Com preço do carro ainda elevado, locadoras têm desafio de repasse de tarifas

Apesar da melhora nas condições de negociação com as montadoras, empresas enfrentam dificuldades para equilibrar os custos, disseram agentes do setor à Bloomberg Línea

locadoras
29 de Abril, 2025 | 05:59 AM

Bloomberg Línea — Após um primeiro trimestre de demanda aquecida, as empresas de locação de veículos no mercado brasileiro enfrentam dificuldades para repassar o aumento de custos das operações, relataram agentes do setor à Bloomberg Línea. Diante do patamar de preços dos veículos ainda elevado, as locadoras devem ter desafios para manter a rentabilidade em 2025.

Segundo o vice-presidente da Associação Brasileira das Locadoras de Automóveis (ABLA), Paulo Miguel Jr., as empresas vêm tentando repassar, ao longo dos últimos três anos, o aumento expressivo dos preços dos carros nas tarifas. No entanto os reajustes são insuficientes.

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“As tarifas teriam que subir mais, porém não sabemos se isso será possível. Muitas variáveis podem influenciar o desenvolvimento do setor este ano, tanto no mercado interno quanto externo”, disse o dirigente em entrevista à Bloomberg Línea.

Miguel disse que o principal desafio das locadoras é justamente o preço do carro. Apesar da mudança no mix das frotas do setor, para modelos de entrada, as empresas têm enfrentado dificuldades para equilibrar os custos.

“O preço do carro continua elevado, mesmo com descontos concedidos pelas montadoras”, acrescentou.

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Ele lembrou que a locação de veículos não é algo essencial na cesta de compras do brasileiro, principalmente diante de um cenário econômico desafiador. “As pessoas vão priorizar o que é essencial e podem deixar a locação em segundo plano.”

Por outro lado, o dirigente relatou que o turismo só tem crescido no país. “Tudo indica que a locação continuará aquecida”, avaliou.

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Em 2024, as empresas de locação compraram 649 mil veículos, um aumento de 9,9% em relação a 2023.

Miguel afirmou que, nos últimos dois anos, as locadoras readequaram o mix das frotas, com a venda de carros mais caros adquiridos durante a pandemia, o que à época ocasionou problemas de depreciação - e impacto diretamente sobre o resultado das empresas.

“Hoje, a frota está mais equilibrada, adequada ao padrão de locação. Neste ano, não devemos ter problemas sérios de depreciação”, disse.

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De acordo com analistas do Itaú BBA, em relatório do último dia 10 de abril, as principais empresas do setor mantiveram no quarto trimestre a tendência de aumento das tarifas diárias em relação a 2020, auge da pandemia.

Segundo os analistas da área de equity research do banco de investimento, a demanda do setor “se mantém resiliente, com indicações de que essa tendência persiste no início de 2025, apesar da observada estabilização das diárias nos últimos trimestres”.

O relatório apontou ainda que o “ROIC” (indicador que mede o retorno sobre o capital investido) no “rent a car” (divisão conhecida como RAC, ou aluguel por diárias) do setor apresentou melhorias sequenciais no quarto trimestre, com o da Localiza (RENT3) praticamente estável em relação ao período imediatamente anterior, próximo da marca de dois dígitos.

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Já a Movida (MOVI3) registrou uma expansão de aproximadamente 3 pontos percentuais na mesma base de comparação, destacou o relatório, atingindo um ROIC de 11% no RAC. Na gestão de frotas (aluguel de longo prazo), a empresa reportou um avanço de 0,5 ponto em relação ao trimestre anterior, atingindo 7,6%.

Ainda de acordo com os analistas do Itaú BBA, no geral a dívida líquida das empresas diminuiu no período, acompanhando a sazonalidade favorável do quarto trimestre.

Descontos na compra de carros

Segundo um executivo do setor, que falou sob condição de anonimato porque as discussões são privadas, as negociações com as montadoras neste ano resultaram em níveis de descontos positivos, sendo, em algumas categorias, mais elevados do que os obtidos em 2024.

Essa fonte acrescentou que, ao longo do ano passado, os níveis de descontos se estabilizaram, em média, em 25%, após uma recuperação positiva das condições comerciais negociadas com as montadoras.

Outro fator que faz a diferença nesse contexto, relatou o executivo, são os prazos de pagamento negociados com a indústria automotiva, o que resultou em contratos semelhantes aos celebrados no pré-pandemia, em 2019.

Além disso, acrescentou, os prazos de entrega dos veículos estão normalizados, diferentemente do período posterior à pandemia. Isso confere mais previsibilidade às operações do setor e, consequentemente, rentabilidade mais elevada.

Miguel, da ABLA, confirmou que a oferta de carros pela indústria está normalizada, com prazos de 30 dias para faturamento, o que é considerado padrão no setor.

Ele disse que, embora algumas montadoras tenham limitação de determinados produtos, com tempo de espera um pouco mais longo, no geral as locadoras não têm registrado problemas com entrega de veículos.

Segundo ele, pelos volumes de vendas diretas da indústria (modalidade em que as montadoras vendem diretamente para empresas, principalmente locadoras) no mês de março, os níveis de compras das empresas de locação no período foram expressivos.

No entanto Miguel afirmou que este deve ser um ano mais de renovação do que de ampliação das frotas. “As empresas não devem conseguir alugar tanto quanto gostariam. Haveria espaço para mais compras de carros, mas talvez o mercado não responda tanto assim.”

Prova disso é a queda nos volumes de compras de veículos no primeiro trimestre deste ano, que somaram 93 mil unidades, ante 106 mil veículos adquiridos pelas locadoras no mesmo período do ano passado.

Perspectivas para o ano

A ABLA não definiu ainda uma projeção para o setor em 2025, mas, segundo Miguel, a expectativa é a de uma alta do faturamento devido ao reposicionamento de preços que as locadoras vêm fazendo e devem continuar a promover.

Adicionalmente, a mudança no mix das frotas, para modelos com valores mais baixos, deve contribuir para um resultado melhor, embora ele veja riscos para a rentabilidade das empresas.

“Estamos otimistas com o mercado neste ano, pois nos momentos difíceis da economia o setor de locação sempre cresceu. Apesar disso, mantemos certa preocupação com o cenário futuro”, disse Miguel.

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Juliana Estigarríbia

Jornalista brasileira, cobre negócios há mais de 12 anos, com experiência em tempo real, site, revista e jornal impresso. Tem passagens pelo Broadcast, da Agência Estado/Estadão, revista Exame e jornal DCI. Anteriormente, atuou em produção e reportagem de política por 7 anos para veículos de rádio e TV.