Bemobi retoma crescimento após ‘tempestade perfeita’. O CEO diz que é só o começo

À Bloomberg Línea, Pedro Ripper fala sobre os planos de expansão e diz que dividendo recorde previsto de R$ 200 milhões em 2025 reforça a confiança na estratégia de negócios

Pedro Ripper, CEO da Bemobi
27 de Março, 2025 | 05:45 AM

Bloomberg Línea — Não é exagero dizer que a Bemobi enfrentou uma espécie de “tempestade perfeita” nos últimos anos, depois que a empresa de tecnologia especializada em pagamentos e serviços digitais concluiu seu IPO (oferta pública inicial de ações) em 2021.

O primeiro obstáculo se deu quando a Oi, então sua maior cliente, se desfez da operação móvel no processo de recuperação judicial.

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Depois, a Ucrânia e a Rússia, que representavam o terceiro e o quarto maiores mercados da Bemobi, entraram em guerra por iniciativa de Vladimir Putin. Em seguida, a forte desvalorização cambial em países emergentes onde a empresa opera prejudicou os resultados.

Para o CEO, Pedro Ripper, a fase mais desafiadora ficou para trás. E o reflexo disso é a volta do crescimento de dois dígitos da receita líquida e do Ebitda no quarto trimestre de 2024, segundo os resultados divulgados no último dia 20.

A Bemobi também aprovou uma nova política de dividendos que prevê a distribuição de R$ 200 milhões em proventos sobre o ano de 2025, o que equivale a um dividend yield de 16%. É um nível de retorno comparável ao de empresas que são reconhecidas como grandes pagadoras de dividendos, como a Petrobras (19% em 2024).

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“Tivemos o melhor resultado de 2024 e o melhor dos últimos nove trimestres”, disse Ripper em entrevista à Bloomberg Línea.

“Toda empresa que cresce sempre tem um trimestre melhor que o outro. Mas nesse caso de fato tem um gostinho de recorde. É o maior crescimento que tivemos em um bom período sem ter nenhuma aquisição para puxar para cima.”

O pagamento de proventos em 2025, se confirmado, será o maior já realizado pela companhia e quase quatro vezes maior do que a distribuição de R$ 55 milhões referentes ao resultado de 2024, considerando dividendos e juros sobre capital próprio.

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A Bemobi registrou receita líquida de R$ 165,3 milhões no quarto trimestre, um aumento de 19,8% na comparação com o mesmo período do ano anterior. O Ebitda ajustado (uma medida de geração de caixa operacional) subiu 19,1% para R$ 55 milhões.

Já o lucro líquido caiu 4,1% na comparação anual, para R$ 45,3 milhões, mas somou R$ 129,3 milhões no resultado consolidado do ano, com uma expansão de 26,9%.

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Os resultados positivos impulsionaram as ações. O papel da Bemobi (BMOB3) subiu 9,40% na sexta-feira (21), após a divulgação do balanço, alcançando o maior valor desde março de 2022.

Na quarta-feira (26), o papel fechou em alta de 2,58%, a R$ 16,71, acumulando uma alta de 23% neste ano até agora, ante um ganho de 10,2% do Ibovespa.

Analistas do Itaú BBA liderados por Thiago Kapulskis elevaram a ação da Bemobi para “co-top pick” entre os ativos de tecnologia do Brasil, citando o momento positivo da empresa e a tendência sólida de crescimento e de geração de caixa saudável.

O CEO Pedro Ripper diz que a decisão de ampliar a distribuição de dividendos reflete um maior nível de confiança e de previsibilidade dos resultados da empresa para os próximos meses.

“Passados 12 meses, a névoa se dissipou. Os resultados foram bons, e a gente está com uma posição de caixa maior do que a gente tinha antes”, afirma.

Diversificação e estratégia de M&A

A Bemobi nasceu em 2009 a partir do spin-off da empresa de tecnologia M4U comprada pela Cielo. A empresa se especializou em uma solução de assinatura para games e aplicativos de celular e cresceu ao longo dos anos servindo operadoras em diversas regiões.

Desde o IPO, a empresa vem buscando diversificar as receitas, atuando também com recargas de créditos de celular, um serviço de microfinanciamento para clientes pré-pago de operadoras e um negócio de score de crédito, baseado no consumo de celular, usado por bancos.

Mais recentemente a empresa passou a oferecer também um serviço de meio de pagamento para empresas de cobranças recorrentes, como distribuidoras de energia e escolas particulares.

Ao todo a Bemobi diz ter mais de cem companhias de telecomunicações, distribuição de energia, educação e finanças entre seus clientes, que atuam em mais de 50 países, servindo cerca de 80 milhões de clientes.

Hoje o negócio original de assinaturas digitais representa 32,7% das receitas, enquanto as novas soluções de pagamento são 34,8%. As demais áreas de negócio são Software as a Service (SaaS), com 21% das receitas, e Microfinanças, com 11,5%.

A estratégia de diversificação foi construída a partir de fusões e aquisições feitas pela Bemobi. Ao todo, a empresa adquiriu sete empresas, de olho nessa expansão.

Segundo Pedro Ripper, a empresa “continua com a mesma fome de fazer bons M&As”, e segue estudando a aquisição de empresas que possam ajudar a empresa a expandir a atuação em meios de pagamento.

Ele afirma que a estratégia de M&A está voltada a verticais e segmentos com pagamentos recorrentes que ainda são sub-atendidos por soluções de meios de pagamentos digitais.

“Eventualmente, a maneira de entrar em um segmento pode ser comprando uma empresa que entenda desse setor ou que complemente o negócio com uma solução que a gente não tem”, diz Ripper.

Ele cita como exemplo a empresa software Agenda Edu, comprada pela Bemobi, que tinha solução para escolas particulares. A aquisição em dezembro de 2023 ajudou a companhia a entrar no segmento de educação.

A Bemobi também aguarda a conclusão da compra de uma empresa que tem uma licença de instituição de pagamento. O processo está em análise e depende de aprovação do Banco Central, segundo Ripper.

Segundo o CEO, a licença pode ajudar a empresa a se adaptar mais rapidamente a evolução dos meios de pagamento digitais, como novas soluções previstas para o Pix, o sistema de pagamento instantâneo do Banco Central.

“Quando você olha a janela dos próximos 18 meses e a quantidade de inovação que está havendo no Pix, a gente achou que era desejável ter um pouco mais de controle da cadeia inteira”, diz Ripper.

Um exemplo é a modalidade do Pix automático, que está em desenvolvimento e pode ser capaz de substituir o débito automático em conta corrente. Ripper avalia que essa é uma solução que está no “core” do negócio da Bemobi.

“Vamos supor que meus parceiros de solução do Pix não priorizam isso e preveem lançar a solução três meses depois de ela entrar em vigor. Para mim, é essencial. Não posso me dar o luxo de entrar três meses depois”, disse.

Expansão em utilities

No setor de utilities, Ripper diz que ainda vê muito espaço para crescimento e que a Bemobi ainda “está engatinhando” no segmento, com potencial de atrair mais clientes.

Segundo ele, as empresas do Brasil representam quase 100% do negócio, mas existem oportunidades de crescimento em utilities também em outros mercados onde a Bemobi atua.

A empresa já trabalha em um projeto com uma companhia de telecomunicações na Colômbia e tem a expectativa de avançar também em negócios no Chile e no México, segundo ele.

“Não acho que é provável que a gente chegue a 60 países, como fazemos em assinaturas digitais. Mas, dito isso, tem outros países que a gente vê oportunidades”, diz.

“O business de pagamento, mesclado com o software as a service, era 10%, 15% do nosso faturamento. Agora é quase 60%. A gente virou uma empresa de soluções de pagamento especializadas.”

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Filipe Serrano

É editor sênior da Bloomberg Línea Brasil e jornalista especializado na cobertura de macroeconomia, negócios, internacional e tecnologia. Foi editor de economia no jornal O Estado de S. Paulo, e editor na Exame e na revista INFO, da Editora Abril. Tem pós-graduação em Relações Internacionais pela FGV-SP, e graduação em Jornalismo pela PUC-SP.