Brasil desponta como uma das novas fronteiras de data center no mundo, diz CBRE

Novas regiões têm demanda crescente para abrigar os hyperscale data centers diante do boom de IA e o país tem oportunidade única, diz Alison Takano, head da área para LatAm, à Bloomberg Línea

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Bloomberg Línea — Restrições de energia em áreas desenvolvidas dos Estados Unidos e da Europa, principalmente de fontes renováveis, evidenciam oportunidades para que certas regiões do mundo, o que inclui o Brasil, recebam novos investimentos para se tornar relevantes no mercado global de data centers. É o que aponta um relatório recém-publicado da CBRE, gigante global em soluções para a comercialização de imóveis comerciais.

O relatório anual “Global Data Center Trend Report 2024″ da CBRE aponta que mercados regionais como o norte do estado americano de Indiana, a cidade de Boise, em Idaho (EUA), Mumbai (Índia), Oslo (Noruega) e Rio de Janeiro já experimentam uma demanda crescente por desenvolvimento dos chamados hyperscale data centers.

O mercado passa por um momento único de acelerado crescimento com a demanda alimentada pelo boom de Inteligência Artificial (IA), que exige data centers com capacidades de armazenamento de dados maiores.

“Nem nos melhores cenários o mercado global vai conseguir atender a demanda por energia limpa que o segmento de data center vai exigir”, disse Alison Takano, manager de Data Center Solutions da CBRE para América Latina, em entrevista à Bloomberg Línea. “E isso abre oportunidades para países como o Brasil, em que a matriz energética tem uma composição dominante de energia renovável.”

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“Na medida em que Estados Unidos e Europa enfrentam restrições para o fornecimento de energia limpa, os providers buscam países antes considerados secundários que tenham essa disponibilidade, além de terrenos e conectividade com as regiões em que está concentrada a demanda”, disse (no caso da conectividade, a referência ao Brasil se dá a cabos submarinos importantes que conectam o país a partir de cidades como Fortaleza e Praia Grande com o resto do mundo e os mercados americano e europeu).

Segundo ele, isso significa que é imperativo que o país continue a investir não só em aumento da capacidade de geração, principalmente renováveis como solar e eólica, como também em transmissão, caso seja objetivo explorar essas oportunidades. “Infraestrutura continua sendo um gargalo”, disse.

O crescimento do estoque de data center na América Latina foi da ordem de 15% no primeiro trimestre na base anual, para 650 MW, sendo que São Paulo responde por dois terços do total, segundo os dados da CBRE.

Ao mesmo tempo, segundo o relatório anual da CBRE, o mercado tem apresentado taxas de vacância - medida sobre a capacidade de energia - cada vez menores diante da demanda aquecida e de novos empreendimentos que não são suficientes para atendê-la (o estudo faz referência aos data centers comerciais, de modo que não leva em consideração aqueles que pertencem às grandes empresas de tecnologia, por exemplo).

Como reflexo, houve aumentos de até 50% do preço do aluguel para data centers no primeiro trimestre na base anual em regiões já desenvolvidas, em especial na América do Norte, onde o avanço foi de 20% em média.

No norte do estado da Virgínia - uma das principais áreas que abrigam, por exemplo, data centers da Amazon -, a taxa de vacância para esse mercado caiu de 1,8% para 0,1%, a menor dos EUA, nos três primeiros meses do ano, ainda que o estoque tenha avançado 21% em 12 meses.

Nos mercados em que o desequilíbrio entre demanda e oferta é maior, o aluguel chega a se aproximar do patamar de US$ 500/kW - caso de Santiago (Chile) e Singapura.

Avanço do pre-leasing

“O pre-leasing de espaço em data centers bem antes da conclusão tem sido uma prática comum em todo o mundo, o que ressalta a forte demanda no mercado e a necessidade de investimento contínuo em desenvolvimento [em novos projetos]”, disse Pat Lynch, managing director executivo de Data Center Solutions da CBRE, no relatório.

Nesse caso, sob a ótica da oferta, empresas de data center asseguram a demanda antes mesmo da construção e da entrega de novos projetos, o que reduz os riscos envolvidos do investimento.

Nesse mercado, os contratos em geral contam com duração entre cinco e quinze anos.

Segundo Takano, hoje o core business da área de data center na CBRE envolve a compra de ativos, sejam terrenos ou imóveis, para que companhias do setor executem seus planos de expansão.

O aumento expressivo da demanda por causa da IA se reflete em projetos cada vez maiores no mundo e no país. Nos Estados Unidos, novos projetos dos hyperscale data centers já preveem 500 MW em demanda de energia dada a maior capacidade de armazenamento de dados e há casos que chegam a 1,5 GW.

“Projetos considerados grandes para o Brasil envolviam data centers de 80 MW, até 100 MW. Hoje o mercado passou a falar em 200 MW com o aumento da demanda por causa de IA”, disse Takano.

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“Superadas algumas questões, como de tributação e de proteção de dados, o Brasil e outros países da América Latina têm potencial para crescer nesse mercado e disputar investimento com outras áreas e países como Índia e Sudeste Asiático”, disse o executivo da CBRE que lidera a área de data centers para LatAm.

Na América Latina, além do Brasil (em São Paulo), a CBRE tem escritórios dedicados ao segmento de data center no México (em Querétaro), no Chile (em Santiago) e na Colômbia (em Bogotá).

O executivo da CBRE esclareceu que atualmente os data centers dedicados à operação de IA estão quase que exclusivamente nos EUA e na Europa, dada a presença geográfica das empresas dominantes. E que o Brasil e outros países da região estão, segundo os players de data center, na fase de início de projetos de construção já com contratos assinados.

Entre as maiores do segmento com atuação no Brasil e atuação com hyperscale estão empresas globais como Equinix, a Ascenty, uma joint venture da Digital Realty com a Brookfield, e a Scala, além da Odata, que foi adquirida pela americana Aligned junto ao Pátria Investimentos no fim de 2022.

Evolução (acelerada) do mercado

O mercado de data center no mundo historicamente se divide em duas frentes: os providers que prestam serviços para empresas de diferentes setores, como bancos; e para a nuvem. E foi justamente esta segunda demanda crescente que deu escala para o negócio e permitiu o crescimento mais acelerado do negócio de data centers ao longo da última década.

“Há cinco ou seis anos, um data center considerado de grande porte tinha demanda de 2 MW, de 4 MW. Hoje esse é considerado um data center pequeno, urbano, que é chamado de edge, como um last mile”, disse Takano ao contextualizar a evolução do mercado.

Sem considerar o boom gerado pela IA, os hyperscale data center, que prestam serviço para nuvem, partem em geral de 20 MW e chegam a 60 MW e 80MW, o que deu uma nova dimensão aos equipamentos. “A demanda para nuvem é muito maior do que a de uma enterprise”, disse o executivo da CBRE.

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No Brasil, o mercado de data center inicialmente era concentrado no centro da cidade de São Paulo e, a partir dos anos 2000, passou a migrar para a região de Barueri, Santana do Parnaíba e Osasco, na grande São Paulo, em razão de disponibilidade de energia e de terreno e de ISS (Imposto sobre Serviços) mais baixo.

Com a necessidade posterior crescente por disponibilidade ainda maior de terreno e energia, o mercado se desenvolveu no interior paulista no eixo das rodovias Anhanguera e Bandeirantes, às margens de cidades como Jundiaí, Vinhedo, Campinas e Sumaré, entre outras.

No mundo, o mercado de data centers surgiu com mais força a partir do começo dos anos 2000, depois do estouro da bolha das “pontocom”, com a consolidação das empresas de terceirização dessa categoria de serviço, de servidores para o processamento e o armazenamento de dados.

O mercado de nuvem, por sua vez, para o qual as empresas prestam serviço, é dominado pela AWS, da Amazon, o Azure, da Microsoft, e o Google Cloud, que possuem cerca de 75% de participação global.

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