Americanas dimensiona queda da operação física e quer divulgar balanço no fim do mês

Varejista já fechou 97 lojas de janeiro ao último dia 17 de setembro e cortou mais de 20% da força de trabalho; ação disparou mais de 20% na última sexta com trégua com Bradesco e fim de CPI

O cronograma aponta o próximo dia 30 de outubro como a data para divulgação do resultado financeiro de 2022
01 de Outubro, 2023 | 04:45 PM

Bloomberg Línea — Protagonista da principal crise corporativa do varejo brasileiro em 2023, a Americanas (AMER3) dimensionou, neste domingo (1º), o revés de sua operação física desde a recuperação judicial, em 19 de janeiro, após revelar uma fraude da ordem de R$ 20 bilhões em sua contabilidade.

A varejista informou ter fechado 88 lojas entre janeiro e agosto, encerrando esse período com 1.794 unidades. O movimento continuou em setembro, com a descontinuidade de mais nove pontos de venda, até o último dia 17. No total foram 97 unidades fechadas desde o começo do ano.

PUBLICIDADE

O encolhimento de sua operação física consta do relatório mensal sobre a recuperação judicial, enviado neste domingo à CVM (Comissão de Valores Mobiliários), que apontou uma redução de 6,3 milhões de clientes ativos nos oito primeiros meses do ano.

Em agosto, quando encerrou 25 pontos de venda, o número de clientes totalizava 42,8 milhões, abaixo dos 49,1 milhões no final de dezembro. Em janeiro, a Americanas tinha 48,2 milhões de clientes e 1.880 lojas.

A companhia não revela as marcas das unidades que foram fechadas nem o total de cada um. No dia 23 de agosto, Bloomberg Línea pediu comentário sobre o fim das operações da Imaginarium, loja de itens de decoração geek e retrô que pertence ao grupo, em três shoppings centers da cidade de São Paulo (Jardim Pamplona, SP Market e Morumbi Town). A reportagem constatou o encerramento das operações das lojas nos locais.

PUBLICIDADE

Um mês depois, na última sexta-feira (29), a companhia ainda não confirmava oficialmente a informação. O relatório semanal apontava que, entre os dias 21 e 27 de agosto, o grupo descontinuou cinco pontos de venda, sem informar os nomes das marcas.

No térreo do Jardim Pamplona Shopping, por exemplo, a loja da Imaginarium baixou as portas na noite do dia 22. A unidade ficava ao lado da Puket, loja de pijamas para crianças, outra marca que a Americanas colocou à venda após a recuperação judicial junto com a Imaginarium para levantar recursos e ajudar a pagar os credores.

Ativos à venda

Criada em 1991, a Imaginarium chegou a contar com 220 lojas exclusivas, mais de 600 pontos de lojas licenciadas, e-commerce, marketplace, além de um escritório internacional.

PUBLICIDADE

Em 2021, a marca chegou a fazer uma parceira com a Warner Bros. Consumer Products, que se transformou em uma colaboração para comercializar produtos exclusivos para os fãs de Harry Potter.

Loja da Imaginarium foi fechada no Jardim Pamplona, no Jardim Paulista, na capital paulista

A Imaginarium faz parte do Grupo Uni.co, plataforma de franquias de varejo especializado, que inclui ainda a Puket, Casa MinD e a Love Brands e passou a integrar a Americanas em 2021.

Em março, quando divulgou o primeiro plano de reestruturação, a Americanas informou que poderia vender ativos para levantar dinheiro e pagar parte da dívida com credores. Em maio, detalhou ter contratado o Citibank para buscar potenciais interessados por ativos como o Grupo Uni.co e a Natural da Terra, rede de hortifruti.

PUBLICIDADE

Uma fonte que acompanha o processo disse à Bloomberg Línea que o momento desafiador do varejo brasileiro, com margens comprimidas pelo consumo inibido pela inflação e juros elevados, desencoraja outros players de fazer ofertas atraentes pelos ativos, que não apresentam diferencial não replicável que justifique a apresentação de propostas competitivas.

Em outras palavras, ninguém estaria disposto a pagar caro por marcas como a Imaginarium e Puket que atuam em segmentos já saturados por pequenos lojistas.

Desligamentos de funcionários

A redução de estrutura física resultou em cortes da folha de pagamento. Até o dia 17 de setembro, a Americanas registrava 34.369 funcionários em regime CLT (carteira de trabalho assinada). Isso representa um corte de 20,3% na força de trabalho desde janeiro, quando afirmava ter 43.123 empregados.

O relatório divulgado neste domingo mostra que muitos funcionários pediram para sair da empresa, que ainda busca fechar um acordo com seus credores. Na semana entre 11 e 17 de setembro, 169 colaboradores pediram demissão, uma média acima da semana anterior (140).

Divulgação do balanço da Americanas

A varejista tem adiado a divulgação dos balanços trimestrais, enquanto não chega a um entendimento com os principais bancos do país. Só após esse passo, a companhia poderá convocar uma assembleia de credores para votar seu plano de recuperação e começar a virar página da crise.

Como houve fraude na contabilidade e o reconhecimento de dívida não paga aos fornecedores e instituições financeiras, as linhas dos balanços anteriores têm de ser corrigidas.

O cronograma informado no novo relatório aponta o próximo dia 30 de outubro como a data para divulgação do resultado financeiro de 2022. Já os balanços de três trimestres deste ano (primeiro, segundo e terceiro) estão marcados para serem divulgados no próximo dia 29 de dezembro.

Na última sexta-feira (29), as ações da companhia fecharam em forte alta de 21,79% na B3, com investidores animados com a trégua jurídica temporária entre o grupo e o Bradesco (BBDC4) sobre discussão de cobrança de fianças no processo de recuperação judicial, além do fim dos trabalhos da CPI (comissão parlamentar de inquérito) criada no Congresso para investigar o caso, mas que terminaram sem apontar possíveis culpados.

No início do ano, os principais CEOs do mercado bancário esperavam o fechamento de um acordo sobre os créditos a receber para o final do primeiro semestre, mas outros credores não financeiros e debenturistas mantiveram seus questionamentos, e os executivos dos bancos evitaram fornecer novas previsões de data para o fim da novela.

A valorização de dois dígitos no preço do papel representou um movimento de recuperação parcial, após uma sequência de expressivas quedas devido à maior aversão ao risco dos investidores ao setor de varejo e ao impasse jurídico entre a varejista e seus credores. No ano, AMER3 acumula baixa de 90%.

-Matéria corrigida às 10h08, de 2 de outubro, com o ano correto (2023, e não 2022) dos balanços do primeiro, segundo e terceiro trimestre com divulgação prevista para o próximo dia 29 de dezembro

Leia também

Greve de montadoras entra na 3ª semana nos EUA e Ford critica pauta de sindicato

Sérgio Ripardo

Jornalista brasileiro com mais de 29 anos de experiência, com passagem por sites de alcance nacional como Folha e R7, cobrindo indicadores econômicos, mercado financeiro e companhias abertas.