Bloomberg Línea — A definição de “operadora de shopping center” tem sido cada vez mais modificada no Brasil diante do movimento de diversificação de fontes de receitas das líderes do setor.
Tais grupos se apresentam cada vez mais como plataformas de experiências, entretenimento, serviços e lifestyle, além de compras, o core business desse segmento do mercado imobiliário.
É o caso da Allos (ALOS3), única empresa do segmento de shoppings listada na B3 a possuir sua própria empresa de mídia, a Helloo, fundada em 2016. Para 2025, a companhia comandada pelo CEO Rafael Sales planeja reforçar seu braço de mídia, com avanço para além das fronteiras dos shoppings e expansão de seu programa de fidelidade para um número maior de unidades no país.
Vender anúncios em telas espalhadas pelos espaços dos 57 shoppings que administra (47 são próprios) se tornou uma alavanca relevante na expansão do grupo, resultado da fusão da Aliansce Sonae e brMalls em 2023. A Helloo cresceu 23% no ano passado e já representa 6% das receitas totais da Allos.
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“Temos que entender quais são outras oportunidades para a Helloo, que é uma empresa de Out of Home [OOH]. Não dá para limitar o horizonte do nosso braço de mídia somente a áreas do shopping. Temos que avaliar todas as oportunidades, pois seu crescimento é expressivo”, disse a CFO da Allos, Daniella Guanabara, em entrevista à Bloomberg Línea.
No Brasil, a mídia OOH, liderada por players como Eletromídia, JCDecaux e Neooh, explora principalmente o mobiliário urbano, como abrigos de parada de ônibus, estações de metrô, terminais de aeroportos e painéis de outdoor, além de espaço publicitário em calçadas, ciclovias e totens.
Fora do espaço dos centros comerciais, a Helloo já atua com telas instaladas em elevadores de edifícios residenciais no entorno dos seus shoppings, o que lhe permite acompanhar a jornada dos consumidores e avaliar seus projetos de multiuso. A Allos tem 59 torres em construção nos arredores de seus centros comerciais.
“O projeto multiuso ajuda a aumentar a densidade demográfica ao redor dos shopping. Se o consumidor frequentava o shopping duas vezes por mês, ele passa a ir duas vezes por semana, dado que mora a 200 metros do shopping”, disse Guanabara.
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Esse movimento leva a outro ponto da estratégia da Allos de aproveitar sua abrangência nacional para diversificar as fontes de faturamento, além de outros serviços como a receita com estacionamento e com o aluguel de lojas e outras áreas (quiosques) em seus centros comerciais.
“Contar com uma empresa de mídia com presença nacional é um diferencial da Allos em relação a outras empresas de shopping listadas. Conseguimos por meio do nosso programa de fidelidade entender o comportamento do consumidor em diferentes regiões”, disse a CFO.

Até o fim do primeiro semestre, a Allos pretende mais do que triplicar o número de shoppings que contam com programa de fidelidade, totalizando 38 unidades. A executiva considera o roll out (implantação em escala mais ampla) do programa como a grande novidade da companhia em 2025.
“Quando a Helloo vai negociar mídia, ela pode vender ao cliente uma audiência mais segmentada, pois tem dados sobre o tipo de público a atingir, qual o perfil de renda, onde mora o consumidor, qual seu gênero, em dados agregados. Isso nos ajuda muito a vender nosso business de mídia”, afirmou Guanabara.
A lista de clientes do braço de mídia da Allos inclui empresas como Netflix, Disney, Itaú, Ambev, Heineken, McDonald’s, TIM, Natura, Cacau Show, Fleury e GPA (Grupo Pão de Açúcar), segundo o site da Helloo.
Outra aposta da companhia, segundo a CFO, é a criação da KARG, sua empresa de eletropostos para carregamento de veículos elétricos, que serão instalados em shoppings do grupo em todo o Brasil.
A KARG terá 600 vagas em dois anos – 200 delas já em funcionamento até o fim deste mês, em 13 shoppings, o que representa um terço do potencial total da operação. O projeto está sendo viabilizado em parceria com a WEG, fabricante de carregadores para veículos elétricos no Brasil.

Avaliada em cerca de R$ 10,6 bilhões, a Allos acumula uma alta da ordem de 8,00% em suas ações na B3 neste ano.
De 13 analistas que cobrem a companhia, nove recomendam a compra do papel: isso inclui de outperform (acima da média do mercado) por parte de Itaú BBA, Santander, Bradesco BBI e Safra, além de “compra” por Banco do Brasil, XP, Citi, BTG Pactual e Eleven, segundo o terminal da Bloomberg.
Goldman Sachs, JPMorgan e Ativa Investimentos avaliam a ação como “neutra”, enquanto o Morgan Stanley é o único com recomendação de underweight (abaixo da média do mercado).
Confira abaixo a entrevista com a CFO da Allos, Daniella Guanabara, editada para fins de clareza.
Como a Allos planeja gastar seus recursos em 2025?
Continuamos no processo de captura de sinergias, qualificação do mix e entrega do melhor produto para consumidores e varejistas. É varejo. Temos de encantar o consumidor.
Continuamos com guidance de capex entre R$ 450 milhões e R$ 550 milhões. Tenho que ter um investimento todo ano para manter o shopping. Imagine a nossa casa: se você não faz a manutenção, vai gastar muito mais no dia em que terá de fazer uma obra.
Desde a fusão entre Aliansce Sonae e brMalls em 2023, quanto a Allos já capturou de sinergias?
Prometemos ao mercado R$ 210 milhões em sinergias ao fim de cinco anos em termos de Ebitda. Ao fim do terceiro ano, devemos chegar a 80% desse valor, o que representaria R$ 194 milhões. Já conseguimos R$ 134 milhões no fim do segundo ano. É um marco importante.
Isso nos dá conforto para cumprir o plano de sinergias. O fim do ano de 2024 comprovou que essa foi uma integração de sucesso. Foram dois anos de crescimento operacional e financeiro, sem qualquer percalço durante o caminho.
Quais são os principais desafios para sustentar a expansão em 2025?
O desafio é mais do mesmo. Temos que executar bem o plano que foi estruturado para a integração. Óbvio: o cenário macro é mais desafiador. Por outro lado, o índice de correção do preço do aluguel está um pouco mais alto neste ano do que em 2024, quando o IGP-M [Índice Geral de Preços – Mercado] chegou a ficar negativo durante uma época do ano, o que deixou o repasse mais limitado.
Mesmo assim, conseguimos trazer resultado relevante trabalhando outras linhas, como quiosques e mídia, receita de estacionamentos. Foi um ano de volta dos cinemas lotados, irrigando bem restaurantes e entretenimento. Também houve controle de custos operacionais e despesas que cresceram menos do que a inflação.
Com a alta dos juros, investidores mostram preocupação com o nível de endividamento das companhias. Como a subida da taxa Selic impacta as despesas financeiras da Allos?
Fizemos o dever de casa e já reperfilamos a dívida da empresa. Estamos com uma dívida muito mais alongada, a custo mais baixo. Quanto à essa dor de cabeça com a subida dos juros, estamos mais tranquilos, porque aproveitamos as janelas do mercado. Sabíamos que há eleição presidencial em 2026. Nunca é bom emitir dívida perto da eleição, porque o mercado pode ficar volátil.
A última emissão que fizmos já foi em 2025. Era uma emissão que tinha como emissão base R$ 500 milhões. Conseguimos captar R$ 625 milhões sub-CDI, ou seja, a emissão ficou em 99,5% do CDI.
Terminamos 2024 com alavancagem de 1,9x [na relação de dívida líquida/Ebitda]. Estamos tranquilos, pois nossos covenants financeiros apontam limite de 3,5x, que tenho que respeitar, além de dois covenants de liquidez. Estamos muito distantes do que seria o covenant financeiro.
Temos um balanço desalavancado o suficiente caso haja um cenário positivo e apareça uma oportunidade. Caso apareça, poderemos analisar uma oportunidade de aquisição, se fizer sentido. Eu tenho que ter um balanço que me permita espaço para aproveitar eventuais oportunidades.
Quanto à expansão para 2025, em quais mercados a Allos planeja investir mais?
Temos projetos, tanto de revitalização como de expansão, em andamento. O Parque Dom Pedro em Campinas e o Shopping da Bahia são dois projetos de médio prazo que continuam em 2025. No Dom Pedro, já revitalizamos o equivalente a três quartos do shopping. No da Bahia, avançamos no segundo e no terceiro andar. Temos expansão do shopping de Recife, de Maceió e na Tijuca.
No Shopping Leblon, estamos em processo de ressignificar o quarto andar, voltado para gastronomia: revitalizamos a praça de alimentação e trazemos novas operações de restaurantes.
Tudo isso faz com que o resultado dos shoppings em geral melhore.
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Quando fizemos a combinação de negócios [entre Aliansce Sonae e brMalls] em 2023, havia dez shoppings no portfólio que vendiam mais de R$ 1 bilhão para o consumidor final. Fechamos 2024 com 16 shoppings nesse patamar. Ou seja, em dois anos, seis shoppings do nosso portfólio ultrapassaram a marca de um R$ 1 bilhão. E o shopping de Recife e o Dom Pedro ultrapassaram R$ 2 bilhões em vendas.
De 2019 até o fim de 2024, temos crescimento de venda por metro quadrado acima de 40%. E crescimento de NOI [Net Operating Income] por metro quadrado, que é o resultado do shopping em si, como se fosse a margem bruta, de mais de 60%.
Em 2024, a Allos fechou com 1.110 contratos a mais com lojistas, com 97,8% de taxa de ocupação. No quarto trimestre, a demanda comercial continuava forte, com taxa de vacância muito baixa. Nosso guidance de Ebitda para 2025 tem no ponto médio um crescimento de 8% em relação ao ano passado.
A Allos se notabilizou pela venda de ativos há mais de um ano. Essa estratégia continua? E como fica a política de pagamento de dividendos?
Nos últimos dois anos, foram R$ 2,5 bilhões em desinvestimento. Desse valor, retornamos aos acionistas R$ 2,4 bilhões, seja em recompra de ações ou em pagamento de dividendos.
Foi um processo complexo, mas conseguimos entregar o que queríamos: aumento do retorno ao acionista e maior transparência com pagamento de dividendos mensais e indicação de datas ex [ex-dividendo, primeiro dia útil após a data de corte] para os próximos três meses.
Todo o processo de desinvestimento deixou nosso portfólio mais resiliente e focado nos shoppings líderes de seus mercados. Seguimos a cartilha de fortalecer o portfólio.
Houve uma qualificação do mix na direção correta: estamos fazendo não só que o shopping venda mas capturando mais dessas vendas por meio do NOI [renda líquida operacional]. Foi esse projeto de desinvestimento que financiou boa parte do retorno pago aos acionistas.
Temos que ter um balanço com espaço suficiente para que equilibrar três pilares: garantir o retorno adequado ao acionista, o crescimento orgânico e as oportunidade de crescimento inorgânico.
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