que abriga lojas de montadoras de luxo como Land Rover, Porsche, Jaguar, Ferrari, BMW, Mercedes-Benz e Audi.
A Dahruj investe como também em outra chinesa: o grupo tem quatro lojas da GWM. E, para tentar fidelizar o cliente no segmento eletrificado, também decidiu investir em infraestrutura de carregamento, uma das principais preocupações do consumidor nesse segmento (veja mais abaixo).
“Temos 66 pontos de venda em todo o estado de São Paulo e o plano é colocar um carregador de alta potência em cada um deles”, disse Scinocca. Segundo ele, um equipamento pode custar até R$ 170 mil.
Do total de vendas da Dahruj no ano passado, 32% foram de veículos eletrificados. Para 2024, o grupo projeta 30% de crescimento do faturamento total em relação ao ano passado. “A BYD vai puxar esse avanço com os lançamentos previstos. O ganho de escala da marca vai ser muito forte”, previu o executivo.
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Ele acrescentou que a chinesa GWM também vai contribuir para a expansão do segmento neste ano. “De agosto de 2023 para cá, essas marcas entraram mais agressivamente no segmento, o que pressionado o mercado. As chinesas estão ditando os preços dos elétricos”, disse Scinocca.
Desafios e riscos ao crescimento
De acordo com executivos do setor automotivo ouvidos pela Bloomberg Línea, as marcas chinesas serão cruciais na eletrificação da frota brasileira, em especial a BYD. Com uma oferta diversificada e preços atrativos, a empresa deve mudar o jogo não só nas vendas de veículos novos mas também na locação - apesar do movimento na contramão desse segmento -, após ganho de escala no país.
A montadora tem acertado parcerias em diversas frentes para alavancar as vendas, da indústria de insumos a empresas interessadas no negócio de abastecimento de carros elétricos.
O plano agressivo de crescimento no país inclui a liderança do mercado total de automóveis. Mas, apesar do avanço recente, há dúvidas no mercado sobre a capacidade da BYD de tirar participação significativa de montadoras tradicionais como Stellantis (STLA), Volkswagen e General Motors (GM).
Em paralelo, há preocupações no mercado sobre a infraestrutura de abastecimento dos carros elétricos, o que pode limitar o crescimento do mesmo.
O presidente da ABVE disse que parcerias têm sido feitas no país para aumentar a infraestrutura de carregadores. “Grandes empresas estão realizando investimentos pesados na área. Muitos carregadores são importados, mas nós também produzimos aqui e isso é um passo importante para o setor. A resposta a essa demanda está sendo rápida”, disse Bastos.
A realidade, entretanto, ainda é altamente desafiadora.
Segundo levantamento da Bright, atualmente existem cerca de 4.300 pontos de recarga públicos no país. Apenas 6% são de recarga rápida, ou seja, o restante demanda horas do consumidor para abastecer o carro. “O Brasil tem dimensões continentais e existem estados em que os pontos de recarga inexistem ou são ínfimos”, disse o diretor da consultoria, Murilo Briganti.
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