Retomada de IPOs volta a esfriar com guerra e alta do juro de títulos dos EUA

Mercado de capitais caminha para o segundo ano de ofertas públicas iniciais reduzidas; incertezas e aumento de volatilidade reduzem o apetite a risco de investidores

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Bloomberg — Justo quando parecia que Wall Street testemunharia uma retomada na captação de recursos no mercado acionário, os ânimos de banqueiros e emissores em potencial esfriaram.

Guerra no Oriente Médio, aumento dos juros de títulos do Tesouro americano e um mercado volátil para novas ofertas de ações tornaram o ambiente mais nebuloso e tendem a reduzir ainda mais o fluxo de negócios no mercado de capitais, já deprimido para quase nada neste trimestre, diminuindo a tolerância ao risco dos investidores.

Uma série de ofertas públicas iniciais de ações (IPOs na sigla em inglês) pouco impressionantes só agravou o ceticismo em Wall Street à medida que o mercado caminha para o segundo ano com um baixo número de novas emissões.

Dados compilados pela Bloomberg mostram que apenas US$ 47,6 bilhões foram arrecadados em ofertas iniciais de ações em bolsas dos EUA desde o início do ano passado - menos do que o total dos últimos dois meses de 2021.

O colapso tem repercussões de grande alcance, restringindo o acesso das empresas ao capital, levando os bancos a cortar empregos e limitando a capacidade de investidores de longa data de transformar seus investimentos em outros novos.

“Não espero muita atividade de IPO entre agora e o final do ano”, disse David DiPietro, chefe de private equity da T. Rowe Price.

As empresas em processo de abertura de capital precisam estar bastante confiantes nas “projeções para pelo menos o ano seguinte, e parece que isso é difícil, dadas as variáveis externas que podem afetar os negócios.”

O sucesso do mercado de IPOs historicamente é impulsionado pela força das ações e pela demanda por ativos mais arriscados, e esse apetite tem diminuído. Com o Federal Reserve sinalizando que manterá as taxas de juros elevadas por mais tempo e o petróleo subindo devido às tensões no Oriente Médio, o S&P 500 está a caminho de seu terceiro mês consecutivo de perdas.

Acrescente a isso a possibilidade de um shutdown do governo dos EUA em novembro, que poderia efetivamente fechar o mercado de IPOs por semanas, e as recepções mornas para ofertas como a da Birkenstock (BIRK) neste mês, e as razões para manter o fluxo de novas ofertas travado vão se acumulando, pelo menos até 2024.

“No que diz respeito aos clientes e outros na comunidade, poderá haver uma janela que se abre em meados ou no final de março e daí em diante”, disse Conor Moore, chefe da prática de Empresas Privadas da KPMG.

Follow-on ressurge

Dito isso, algumas empresas ainda estão dispostas a testar o ambiente atual. A empresa de software de pagamentos de saúde Waystar Holding e a Hamilton Insurance Group apresentaram pedidos de abertura de capital há alguns dias, enquanto o produtor de petróleo e gás Mach Natural Resources definiu uma faixa de preço para seu IPO.

Outras empresas de capital fechado avaliam opções diferentes, como rodadas de captação de recursos privados. Enquanto isso, as empresas que já são públicas podem vender mais ações ou emitir dívida conversível, passos que preenchem parcialmente a lacuna deixada por um mercado de IPOs anêmico.

As ofertas de follow-on tiveram um retorno neste ano, à medida que as empresas, após levantarem quantias recordes em 2020 e 2021, voltaram ao mercado de capitais para reabastecer seus cofres.

Até agora neste ano, as empresas americanas e seus maiores investidores levantaram US$ 77 bilhões em vendas de ações secundárias, cerca de 50% a mais do que neste ponto do ano passado, de acordo com dados compilados pela Bloomberg.

Nos próximos meses, à medida que a temporada de resultados trimestrais passa e as restrições de negociação se desfazem, os investidores esperam um aumento na atividade por meio de vendas secundárias de empresas de capital aberto com o apoio de empresas de private equity e venture capital.

“Financiamentos, usos específicos dos recursos e gestão do balanço devem continuar a sustentar a atividade de ofertas de acompanhamento e convertíveis pelo restante do ano”, disse Dave Stadinski, c-chefe global de mercados de capitais de ações da Piper Sandler.

Brilho dos conversíveis

A emissão de dívida conversível tem sido um dos poucos pontos brilhantes na captação de recursos corporativos neste ano, com empresas refinanciando notas existentes e usando o instrumento para reduzir os custos de empréstimos.

Os conversíveis são títulos de dívida com opção de conversão em ações, e essa natureza híbrida os torna uma alternativa mais barata para captação de recursos. Eles também podem resistir a um fechamento (shutdown) do governo, pois a maioria deles não é registrada na SEC, o equivalente dos EUA à Comissão de Valores Mobiliários brasileira e, portanto, não precisa de aprovação da agência.

As empresas dos EUA emitiram US$ 43,3 bilhões em títulos conversíveis neste ano, em comparação com cerca de US$ 30 bilhões em todo o ano de 2022, deixando este mercado no caminho de um ano relativamente normal em termos de volume, de acordo com dados compilados pela Bloomberg.

“Uma vez que as empresas perceberem que as taxas de juros não vão cair tão rápido quanto imaginavam, haverá uma rotação para os títulos conversíveis para aproveitar a estrutura de custos mais baixa”, disse Richard Duffield, chefe de mercados de capitais ligados a ações do Citigroup.

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