BMW, Renault e Volks agora competem com bancos de varejo por depósitos

Empresas financeiras de montadoras na Europa utilizam cada vez mais depósitos de clientes como funding para operações de financiamento de seus modelos

Renault é uma das montadoras na Europa que ampliam seus negócios de captação de depósitos (Foto: Benjamin Girette/Bloomberg)
Por Monica Raymunt, Abhinav Ramnarayan e Albertina Torsoli
03 de Julho, 2023 | 05:25 PM

Bloomberg — Algumas das maiores montadoras da Europa estão cada vez mais parecidas com bancos comerciais. Renault, Volkswagen e BMW estão entre as empresas que entram no negócio de captação de depósitos de clientes. As empresas afirmam que é uma maneira mais barata de financiar o empréstimo de veículos após um aumento sem precedentes nas taxas de juros, que tornou a emissão de títulos corporativos — o principal meio de financiamento nos últimos anos — menos atrativa.

As empresas financeiras das montadoras podem utilizar os depósitos que captam como garantia para empréstimos de veículos a outros clientes, o que ajuda a manter as vendas em andamento. Isso representa uma mudança em relação à era de taxas extremamente baixas, quando conseguiam vender títulos a baixo custo para obter recursos e utilizavam esse dinheiro para empréstimos a clientes.

PUBLICIDADE

No mercado brasileiro, montadoras possuem bancos há muitos anos, dado exatamente o ambiente de juros mais altos e necessidade de oferta de financiamento para viabilizar as vendas.

Algumas contas das montadoras na Europa exigem que os depósitos sejam mantidos por um determinado período, enquanto outras não têm prazo definido e são semelhantes a uma conta de poupança em um banco tradicional.

“No atual ambiente de taxas positivas, os depósitos se tornaram significativamente mais baratos [como fonte de funding] do que o financiamento de mercado”, afirmou Jean-Marc Saugier, vice-presidente de finanças e tesouraria da Mobilize Financial Services, da Renault.

PUBLICIDADE

A montadora francesa começou seu negócio de captação de depósitos em 2012 para diversificar sua fonte de financiamento, mas tem se concentrado cada vez mais no setor bancário desde o ano passado.

Em 2022, quase metade de seu programa de empréstimos de veículos foi financiado por meio de depósitos, em comparação com 35% em 2018.

A Volkswagen também tem um negócio bancário há muito tempo, mais de três décadas. No entanto, o aumento acentuado nos custos de outras formas de financiamento, incluindo emissão de títulos corporativos e papéis lastreados em ativos, tornou-o mais importante do que nunca.

PUBLICIDADE

A gigante automotiva, que recentemente anunciou planos de unir suas unidades Volkswagen Financial Services e Volkswagen Bank, aumentou as taxas de juros sobre depósitos de clientes duas vezes neste ano, para a taxa atual de 3,1%, na tentativa de atrair mais poupadores com a remuneração.

De acordo com um porta-voz, cerca de 160 mil novas contas foram abertas desde o início do ano, com cerca de 8 bilhões de euros em novos depósitos.

A montadora alemã BMW também oferece contas de depósito por meio de sua unidade de serviços financeiros, com taxas de juros de até 3,2%, de acordo com seu site. Assim como a Volkswagen, a BMW recentemente aumentou as taxas para depósitos a prazo fixo e contas de dinheiro disponível, segundo a empresa.

PUBLICIDADE

Um porta-voz da BMW afirmou que a montadora conseguiu aumentar significativamente seu volume total de depósitos, e eles desempenham um papel estratégico importante no mix de funding para o refinanciamento da unidade bancária da montadora.

Custo de emissão dispara

Os esforços para atrair depósitos ocorrem em um momento em que elas enfrentam maiores custos de empréstimos. O rendimento de títulos emitidos por empresas europeias do setor automotivo, segundo um índice da Bloomberg, subiu para 4,23% em comparação com 0,29% nos últimos dois anos.

A RCI Banque, a entidade emissora por trás da unidade bancária da Renault, vendeu 750 milhões de euros em títulos de cinco anos no mês passado, com um rendimento de 4,95% - um grande salto em relação aos 0,62% dos títulos emitidos em janeiro de 2022.

“As montadoras estão ansiosas para obter o maior número possível de depósitos. Elas possuem um reconhecimento excepcional entre os depositantes em países como Alemanha e França”, disse Nesche Yazgan, analista de crédito sênior da RBC BlueBay Asset Management.

Ao mesmo tempo, os clientes na Europa não têm tantas opções quanto os dos Estados Unidos, onde fundos do mercado oferecem uma alternativa fácil aos bancos tradicionais, acrescentou.

É importante ressaltar que as montadoras ainda precisarão emitir títulos, apesar da crescente contribuição dos depósitos.

Empresas do setor automotivo na Europa venderam 8,45 bilhões de euros em títulos na região em maio, o maior volume de emissão em seis anos, de acordo com dados compilados pela Bloomberg, aproveitando o sentimento do mercado para antecipar vencimentos de dívidas futuras.

O aumento do custo dessa dívida pode resultar em taxas de juros mais altas para empréstimos de veículos aos clientes, com implicações para a demanda por carros novos, segundo alguns analistas.

Ainda assim, poupadores como Pere Domec, um professor de Lerida, na Espanha, continuam a ser atraídos pelas taxas mais altas oferecidas por algumas montadoras.

Ele começou a investir no banco da Renault há cerca de um ano e meio, quando a taxa oferecida em uma conta espanhola de acesso imediato era de cerca de 1,2%. Desde então, essa taxa subiu para mais de 2,6%, disse ele. O holandês ING Groep, que atua na Espanha com seu banco digital, oferece uma taxa de 1,25% em sua conta de poupança.

“Depois de pesquisar, decidimos investir”, disse Domec. “Não há motivo para permanecer com um dos grandes bancos na Espanha que oferecem tão pouco pelo seu dinheiro.”

- Com a ajuda de Charles Penty e Wilfried Eckl-Dorna.

Veja mais em Bloomberg.com

Leia também

Por que a Fiat decidiu não vender mais carros com a cor cinza (e prata)

Por que o aspartame entrou na mira da OMS e como isso afeta a Coca-Cola

Volks troca comando da Audi para recuperar terreno de BMW e Mercedes