Após ganhar mercado no país, Vulcabras avança com Olympikus na Europa, diz CEO

Em entrevista à Bloomberg Línea, Pedro Bartelle fala da entrada da marca de tênis de corrida na Espanha e das expectativas de retomada das vendas em geral da empresa na Argentina

Por

Bloomberg Línea — A cena se tornou recorrente em diferentes provas de rua no Brasil: basta olhar para o chão para perceber modelos de tênis da Olympikus entre os mais utilizados pelos corredores, rivalizando com marcas globais como Adidas, Asics e Nike, para citar três gigantes do mercado esportivo.

Na pesquisa anual realizada pela Strava, um dos aplicativos de mensuração de tempos e de comunidade de corredores e ciclistas mais utilizados dos mercados nacional e global, a linha Olympikus Corre foi apontada como a mais utilizada no país pela primeira vez no ano passado.

Se depender de Pedro Bartelle, CEO da Vulcabras, que é a dona da Olympikus - além de licenciadora da japonesa Mizuno e da americana Under Armour no Brasil -, essa cena e essa preferência poderão ser aos poucos testemunhados também em outros mercados, como o europeu.

“Já estamos vendendo a Olympikus na Espanha. Começamos a atuar no mercado europeu e provamos que temos uma coleção capaz de sair da América do Sul. Temos feito investimentos em modernização, aumento de produção e lançamentos nos últimos anos”, disse Bartelle em entrevista à Bloomberg Línea.

Leia mais: Novo CEO da Nike precisa reconquistar varejistas e clientes para recuperar o brilho

O mercado europeu entrou no radar da companhia após o lançamento de uma linha de tênis de alta perfomance, conhecida como “Corre”, que no seu modelo mais avançado, o Corre Grafeno, lançado em 2022, utiliza na entressola justamente uma placa com finalidade de propulsão à base desse material. O grande atrativo é o preço, em geral menos da metade de modelos equivalentes de Nike, Adidas e Asics.

A placa de grafeno foi desenvolvida após mais de três anos de pesquisa em parceria com a UCS (Universidade de Caxias do Sul) e tem semelhanças às propriedades do carbono, que revolucionou a indústria dos modelos para corredores a partir de 2017. A tecnologia consagrou inicialmente a Nike como a preferida dos atletas de elite e dos amadores de elite, depois alcançada pela Adidas.

A contribuição ainda tímida e que será gradual, ressaltou Bartelle, das vendas em países europeus vem acompanhada da expectativa de recuperação de mercados há mais tempo relevantes para a companhia mas que, em anos recentes, não cumpriram esse papel. O principal deles é a Argentina.

O CEO da Vulcabras disse esperar para 2025 uma recuperação das vendas para o país vizinho após as sucessivas quedas nos embarques para o principal destino de suas exportações. A Argentina ensaia uma retomada sob a política econômica liberal do presidente Javier Milei.

Bartelle avalia que as dificuldades enfrentadas pela economia do país vizinho atingiram o ápice e que a tendência para o ano que vem deve refletir justamente um movimento de inflexão.

“Morei na Argentina, estudei no país e abri uma filial lá em 2013. Sou otimista. Estou vendo uma luz no fim do túnel. Tenho falado com distribuidores. Eles acham que a tendência é a situação começar a melhorar no ano que vem”, disse o executivo.

Leia mais: Casa de Negócios - Mercado do esporte está em novo patamar no pós-pandemia, diz CEO da Asics

Enquanto essa retomada não se concretiza, bem como os resultados do investimento de médio e longo prazo no mercado europeu, a Vulcabras (VULC3) sustenta o crescimento com as vendas domésticas.

No primeiro semestre, a receita líquida proveniente do mercado externo caiu 30,8%.

No Peru, também houve uma redução na receita no segundo trimestre, como reflexo da persistência das dificuldades econômicas que impactam a demanda no país andino.

No fim do dia, o mercado externo respondeu por 4,9% da receita líquida da Vulcabras no segundo trimestre, o que representou R$ 57,7 milhões. Há um ano, essa fatia era de 8%. E já chegou a 15% no passado.

“Apesar da redução das exportações, estamos avançando no mercado interno e reportando os melhores resultados do setor em faturamento e margem. Crescemos há 16 trimestres consecutivos”, disse o CEO.

Além da linha de alta perfomance da Olympikus, que já representa 15% do faturamento da marca, ele citou que a companhia atua em novos mercados como o de chuteiras com a marca Mizuno.

“Hoje somos uma especialista em calçados esportivos, como previsto em um plano estratégico efetivado há três anos. Antes, tínhamos marcas femininas, como Azaleia. Licenciamos e nos concentramos nas três marcas de esporte, Olympikus, Mizuno e Under Armour”, disse o CEO sobre a estratégia da companhia, que tem 72 anos.

Bartelle afirmou que, ao elaborar o orçamento da Vulcabras, não trabalha considerando o cenário de uma recuperação das exportações no curto prazo. Uma surpresa nesse sentido, como uma retomada das vendas para o mercado argentino, portanto, seria um ganho inesperado ao resultado.

Aposta no e-commerce

A companhia tem registrado crescimento de dois dígitos no faturamento do e-commerce, que representam 13% de sua receita. A estratégia para o canal é evitar liquidações agressivas ou canibalização com parceiros do comércio de multimarcas, segundo o CFO da companhia, Wagner Dantas, na mesma entrevista.

“Temos no canal online uma estratégia de complementariedade, que ainda está longe de ter atingido seu potencial. A categoria de vestuário e acessórios começa a ter seu potencial destravado quando a empresa vai direto ao consumidor. O e-commerce cresceu quase 73% no segundo trimestre”, disse Dantas.

O CEO disse que o e-commerce da Vulcabras é lucrativo e busca apresentar a coleção completa das marcas esportivas, incluindo modelos que o consumidor não encontra em redes multimarcas.

“A Centauro [do Grupo SBF] vende um pouco de tudo, mas é uma loja que não tem corner das marcas que consiga representar bem toda a coleção. A World Tennis, que é uma operação grande com mais de 300 lojas no Brasil, não vende vestuário nem acessórios. Nem as tradicionais sapatarias”, analisou.

Ele disse considerar ser possível uma operação de comércio eletrônico com preços saudáveis durante a vigência das coleções, com disciplina de preços e sem ter que realizar grandes liquidações.

“Não vamos crescer nosso e-commerce a qualquer custo. Ele tem se tornado um meio importante para que a empresa possa vender mais roupas e acessórios. Tivemos que aprender a lidar com liquidações”, disse.

Concorrência com Ásia

Bartelle disse que hoje o seu principal concorrente é o produto asiático e que a Abicalçados (Associação Brasileira das Indústrias de Calçados), em que é conselheiro, está atenta a eventuais práticas de dumping.

“Nossa mão-de-obra é mais cara que a asiática, mas nossa eficiência, produtividade, maquinário e sistema são os mesmos. Não perdemos nada para a Ásia. Se o Brasil tivesse condições igualitárias e os custos dos asiáticos, seríamos mais fortes internamente e um grande exportador como no passado”, afirmou.

O Brasil possui atualmente a quinta maior indústria de calçados do mundo, em um ranking liderado pela China, seguida por Índia, Vietnã e Indonésia, segundo a Abicalçados. “Já fomos a terceira maior indústria do mundo no setor. Acabamos de perder o quarto lugar para a Indonésia”, disse Bartelle.

Leia mais: Asics prevê lucro recorde com crescente demanda por tênis de corrida retrô

O dólar mais caro em relação ao real em 2024 tem impacto nos custos do setor, pois cerca de 10% das matérias-primas são importadas.

“Temos matérias-primas dolarizadas, como as que recebemos da Braskem, nosso maior fornecedor de EVA, que é a espuma branca que vai na sola dos calçados”, exemplificou o CEO da Vulcabras.

O CFO, por outro lado, disse que a margem Ebitda de 23% é a melhor entre os seus pares na B3 e que a companhia não deseja seguir uma rota de crescimento que comprometa sua margem.

“O grande deflator da margem Ebitda é a tributação sobre subvenções, a Lei n⁰ 14.789. É um componente estrutural que ‘rouba’ desse resultado um fator bem importante”,disse Dantas.

A companha tem conseguido repassar uma parte do aumento dos custos. “Todo ano tem um reajuste. Não vivemos na Suíça, portanto, não são grandes reajustes, apenas de um dígito. Já pegamos pedidos da coleção de 2025 com novos preços″, disse o CEO.

No mercado acionário, a política de distribuição mensal de dividendos é apontado pelo executivo como atraente para os investidores. “Somos a maior pagadora de dividendos do setor na B3. Não vamos ‘empoçar’ caixa. Temos planos de crescer, de criar uma empresa forte, com grandes resultados”, disse Bartelle.

A ação da Vulcabras acumula uma desvalorização perto de 10% em 12 meses, mas, em uma janela mais extensa que inclui justamente o período do lançamento da linha Corre, há cerca de três anos, praticamente dobrou de valor na bolsa brasileira.

Leia também

No Walmart, tênis colecionáveis são nova aposta para expandir a oferta online

Na disputa de super-tênis para corredores, Adidas aposta em novo modelo de US$ 500

Na Espaçolaser, os planos de expansão passam pela América Latina, diz CEO