Bloomberg — O Banco Central precisa que as suas projeções de inflação recuem para perto da meta de 3% para viabilizar o fim do ciclo de alta da Selic, segundo Mario Mesquita, economista-chefe do Itaú Unibanco.
“O BC não deve fazer um movimento de política monetária divorciado das projeções”, afirmou Mesquita em entrevista no escritório da Bloomberg, em São Paulo. “Para o BC parar, ele tem que ter uma projeção que permita”, afirmou.
O Copom, que elevou a Selic em 1 ponto percentual, para 14,25% ao ano, e indicou novo aperto de menor magnitude em maio, projeta IPCA a 3,9% no 3º trimestre de 2026 — que corresponde ao chamado horizonte relevante de política monetária —, no cenário de referência. De acordo com a ata da reunião, divulgada nesta terça-feira, “o ciclo não está encerrado”.
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“Certamente uma projeção acima de 3,5% já está distante da meta. Mas isso vai ser o julgamento do Copom”, afirma Mesquita.
O economista do Itaú também avalia que o BC poderá lançar mão novamente de um cenário alternativo para as projeções que contemple uma Selic estável à frente. Essa seria uma forma de mostrar que o fim do ciclo também apontaria para a convergência da inflação à meta.
O banco, que tinha uma das estimativas mais elevadas para a Selic entre os principais bancos, cortou recentemente a previsão de juro de fim de ciclo de 15,75% para 15,25% — com mais duas altas adicionais. O banco alterou suas estimativas devido aos efeitos da recente queda do dólar e aos riscos baixistas para a inflação.
Sobre a ata do Copom, o Itaú diz que o texto mostrou um tom mais duro e foi “firme e direto” em relação à inflação, em relatório.
Sem cortes
Mesquita, que foi diretor do Banco Central de 2006 a 2010, não vê espaço para cortes neste ano. Para ele, qualquer eventual surpresa positiva no cenário de inflação viria justamente do câmbio, que o banco enxerga próximo do atual patamar, perto de R$ 5,75, até o fim do ano.
“Precisaria ter uma diminuição do risco Brasil ou o dólar seguir se enfraquecendo” globalmente para um alívio extra na taxa de câmbio, disse.
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Para ele, parte da queda recente do dólar é explicada por fatores externos, conforme os mercados globais questionam o chamado “excepcionalismo americano” — a visão de uma economia dos EUA com desempenho superior ao de outros países ricos ou mesmo muitos emergentes. Além disso, houve uma reversão de um exagero pessimista do mercado no fim do ano passado, quando o dólar chegou a bater máxima histórica acima de R$ 6,30.
Em relação a Trump, o economista-chefe do Itaú acredita que o Brasil será incluído nas tarifas a serem anunciadas no próximo dia 2 de abril, mas pode ter algum poder de barganha para buscar isenção ou taxas mais baixas no setor de energia.
“Como o Brasil foi citado mais de uma vez, imagino que seja provável que a gente seja incluído”, disse Mesquita. “Se o Brasil escapar, seria uma boa surpresa.”
Ele pondera, contudo, que os EUA não são o principal parceiro comercial do país, o que implica em um efeito menor na economia brasileira. “Impacto seria via câmbio. Se já está no preço do mercado, impacto não seria muito grande”, disse.
Gastos
Um defensor do modelo original do teto de gastos para endereçar a dívida de forma mais rápida, o que na sua avaliação pavimentaria o caminho para uma retomada de um grau de investimento, Mesquita pondera que o sucesso de qualquer regra fiscal passaria por endereçar de forma mais efetiva a rigidez do gasto público.
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“Muito difícil qualquer governo, independentemente da orientação ideológica, ter muito controle das contas públicas sem atacar a rigidez orçamentária”, diz. “O que tenho em mente não é que um regime com um teto que dure para sempre, mas que dure enquanto a gente tiver uma necessidade de reduzir o patamar da dívida.”
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