Bloomberg — Um rali de quase US$ 10 trilhões para as ações globais neste ano enfrentará um momento decisivo nas próximas semanas com a divulgação de resultados trimestrais de centenas de empresas.
As empresas do S&P 500 devem registrar uma queda de 9% nos lucros no segundo trimestre, no que deve se tornar a pior temporada de balanços desde 2020, segundo dados compilados pela Bloomberg Intelligence.
Na Europa pode ser ainda pior, com uma queda projetada de 12% nos lucros. Mas com a barra de expectativas já baixa - e alguns indicadores sugerindo uma recuperação dos lucros no próximo ano -, os estrategistas estão divididos sobre como o mercado reagirá.
“Tenho dúvidas de que as empresas conseguirão demonstrar o mesmo grau de resiliência de ganhos neste trimestre”, disse Evgenia Molotova, gerente sênior de investimentos da Pictet Asset Management. “O crescimento da receita e a estabilidade da margem serão fundamentais para avaliar se os lucros poderão se recuperar no segundo semestre.”
As áreas de foco para os observadores do mercado incluem o impacto de um dólar em queda sobre os grandes exportadores para os Estados Unidos, a substância por trás da “febre” da Inteligência Artificial (IA) que impulsionou o rali das ações neste ano e novas pistas sobre o quanto as empresas estão sendo afetadas por custos mais altos e um consumidor espremido pela inflação e pelos juros.
Aqui estão cinco pontos que os investidores estão observando:
1. Impacto da IA
O frenesi em torno da IA levou o Nasdaq 100 à sua melhor primeira metade do ano. Agora, os investidores estão à procura de evidências das implicações de ganhos da tecnologia nascente.
“Se o entusiasmo pela IA não se materializar adequadamente nos ganhos das empresas de tecnologia, poderemos experimentar pelo menos uma correção temporária nos preços das ações”, disse Aneeka Gupta, diretora de pesquisa macroeconômica da WisdomTree.
As maiores ações de tecnologia - Apple (AAPL), Microsoft (MSFT), Amazon (AMZN), Nvidia (NVDA) e Alphabet (GOOG), controladora do Google - devem registrar o melhor crescimento de lucros entre as empresas americanas neste trimestre, de acordo com a Bloomberg Intelligence.
2. Efeito de inflação
Os sinais de arrefecimento da inflação alimentaram o otimismo de que o Federal Reserve possa interromper o aumento das taxas em breve. Para as empresas, a notícia não é tão positiva porque a mão-de-obra e outros custos ainda estão elevados, enquanto elas lutam para aumentar ainda mais os preços para os clientes.
“A inflação principal desacelerou mais rápido do que os salários, o que pode ajudar os consumidores, mas prejudica as margens”, disse Rob Haworth, estrategista sênior de investimentos do US Bank Wealth Management. “Estaremos observando a interação do crescimento salarial com a inflação de preços para saber se as empresas permanecem sob pressão.”
A Nokia Oyj e a rede de restaurantes Cracker Barrel Old Country Store estavam entre as que alertaram sobre o impacto dos custos mais altos nos primeiros resultados já divulgados.
3. Consumidor ‘espremido’
Investidores e analistas de mercado disseram que estão focados no comportamento dos gastos do consumidor e que avaliam as vendas de automóveis e do setor de viagens e hospitalidade para avaliar a saúde da América corporativa. Outra área de foco será o endividamento das empresas e os planos de refinanciamento, especialmente para aquelas com balanços mais fracos.
“Consumidores sustentaram a economia dos EUA por meses, estimulados por um forte mercado de trabalho e excesso de poupança, portanto, qualquer evidência de aperto de cinto, negociação ou queda nos gastos com serviços será fundamental”, disse Ross Mayfield, analista de estratégia de investimento da Baird.
Ajustados pela inflação, os gastos do consumidor nos EUA estagnaram em grande parte após o aumento no início do ano, e alguns sinais iniciais das empresas não foram bons.
A fabricante de chips de memória Micron Technology disse que espera uma contração nos mercados de PCs e smartphones, enquanto a gigante química alemã BASF alertou sobre os resultados, culpando a baixa demanda por produtos de consumo.
Isso significa que as previsões para uma rápida recuperação dos lucros no próximo ano podem ser muito otimistas e deixar as ações vulneráveis a uma liquidação se as empresas parecerem cautelosas, de acordo com Michael Wilson, estrategista-chefe para ações do Morgan Stanley e considerado uma das vozes mais pessimistas - ou realistas - de Wall Street.
4. Desaceleração da Europa
Espera-se que os lucros de empresas na Europa caiam mais do que nos EUA, devido à fraqueza no setor manufatureiro, de acordo com estrategistas do Barclays.
Os grandes exportadores também estão enfrentando mais um obstáculo à medida que moedas como o euro e o franco suíço se fortalecem. A Swatch Group - que tem altos custos fixos na Suíça - alertou que as mudanças cambiais pesarão nas vendas de relógios neste ano.
O mercado de ações começou a refletir os desafios da Europa no período de abril a junho, quando o Stoxx 600 teve desempenho inferior ao S&P 500 em dólares. Embora valuations mais baratos tenham tornado as ações regionais atraentes novamente para alguns investidores, outros dizem que a escassez de ações de tecnologia pode manter as perspectivas instáveis.
5. China instável
O mercado de ações da China perdeu o rali global deste ano em meio a uma fraca recuperação econômica, com preocupações com o setor imobiliário e o desemprego entre os jovens.
Os relatórios de resultados das montadoras do país devem ser um ponto positivo, à medida que as vendas domésticas e as exportações ganham impulso, enquanto os das empresas de tecnologia podem ser fracos, já que os mercados globais de chips permanecem sem brilho.
As apostas também são altas para empresas internacionais com exposição à China, como as gigantes do luxo da Europa.
O Burberry Group disse na sexta-feira (14) que a demanda na China ajudou a compensar a fraqueza nos EUA. As favoritas dos investidores, a LVMH e a Kering SA, que começaram a mostrar algumas rachaduras nas vendas no início deste ano, também serão examinadas por seu desempenho na Ásia.
Fabiana Fedeli, diretora de investimentos para ações e ativos múltiplos da M&G, disse que as empresas de artigos esportivos e de beleza que vendem na China enfrentam mais riscos do que as empresas de luxo devido à demografia de seus clientes.
- Com a colaboração de Namitha Jagadeesh e April Ma.
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