Prédios comerciais perdem até 50% do valor na Irlanda, em sinal de alerta para o setor

Efeito do home office tem feito empresas de tecnologia reduzirem a demanda por escritórios em Dublin, o que provoca a quebra de alguns edifícios

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Bloomberg — Os proprietários de prédios comerciais, prejudicados por uma retração global, ainda têm esperança de que os novos edifícios com fortes credenciais ecológicas ainda exigirão aluguéis e preços mais altos. O mercado de Dublin é um exemplo de que esse otimismo pode não se sustentar, o que serve de alerta para o setor em outros lugares do mundo.

No distrito de North Docks da capital da Irlanda, novos edifícios entraram em processo de falência depois que as empresas de tecnologia dos Estados Unidos reduziram a quantidade de novos espaços alugados e os juros aumentaram.

Os valores dos imóveis já caíram de 40% a 50% em relação ao seu pico, de acordo com investidores e corretores, que esperam que as quedas de preços e as dificuldades de financiamento continuem nos próximos meses.

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A crise tem se desenvolvido em uma área da cidade que ficou marcada, há uma década, pela estrutura inacabada do prédio que seria a nova sede do Anglo Irish Bank (AIB). A quebra da instituição financeira ajudou a afundar a economia durante a crise de 2008.

A recuperação subsequente da economia da Irlanda foi impulsionada em parte pela expansão de empresas como a Alphabet (GOOGL) e a Meta Platforms (META).

O movimento aumentou a demanda por espaço de trabalho, e os incorporadores correram para fornecê-lo, até que a expansão das big techs foi interrompida em meio a um foco na redução de custos após uma explosão nas contratações durante a pandemia.

“O setor de tecnologia tem uma cultura de trabalho mais remota do que muitos outros setores, que parece ter se tornado ainda mais arraigada devido à pandemia”, disse Sue Munden, analista de pesquisa sênior da Bloomberg Intelligence. “Os clusters de tecnologia, como Dublin, podem ser mais vulneráveis a qualquer recuo na demanda de espaço.”

Edifícios irregulares

A área das docas de Dublin foi radicalmente modificada nos últimos anos: um bairro economicamente carente da cidade se transformou em uma região comercial e residencial ao lado do rio Liffey, que corta o centro da capital. Mas, nos últimos meses, houve um número crescente de imóveis com problemas na zona North Docks.

Esta reportagem tomou como base entrevistas com mais de 10 investidores, gestores de ativos e corretores, que pediram para não serem identificados para discutir informações privadas.

Um edifício alugado para a Meta na área foi confiscado por um credor no ano passado, enquanto o incorporador veterano Johnny Ronan viu uma série de ativos, incluindo um bloco de escritórios, entrar em um processo de reestruturação no final de 2023. Ronan não quis comentar.

Desde então, a Pacific Investment Management (Pimco) nomeou administradores judiciais para um projeto em North Docks incorporado por um empreendimento que inclui a National Asset Management Agency (Nama), banco que costuma adquirir empréstimos em default e outros ativos ilíquidos de outras instituições financeiras.

Os edifícios podem ser vendidos por menos do que o valor da dívida sênior de 120 milhões euros (US$ 130 milhões) fornecida pela Pimco, de acordo com dois corretores com conhecimento do assunto. A Nama e a Pimco não quiseram comentar.

Os investidores também perderam o controle de um conjunto alugado para a WeWork, e cinco pessoas com conhecimento do assunto esperam que mais edifícios construídos na cidade nos últimos anos entrem em recuperação judicial nos próximos meses.

O movimento faz parte de uma desaceleração global mais ampla que atingiu os valores de imóveis comerciais de Nova York a Londres e Hong Kong, com implicações para incorporadoras, investidores, bancos e outros credores.

De acordo com a Fitch Ratings, mais empréstimos para imóveis comerciais enfrentarão problemas este ano, à medida que os locatários de escritórios reduzem seus espaços, dificultando o refinanciamento e deixando os edifícios mais antigos em risco de ficarem vazios.

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Exposição ao crédito

Em Dublin, a locação de escritórios no primeiro trimestre caiu para o nível mais baixo da década, excluindo o período da pandemia, de acordo com a Jones Lang LaSalle.

O presidente do banco central da Irlanda, Gabriel Makhlouf, disse no início deste ano que os órgãos reguladores estavam “de olho” nos imóveis comerciais, mas “no momento, sentimos que o sistema é resiliente o suficiente para gerenciar a queda dos valuations”.

Um motivo para otimismo é que a recessão não atingirá os bancos irlandeses com a mesma intensidade que em 2008. Em vez disso, grande parte do financiamento dessa vez foi prestado por empresas de crédito privado.

No momento, alguns credores escolhem ignorar as violações de cláusulas de empréstimos vinculadas ao valor de um imóvel, disseram várias fontes, na esperança de que os cortes esperados nas taxas de juros estimulem uma espécie de recuperação.

Ainda assim, um especialista em insolvência acredita que a paciência com os mutuários se esgotará no segundo semestre, à medida que as vendas de recuperação judicial tragam mais clareza aos valuations.

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Trabalho remoto

Na capital irlandesa, assim como em outros lugares, os imóveis e credores foram surpreendidos pela prevalência do trabalho remoto entre os trabalhadores do setor de tecnologia após a pandemia.

No quarto trimestre de 2023 houve uma queda de quase 90% no espaço de novos acordos de locação por empresas de tecnologia, de acordo com dados compilados pela corretora Lisney. Muitos dos edifícios foram alugados antes da conclusão, processo conhecido como pre-letting.

“Com o desaparecimento efetivo das big techs do mercado de pre-letting, a demanda mais ativa dos ocupantes é de pequenas e médias empresas, que normalmente ocupam espaço para 20 a 80 pessoas, em comparação com várias centenas de locações de tecnologia maiores”, disse James Mulhall, diretor administrativo da corretora Murphy Mulhall. “Isso, combinado com modelos de trabalho híbridos, significa que levará mais tempo para lotar os edifícios de escritórios”.

Um investidor disse que, nos últimos anos, as incorporadoras de escritórios de Dublin tentaram maximizar os valores ao aumentar a densidade com o menor custo possível, em vez de construir edifícios desejáveis para inquilinos e trabalhadores.

Embora isso não fosse tão importante quando havia uma escassez de edifícios de alta qualidade, agora os ocupantes terão mais opções.

Haverá também uma pressão de baixa sobre os aluguéis à medida que as empresas de tecnologia se movimentarem para se livrar do espaço de que não precisam mais. Esse excesso de espaço está em um nível recorde em Dublin, segundo a JLL.

A Salesforce (CRM), que continua contratando, avalia a sublocação de 7.400 metros quadrados em North Docks, de acordo com pessoas com conhecimento do assunto. A empresa não quis comentar.

O banco central da Irlanda, que acabou reformando o edifício Anglo Irish como sua própria sede, busca sublocar cerca de 9.750 metros quadrados de escritórios em uma propriedade e também colocou à venda parte do espaço na área, disse um porta-voz.

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Há uma enorme incerteza sobre o rumo que o mercado tomará em seguida. O cenário básico da Allied Irish Banks é que os preços dos imóveis comerciais caiam 2,5% este ano. O rival Bank of Ireland Group prevê uma queda muito maior, de 11%.

O AIB já assumiu o que descreveu como um “grande encargo” de 327 milhões de euros (US$ 355 milhões) no ano passado, uma parte dele relacionada a escritórios.

Os empréstimos para imóveis e construção, em que o risco de crédito aumentou, dobraram para 2,8 bilhões de euros (US$ 2,9 bilhões). O credor acredita que a maior parte da retração já ocorreu, disse um porta-voz da AIB, e pode haver uma recuperação modesta a partir de 2025 se a política monetária for afrouxada ainda este ano.

Especialistas em imóveis afirmam que levará pelo menos dois anos para que o mercado veja uma recuperação, mas com a diminuição das novas construções, a demanda futura beneficiará os proprietários dos melhores edifícios com credenciais ecológicas, principalmente antes da meta de reduzir as emissões de dióxido de carbono até o final da década.

“No médio prazo, haverá demanda, mas serão apenas lotes menores para atender ao novo normal”, disse Aoife Brennan, diretora sênior da Lisney. “As promessas de ESG também serão levadas em conta, de modo que a demanda será por edifícios de alta qualidade e com eficiência energética.”

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