Bloomberg — Na era de juros crescentes e de concorrência acirrada, fintechs estão cada vez mais convencidas de que precisam se tornar bancos para garantir sua sobrevivência a longo prazo. Mas também começam a perceber que esse caminho não é fácil.
A Figure Technologies, uma empresa de blockchain fundada pelo co-fundador da SoFi Technologies, Mike Cagney, é a empresa mais recente a desistir de seu pedido de licença bancária, uma decisão tomada após anos de espera por uma resposta dos reguladores financeiros dos EUA.
A Figure não está sozinha: as companhias de tecnologia financeira Oportun, Brex, dos brasileiros Henrique Dubugras e Pedro Franceschi, e Monzo Bank, além da plataforma de criptoativos BitPay, também decidiram entrar com solicitações para operarem como bancos nos EUA, devido ao árduo caminho para obter aprovação.
Já se foi o tempo em que ser uma fintech inovadora era mais atraente para investidores e clientes do que bancos tradicionais e antiquados.
Com os aumentos agressivos das taxas de juros por parte do Federal Reserve, o financiamento fácil e barato evaporou para as fintechs, enquanto as parcerias com bancos - algo necessário para as fintechs oferecerem contas de poupança e empréstimos – também ficaram mais caras.
Ser um banco, antes considerado um negócio estável, mas relativamente enfadonho e demasiado regulamentado, é agora mais atraente do que nunca.
Embora algumas fintechs tenham se tornado bancos com sucesso durante a presidência de Donald Trump, nenhuma delas recebeu aprovação para licença bancária desde que os reguladores escolhidos por Joe Biden assumiram a liderança das agências federais, com pedidos em espera há anos.
“Embora eu responda todas as semanas a perguntas de pessoas que desejam novas licenças, muito poucas pessoas, se houver, conseguirão essas licenças”, disse Matthew Bisanz, sócio do escritório de advocacia Mayer Brown focado em regulamentação financeira.
Isso não significa que o desejo de se tornar banco desapareceu.
Em vez de esperar por uma aprovação do Escritório do Controlador da Moeda (OCC), que talvez nunca chegue, algumas fintechs procuram seguir um caminho traçado pelas pioneiras LendingClub e SoFi: comprar um banco existente para garantir sua licença.
“Essa é a clara tendência”, disse Jonah Crane, sócio da empresa de consultoria e investimento Klaros Group, que presta serviços para fintechs. “Quem busca entrar no sistema bancário considera a aquisição um caminho mais viável.”
Mas isso também se revela um desafio – não tão difícil como a aprovação de uma licença bancária, mas também não é fácil.
Em uma escala de 1 a 10, uma fintech que garante uma autorização bancária provavelmente teria um 8 de dificuldade, enquanto a aquisição de um banco já existente está mais perto de 5 ou 6, destacou Bisanz.
Banco no futuro
A Figure, por exemplo, não descarta a possibilidade de se tornar um banco no futuro – inclusive, potencialmente, por meio de aquisições –, embora não tenha nenhum plano atual para fazê-lo, de acordo com o diretor de operações, TJ Milani.
“Tudo é possível”, disse em entrevista.
Um representante da Oportun não quis comentar, e um porta-voz da Brex disse que a empresa está “entusiasmada em fechar parcerias com bancos existentes” para as suas ofertas. O Monzo, com sede em Londres, disse que continua a operar com seu parceiro bancário para atividades nos EUA.
A BitPay citou “mudanças na liderança do OCC e nos pronunciamentos de políticas” para desistir de seu pedido. “Tornou-se evidente que ainda não chegou o momento de adotar uma abordagem inovadora para licenciar uma empresa de pagamentos com criptomoedas”, disse o CEO Stephen Pair em comunicado enviado por e-mail.
Menos financiamento
Ao mesmo tempo, o financiamento às fintechs secou: o volume total às empresas caiu no segundo trimestre para o nível mais baixo desde 2017, segundo dados compilados pela CB Insights.
Para fintechs que aceitam depósitos e possuem foco em empréstimos, ser um banco resolveria muitos desses problemas. E, para plataformas cripto, uma licença bancária nacional é vista como uma forma de ganhar legitimidade em uma indústria que enfrenta escrutínio regulatório crescente.
O ambiente bancário atual é muito diferente de quando Trump era presidente. Duas fintechs – a Square, que agora se chama Block, e a Nelnet – receberam licenças para empréstimos em 2020, e uma empresa cripto, a Anchorage Digital, obteve licença de banco nacional uma semana antes de Trump deixar o cargo.
“Os democratas acreditam que o governo Trump estava distribuindo licenças como ‘chicletes’, e os reguladores da administração Biden deixaram claro que a ponte levadiça para as licenças foi levantada”, disse Isaac Boltansky, diretor de pesquisa de políticas da corretora BTIG, em Washington.
O órgão regulador FDIC não quis comentar. O OCC não respondeu a pedidos de comentários.
-- Com a colaboração de Max Reyes, Katanga Johnson e Ben Bain.
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