BRF investe de olho em gerações mais jovens em disputa de marcas

Em nova fase com Marcos Molina como controlador, empresa melhora resultados em alimentos processados e investe na revitalização de embalagens e da mascote da Sadia

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Bloomberg Línea — “A primeira coisa é consertar a empresa [...] Vejo muito mais oportunidades na BRF do que em qualquer outra empresa que compramos no passado.” Assim Marcos Molina, fundador e presidente do conselho da Marfrig (MFRG3) e principal acionista e também chairman da BRF (BRFS3), definiu os planos para a companhia, à Bloomberg News em abril, em uma rara entrevista.

É uma estratégia com foco operacional cujos resultados começam a aparecer, conforme apontado pelo analista Gustavo Troyano, do time de equity research do Itaú BBA, em relatório recente sobre o segundo trimestre.

“A BRF já demonstrou os benefícios de seu plano de eficiência, expandindo margens em condições de mercado desfavoráveis e sem grandes ventos favoráveis de deflação nos custos dos grãos”, escreveu o analista, que faz parte da cobertura de alimentos e bebidas com Bruno Tomazetto.

“Espera-se que o impulso da BRF acelere ainda mais no segundo semestre, e o fluxo de notícias sobre potenciais desinvestimentos e o ritmo das melhorias operacionais desempenharão um papel fundamental na determinação da alavancagem da empresa no futuro”, apontaram.

Um dos destaques, na visão dos analistas, foi o desempenho em produtos processados, que carrega marcas conhecidas como Sadia e Perdigão. “O Ebitda ajustado de R$ 627 milhões na divisão brasileira ficou 18% acima da nossa previsão devido a mais uma rodada de tendências de melhoria em alimentos processados e ganhos de eficiência.”

Essa evolução recebe agora atenção do ponto de vista de estratégia de marketing para ganhar mercado. A BRF decidiu revitalizar a marca Sadia, que completa 52 anos, com mudanças na sua tradicional mascote chamado Lek Trek, de olho em novas gerações de consumidores.

Em novas embalagens de produtos da Sadia, por exemplo, a mascote é posicionada em primeiro plano com roupas com estilos casuais que oscilam do country ao natalino, que remetem à Geração Z (nascidos a partir do fim dos anos 1990) e à Alfa (a partir de 2010), fãs de avatares e metaversos.

A mascote foi criado pelo publicitário Francesc Petit (1934-2013), catalão naturalizado brasileiro que veio a formar a célebre agência DPZ (atual DPZ&T).

Em entrevista à Bloomberg Linea, o vice-presidente de Marketing e Novos Negócios da BRF, Marcel Sacco, disse que a empresa entendeu que era momento de promover mudanças.

“Há seis anos, a Sadia não mudava o visual de suas embalagens. Isso corresponde a quase uma geração. O código visual dos consumidores mudou muito nesse período. Nossa motivação é se manter relevante para os consumidores, continuar conectados com eles. O QR Code, por exemplo, traz mais modernidade e conectividade, pois é um portal de informação”, disse o executivo.

Nos últimos anos, esse segmento de mercado contou com a ascensão da Seara, marca de alimentos processados da concorrente JBS (JBSS3), maior empresa do mundo de carnes.

Segundo o executivo, a Sadia tem a liderança no segmento in natura com frangos (14,7%) e suínos (17,9%), além de participações que descreveu como “relevantes” em presunto (22,6%), lasanha (33,3%), salsichas embaladas (24,6%), pratos prontos (42,3%) e lanches prontos (48,4%), entre outros.

Consumo em alta

A iniciativa da BRF de investir no rejuvenescimento da marca ocorre em um momento de aumento do consumo per capita de carne de aves no Brasil por ser uma proteína mais barata do que a carne bovina, preferida por famílias de diferentes estratos de renda com a inflação e os juros elevados.

Segundo estimativa da APBA (Associação Brasileira de Proteína Animal) divulgada em agosto, o consumo de carne de aves por pessoa pode chegar a até 46 kg em 2023, com aumento potencial de até 1,5%, enquanto a produção pode crescer até 3% neste ano, somando 14,950 milhões de toneladas.

O valor do investimento da BRF no posicionamento da Sadia não foi divulgado pela BRF. A nova campanha, assinada pela agência África e com jingles gravados pelo cantor Jairzinho, chega fisicamente às ruas em mídia externa (OOH), como pontos de ônibus e relógios de rua, e à TV aberta, com comerciais e ações de merchandising, além de veiculação de mídia digital nas redes sociais e streaming.

Plant-based sem mascote

O foco na marca Sadia acontece no momento em que a BRF também investe no segmento de plant-based, de alimentos processados à base de plantas. A Marfrig, controladora da BRF, faz parte da joint venture PlantPlus Foods, ao lado da norte-americana ADM.

Em maio, a Sadia readequou seu portfólio da linha Sadia Veg&Tal com uma parceria com a PlantPlus Foods, colocando foco agora em produtos que destacam o sabor de vegetais, enquanto a foodtech criada pela Marfrig e ADM reforça a cobertura de mercado com alimentos que remetem a carnes.

Nas embalagens dessa linha vegetal da Sadia, a mascote Lek Trek não aparece. O VP da Sadia disse que o flexitarianismo é uma tendência crescente, diante de consumidores que buscam uma alimentação flexível e reduzem, em vez de excluírem, o consumo de alimentos de origem animal.

Mercado Halal

Na operação internacional, em que a mascote também está presente, a BRF tem recuperado parcialmente as margens e manteve a liderança nas exportações de frango no chamado mercado Halal para os países do GCC (Conselho de Cooperação do Golfo: Arábia Saudita, Bahrein, Catar, Emirados Árabes Unidos, Kuwait e Omã), com 50% de market share, segundo o balanço do segundo trimestre.

Nessa região, a companhia registrou 26% de participação de produtos de valor agregado no volume de vendas. No período, a empresa conquistou 15 habilitações para exportações para Ásia (China, Japão e Singapura), África do Sul e Argentina.

No mês passado, a BRF concluiu uma oferta subsequente de ações, que injetou R$5,4 bilhões na empresa com o objetivo de fortalecer a estrutura de capital, com redução de dívidas e da alavancagem.

A operação contemplou um novo aporte da Marfrig e a entrada da Salic, The Saudi Agricultural and Livestock Investment Company, um investidor estratégico proveniente de uma região igualmente importante para a BRF, o Oriente Médio.

As ações da BRF acumulam alta de 13% neste ano até a sexta-feira (25). A valorização se aproxima dos 70% desde o ponto mais baixo do ano no fim de março, mas, em 12 meses, ainda há queda perto de 40%.

Ainda segundo o analista do Itaú BBA, Gustavo Troyano, o segmento in-natura continua a enfrentar um mercado com excesso de oferta.

JBS aposta em The Town

O investimento da BRF em marcas e na aproximação com o público de gerações mais jovens não é uma iniciativa isolada no segmento de alimentos processados. A JBS, por exemplo, decidiu levar a marca Seara Gourmet para o festival de música The Town, que traz atrações internacionais como Bruno Mars, Post Malone e Foo Fighters a partir do começo de setembro, em São Paulo.

A companhia desenvolveu um cardápio exclusivo para o festival. Diferentemente do foco da Sadia no frango, a Seara coloca suas fichas - no festival especificamente - no bacon e em pratos típicos da gastronomia paulista, como pastel de feira com caldo de cana e virado à paulista.

“Para o festival, a Seara Gourmet criou novos toppings para os sticks de Bacon Seara Gourmet, inspirados em receitas consagradas pelos paulistas. O objetivo é [...] destacar a versatilidade do Bacon Seara Gourmet, disse Tannia Fukuda Bruno, diretora de marketing da Seara.

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