Buenos Aires — As medidas de choque que o novo governo de Javier Milei começou a anunciar na Argentina com o objetivo declarado de reduzir a interferência do Estado na economia têm mais chances de serem bem-sucedidas do que o plano gradualista pró-mercado do ex-presidente Mauricio Macri, afirmou o ex-manager de Relações com Investidores do Mercado Livre (MELI) e do Nubank (NU), Federico Sandler.
“Ainda estamos a tempo de realizar as reformas necessárias; vai doer, teremos que suportar um aumento da inflação, uma redução nos gastos públicos, mas, à medida que essas variáveis macroeconômicas começarem a se normalizar, teremos um crescimento significativo nos investimentos e na confiança na Argentina”, disse o executivo à Bloomberg Línea no podcast La Estrategia del Día Argentina. E acrescentou: “Isso se refletirá no risco-país, na taxa de juros, no custo de capital e assim por diante.”
Sandler, que ocupou o cargo de diretor de Relações com Investidores (RI) no Mercado Livre entre 2015 e 2021 e representou a Nubank perante investidores institucionais antes e durante a abertura de capital (IPO) do maior banco digital do mundo no fim de 2021, agora trabalha para a Spider Investments, uma empresa com foco em investimentos no mercado imobiliário dos Estados Unidos.
Questionado sobre a possibilidade de investidores internacionais e empresas argentinas preferirem aguardar para verificar se o pacote reformista de Milei pode sobreviver para além do mandato do libertário, o executivo disse que é “muito otimista se as reformas necessárias puderem ser implementadas”.
“O PowerPoint é muito bonito, agora é preciso levá-lo à realidade”, afirmou o economista.
No cenário de sucesso das reformas do novo presidente argentino, Sandler disse acreditar que o país tem condições de recuperar um protagonismo perdido ao longo dos últimos anos no ambiente de inovação e empreendedorismo.
Ele justificou a visão ao lembrar que, “antes da existência de Pagseguro (PAGS) e Stone (STNE) e todas essas startups no Brasil, o maior criador de unicórnios até 2015 era a Argentina, não o Brasil e não o México”.
“E isso tem muito a ver com o capital humano, com a habilidade dos argentinos de avançar apesar da adversidade; apenas acredito que houve uma deterioração política, econômica e social”, continuou.
Ele disse que essas condições levaram empresas como a Nubank, que chegou à Argentina em 2019, a decidirem finalmente que o país não era o melhor destino para alocação de capital, considerando que não se permitia a repatriação de dividendos, por exemplo.
Se o movimento pró-mercado de Milei se concretizar, a Argentina se tornaria um país “extremamente atraente” para empresas tecnológicas, energéticas e agroindustriais, afirmou Sandler.
Embora tenha apontado o desafio de reconstruir a confiança na comunidade internacional, dado que a Argentina tem sido uma “inadimplente serial”, ele também destacou o que classificou de resiliência das empresas locais diante de desafios como a inflação.
O executivo da Spider elogiou o nível de talento do capital humano argentino, “em inteligência artificial, em cripto, em fintech”, destacando que, mesmo com os desafios atuais, o país continua sendo “um grande exportador de talentos em posições de engenharia, inteligência artificial, produto”.
E enfatizou a urgência de “realizar as reformas o mais rápido possível para ter tempo suficiente para permitir esses investimentos”. Embora tenha reconhecido que “isso não será da noite para o dia”, expressou otimismo sobre o potencial da Argentina para se destacar como líder na economia digital da região.
IPOs de empresas latino-americanas
Sandler disse que, embora as condições atuais não se assemelhem aos anos de alta liquidez entre 2019-2021, existem oportunidades para ofertas públicas iniciais (IPOs) de empresas da América Latina e que, em sua avaliação, o mercado começa a se recuperar.
Ele apontou quatro critérios-chave para o sucesso das empresas ao buscar um IPO: as companhias devem ter “vantagens competitivas sustentáveis ao longo do tempo, um modelo de negócios que permita escalabilidade e expansão de margens com taxas de crescimento acima da média, gestão competente e responsável e um mercado potencial grande o suficiente”.
“Se uma empresa tiver esses quatro elementos, acredito que terá o potencial de realizar um IPO à medida que as taxas de juros cederem”, concluiu.
Sandler disse visualizar oportunidades no setor digital para a América Latina, especialmente nos setores de fintech, pagamentos, comércio eletrônico, logística e supply chain.
Ele previu um aumento no número de empresas B2B e B2C que poderiam optar por IPOs nos próximos anos, destacando que empresários como o cofundador da Nubank, David Vélez, costumam afirmar que a região ainda está em uma fase inicial no desenvolvimento de tecnologias por fintechs.
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