Em Wall Street, eleição tão apertada não compensa o risco de apostar no vencedor

Embora o chamado ‘Trump trade’ tenha ganhado força nas últimas semanas, cenário imprevisível tem feito boa parte do mercado esperar pelo resultado antes de assumir posições de alto risco

Incertezas sobre quem será o próximo presidente dos Estados Unidos dificultam a tomada de posições no mercado financeiro
Por Esha Dey - Jessica Menton
04 de Novembro, 2024 | 08:35 AM

Bloomberg — Falta uma sessão de negociação. Isso é tudo o que Wall Street tem até amanhã, quando os eleitores dos Estados Unidos escolherão seu próximo presidente, potencialmente determinando a direção da economia pelos próximos quatro anos.

Os traders estão agitados com as possibilidades e verificam constantemente as últimas pesquisas e os movimentos nos mercados de apostas eleitorais para saber quem está na frente, o republicano Donald Trump ou a democrata Kamala Harris, e o que isso significa para suas posições.

Em alguns cantos, especula-se que Wall Street está apostando em Trump. Mas quando se trata de realmente investir dinheiro no mercado de ações com base nessa visão, a situação é outra.

Os profissionais de investimento sabem que é possível ganhar dinheiro ao prever o vencedor antes que ele aconteça. O problema é que esta eleição está muito apertada e imprevisível demais para essa decisão, o que torna o risco de um erro muito elevados para muitos.

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“Não estamos nos posicionando para um resultado na eleição porque é um cara ou coroa”, disse Eric Diton, presidente e diretor administrativo da Wealth Alliance, em uma entrevista à Bloomberg News. “Não faz sentido fazer uma aposta.”

A maioria dos traders prevê o aumento da volatilidade nesta semana, possivelmente em grande volume, com a forte probabilidade de um resultado contestado que arraste a contagem - e a recontagem - dos votos por semanas ou até meses.

Isso explica por que o Índice de Volatilidade Cboe, conhecido como “Índice do Medo”, subiu acima de 20 pontos nas últimas quatro sessões, um nível que normalmente sinaliza o aumento do estresse no mercado de ações.

E é por isso que investidores estão menos ansiosos para escolher vencedores e perdedores com base em quem eles acham que será o próximo presidente dos Estados Unidos.

O VIX, índice que reflete a volatilidade no mercado de ações, está acima do patamar de 200 na sequência mais duradoura desde 2019

"No passado, as pesquisas estavam muito erradas", disse Dave Lutz, operador de vendas de ações e estrategista macro da JonesTrading. "Simplesmente não há vantagem para ver quem está ganhando."

Segurança no caixa

O outro desafio de posicionamento é o número de catalisadores adicionais em torno da votação que provavelmente movimentarão o mercado.

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O dia da eleição será rapidamente seguido, excepcionalmente na quinta-feira (7), pela decisão do Federal Reserve sobre a taxa de juros e pela entrevista coletiva do presidente do Fed, Jerome Powell, que dará detalhes sobre a trajetória da taxa de juros do banco central.

E uma grande parte de empresas norte-americanas ainda divulgará seus resultados trimestrais, com os números da gigante de chips Nvidia, por exemplo, previstos para 20 de novembro.

Isso explica por que Lutz não está se posicionando especificamente para a eleição. Em vez disso, o que ele recomenda é "guardar algum dinheiro" que possa ser empregado quando surgirem oportunidades de curto prazo, como ações individuais ou setores que tenham reações instintivas quando surgir um vencedor.

"Eu diria que muitos investidores estão posicionados exatamente dessa forma", disse Lutz.

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É o caso de Robert Schein, diretor de investimentos da Blanke Schein Wealth Management, que disse ter aumentado seu patrimônio equivalente a dinheiro para 10% antes da eleição, em comparação com seus 5% habituais.

Sua estratégia é estar pronto para investir em ativos quando os resultados inevitavelmente provocarem volatilidade em pelo menos algumas partes do mercado.

“Os investidores precisam analisar os riscos eleitorais persistentes”, disse Anwiti Bahuguna, diretor de investimentos de alocação global de ativos da Northern Trust Asset Management, em uma entrevista.

“Os traders não podem nem mesmo se posicionar neste momento, já que se trata de algo muito especulativo, e eles não sabem quais propostas de políticas econômicas seriam realmente aprovadas por qualquer um dos candidatos no Congresso.”

Talvez não seja de surpreender que os mercados pareçam nervosos.

O S&P 500 está sendo negociado perto de sua maior alta de todos os tempos, enquanto o VIX está acima de 20.

A última vez que o S&P bateu um recorde ao mesmo tempo em que o chamado “índice do medo” tão elevado foi durante o surto da variante delta do coronavírus em março de 2021.

Enquanto isso, fundos hedge apostam em oscilações de preços ainda maiores. Grandes especuladores se tornaram comprados - apostam na alta - nos futuros do VIX pela primeira vez desde janeiro de 2019, segundo dados compilados pela Commodity Futures Trading Commission no início deste mês.

Fundos hedge estão comprados no VIX, em sinal de que acreditam que haverá aumento da volatilidade nos mercados mais adiante

Os dados dos mercados de opções mostram que os traders se mantêm na defensiva, colocando avaliações acima do normal para se protegerem contra uma venda rápida, de acordo com Rocky Fishman, fundador da Asym 500.

Parte disso é impulsionada pela “enxurrada” de relatórios e dados que serão divulgados nos próximos dias, incluindo a decisão do Fed, os resultados corporativos e os números da inflação em outubro, acrescentou.

“Embora os mercados estejam claramente precificando um dia de alta volatilidade na quarta-feira (6), quando soubermos dos resultados das eleições, o período em torno disso está longe de ser tranquilo”, disse Fishman.

Fundamentos para além das eleições

Dentro das empresas, também há hesitação - e cautela - para entrar no mercado de ações.

Apenas 261 executivos corporativos compraram ações de suas próprias empresas em outubro, o patamar mínimo desde pelo menos 2017, o que levou o índice de compra e venda para o segundo nível mais baixo desde a primavera de 2021, segundo dados compilados pelo Washington Service.

De acordo com alguns profissionais de Wall Street, os investidores que buscam uma estratégia de ações mais seguro devem, em vez disso, ignorar o ruído das eleições.

“A eleição é um evento de baixa probabilidade, portanto, esperamos um período volátil no próximo mês”, disse Bahuguna, do Northern Trust.

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“Mas, em última análise, o que sustenta o mercado de ações são os lucros corporativos decentes, o forte crescimento econômico, a queda da inflação e o corte das taxas pelo Fed.”

O Northern Trust está com recomendação acima do peso - overweight - para as ações dos EUA com base na força econômica resiliente, e está underweight para títulos para se proteger contra os riscos de inflação.

A empresa também está “super ponderada” em ativos reais, incluindo infraestrutura, recursos naturais e imóveis, para proteger seus portfólios de futuras turbulências se o mercado de trabalho continuar apertado e o crescimento econômico se mantiver sólido.

Outros estão analisando os lucros das empresas, principalmente os balanços patrimoniais de maior qualidade, já que as taxas permanecem elevadas e o Fed apenas começou a reduzi-las.

“As taxas de juros ainda são restritivas e o aumento da volatilidade é mais provável até o final do ano, portanto, uma abordagem mais conservadora é apropriada”, disse Brian Mulberry, gestor de portfólio de clientes da Zacks Investment Management.

O ponto em tudo isso é que, com uma eleição que não tem um favorito óbvio, a jogada mais segura para os investidores é a paciência. É isso que Wall Street está pregando - pelo menos por enquanto.

“Se fosse uma decisão mais clara, ela já estaria incorporada ao mercado e não haveria muito o que explorar”, disse Mark Luschini, estrategista-chefe de investimentos da Janney Montgomery Scott.

"Mas, em algo tão apertado, é melhor olhar para o horizonte e manter suas ideias sobre como será a condição macroeconômica daqui a seis ou 18 meses, em vez de se concentrar apenas no resultado daquele dia."

-- Com a colaboração de Natalia Kniazhevich e Alexandra Semenova.

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