Bloomberg Línea — A decisão do Banco Central de reduzir a Selic de 13,75% para 13,25% foi vista por agentes do mercado financeiro consultados pela Bloomberg Línea como correta, uma vez que, assim como o próprio Comitê de Política Monetária (Copom) observou, as expectativas de inflação melhoraram e a taxa básica de juros permanece em patamar restritivo mesmo com o corte 0,50 ponto porcentual de quarta-feira (2).
Houve recados observados por economistas no comunicado que acompanhou a decisão: para Adriana Dupita, da Bloomberg Economics, Tony Volpon, ex-diretor do Banco Central, e Marcos Caruso, do PicPay, a decisão “apertada” seria um recado de que o mercado não deve esperar um aumento na intensidade do ritmo de corte, para 0,75 ponto percentual, por exemplo.
Segundo projeções da Bloomberg Economics, a taxa de juros neutra no país seria entre 8% e 9% ao ano.
Assim como o mercado financeiro, os diretores do Copom estavam divididos na reunião sobre o tamanho do corte de juros que deveria ser feito: 0,50 ou 0,25 ponto porcentual.
A visão a favor da redução de 0,50 ponto prevaleceu por 5 votos a 4. Tanto o presidente Roberto Campos Neto quanto o novo diretor de política monetária, Gabriel Galípolo, indicado pelo governo Lula, optaram pelo corte maior.
Veja sete visões de economistas e instituições financeiras abaixo:
Tony Volpon, ex-diretor do Banco Central
O ex-diretor do Banco Central e economista Tony Volpon destacou a sinalização de todo o Comitê de que os próximos cortes de juros serão de 0,50 ponto, apesar da divisão na hora da votação entre cinco diretores mais dovish e quatro mais hawkish. Em entrevista na última semana à Bloomberg Línea, Volpon defendeu a visão de que há condições para que a taxa Selic seja reduzida até 6% a 7% ao ano.
“Na verdade, tem mais unanimidade nesta decisão do que o aparente voto apertado parece implicar”, afirmou.
Adriana Dupita, economista da Bloomberg Economics
“Como esperávamos, a decisão não foi unânime e os formuladores de políticas elaboraram uma linguagem para conter as apostas em cortes maiores em reuniões futuras. Revisamos nossa projeção de taxa de final de ano ligeiramente para 11,75%. O movimento levou a taxa real ex-ante — descontada pela inflação esperada em 12 meses — para 8,8%. Isso ainda é consideravelmente mais alto do que a suposição do banco central de 4,5% para a taxa neutra, o que significa que a política monetária continua muito rígida.”
Marco Caruso, economista do PicPay
“O mercado estava dividido, então necessariamente teria uma surpresa. É interessante que eles optam de fazer esse corte de 0,50 ponto mesmo com o modelo deles para o final de 2024, que ainda é o horizonte relevante, sinalizando um IPCA acima da meta central de 3%. O modelo prevê 3,4%.”
“De certa forma, eles estão desistindo do centro da meta de 2024, mas, para não passar uma cara muito dovish e para também tentar conter os ânimos do mercado e segurar a precificação ‘na unha’, eles tentam passar recados mais duros, como a própria divisão dos votos de 5 a 4. Essa divisão diz que as próximas reuniões não vão ser de corte de 0,75, que era um dos riscos que eles não queriam passar. Outra forma com que eles também tentam ‘segurar na unha’ é mensagem de que estão querendo reduzir, sim, o nível de aperto, mas não significa que vão para um patamar expansionista.”
Rafaela Vitória, economista-chefe do Banco Inter
“A decisão veio em linha com nossa expectativa e com fundamento no cenário de queda mais acelerada da inflação do que o esperado. O mercado pode ajustar no curto prazo [...] mas a indicação do ritmo de 50 pontos-base para as próximas reuniões está em linha com a expectativa e não deve impactar de maneira significativa a curva de juros. O tamanho do corte total que pode ser feito ainda está bastante indefinido e nossa projeção se mantem em Selic em 9% para 2024 considerando o atual cenário de queda da inflação e cortes que seguirão no ritmo de 50 pontos-base.”
Alex Agostini, economista-chefe da Austin Rating
“A decisão ficou dentro da expectativa da Austin Rating. Nós acreditávamos que seria um corte de 0,50 ponto em virtude das condições muito favoráveis para ir além de um corte de 0,25 ponto. Nossa previsão estava fundamentava tanto na necessidade de reduzir o juro real para mais próximo do juro neutro mas também porque todas as expectativas de inflação futura já estão dentro dos limites toleráveis para o cumprimento das metas de inflação. O ritmo de corte deve continuar até meados de 2024, quando a taxa real vai chegar à taxa neutra, que é aquela não contrai e nem estimula a economia.”
Alfredo Coutiño, diretor para LatAm da Moody’s
A agência de classificação de risco Moody’s, em relatório assinado por seu diretor para América Latina, Alfredo Coutiño, destacou que os juros continuam em zona restritiva no Brasil e que, apesar de melhora, precisam continuar altos enquanto o país não faz reformas estruturais para melhorar seu potencial de crescimento, para compensar qualquer risco inflacionário.
“Além da situação de curto prazo, o Brasil precisa fortalecer as fontes de crescimento fundamentais por meio do aprofundamento de mudanças estruturais. A recessão causada pela covid-19 afetou a capacidade produtiva na medida em que a pandemia se agravou. A política monetária terá que ficar além da taxa neutra a fim de desativar qualquer risco de desequilíbrio potencial e deixar a economia se ajustar em direção a um estágio estável no médio prazo.”
André Perfeito, economista
Na visão do ex-economista da Necton Investimentos, André Perfeito, o ciclo de redução nos juros deve ser curto porque o comunicado afirma que a taxa deve permanecer contracionista. Assim, Perfeito entende que a Selic deve cair até 10,75% ao ano no começo de 2024, “estacionando” por ali.
“O fato de Roberto Campos Neto e Galípolo terem votado juntos evita problemas de conflitos internos para a diretoria do BCB na condução da política monetária e alivia pressões sobre o BCB [...] O mercado deve revisar a Selic para o fim de 2023 para 11,75% em linha com nossas projeções. No último Boletim Focus, ela estava em 12%.”
Leia também
Powell descarta corte de juros neste ano e diz que ‘staff’ não vê mais recessão