O potencial do lítio na Argentina e os maiores desafios após a queda dos preços em 2023

Com base em um relatório da Aleph Energy, a Bloomberg Línea preparou um raio-X do setor que tem potencial de US$ 30 bi em exportações na Argentina

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Bloomberg Línea — A demanda pelo lítio continuará aumentando nos próximos anos e será dominada por seu uso em veículos elétricos. O preço para sua aplicação em baterias ainda não chegou ao mínimo, mas até 2030 deve aumentar até atingir o equilíbrio entre oferta e demanda.

Essas são algumas conclusões do relatório “Estudo do mercado de lítio na Argentina por projeto e empresa”, elaborado pela consultoria Aleph Energy, liderada por Daniel Dreizzen, e ao qual a Bloomberg Línea teve acesso exclusivo.

Com 64 projetos, a Argentina é o segundo país em termos de recursos e o terceiro em termos de reservas. Atualmente, é o quarto produtor global, mas a projeção é que seja o terceiro até o final da década.

O potencial de lítio da Argentina é imenso e o crescimento será grande.

Daniel Dreizzen, diretor da consultoria Aleph Energy

O relatório analisa o mercado global de lítio, mas descreve detalhadamente o negócio na Argentina, do qual participam 41 empresas, de diversas bandeiras, tamanhos e características, proprietárias de 64 projetos.

Preço internacional do lítio

Uma das dificuldades que o setor enfrenta é a falta de um preço/mercado de referência sólido e a volatilidade do preço pontual, que representa cerca de 20% do mercado. Esse preço, que chegou a US$ 80.000 por tonelada de carbonato de lítio no final de 2022, caiu para US$ 20.000 em dezembro de 2023.

As projeções da Wood Mackenzie indicam que ainda há espaço para a queda do preço, mas que ele recuperará força no médio prazo em busca de um valor de equilíbrio e para ficar alinhado com a demanda. Novos aumentos de preços só começariam em 2028.

De acordo com o relatório da Aleph Energy, a queda em 2023 se deve ao aumento da oferta e à redução da demanda pelo uso de estoques (mercado mais equilibrado). Entre 2024 e 2025, haverá um influxo de novos projetos e expansões que aumentarão a oferta, enquanto a partir de 2026 o crescimento será limitado.

“A única coisa que pode colocar o preço em risco é se muito lítio for descoberto em outro lugar, com descobertas massivas, o que pode acontecer”, disse Dreizzen à Bloomberg Línea.

Sobre o uso desse recurso fundamental para a transição energética, o relatório detalha que o lítio representa entre 7% e 10% da bateria. Em média, um veículo requer 55 quilos de carbonato de lítio para fazer o cátodo da bateria e essa quantidade média é equivalente ao que 17.000 telefones celulares requerem.

Como o lítio é produzido na Argentina?

Os recursos globais de lítio chegam a 98 milhões de toneladas, 58% dos quais estão em salmouras, como é o caso do chamado triângulo do lítio, formado por Chile, Argentina e Bolívia.

No caso da Argentina, eles estão concentrados em três províncias do norte: Catamarca, Salta e Jujuy. E elas se destacam por um bom equilíbrio entre alto teor de lítio e baixa concentração de impurezas.

Duas das salinas argentinas (Salar de Hombre de Muerto e Salar Cauchari-Olaroz), que já produzem carbonato de lítio estão entre as três com maior concentração da matéria-prima, atrás apenas do Salar de Atacama, no Chile. Elas também estão entre as três com menos impurezas.

Dreizzen explica que a produção de lítio em salmoura é mais barata do que em pegmatitos e granito (rocha), como é o caso da Austrália, o maior produtor mundial, ou do Brasil. “O benefício é que, estando em salinas, você não gasta tanta energia, porque a evaporação faz grande parte do trabalho e então é mais fácil separá-lo do que da rocha, o que permite obter carbonato de lítio a um custo baixo e muito competitivo”, explicou o autor do relatório.

Na produção de lítio em salmouras, as empresas estão atualmente debatendo entre duas tecnologias para separar o recurso: evaporação em piscinas ou extração direta de lítio.

No país, a produção em piscinas tradicionais é atualmente a mais comum, embora cada vez mais empresas estejam pesquisando e investindo no desenvolvimento da extração direta de lítio (DLE), que se supõe ser mais sustentável.

“O método de evaporação é mais comprovado. Está mais claro o que funciona e como funciona, enquanto o DLE é mais novo. Além de o fato de que nos projetos na Argentina há uma área de superfície que permite avançar com esse método”, explicou Dreizzen.

Mesmo assim, ele esclareceu que “muitos dos projetos que estão sendo identificados atualmente ainda não definiram sua tecnologia”.

O relatório da Aleph Energy identificou 64 projetos no país, dos quais três já estão produzindo e sete estão em construção. A construção teve um impacto de duas formas: emprego e importações.

O emprego na mineração tem aumentado (em número de vagas) nos últimos anos. De acordo com um relatório do Ministério de Mineração, atualizado até maio de 2023, o setor empregava 38.853 trabalhadores, dos quais 10% correspondem a projetos de lítio.

Com relação à outra variável mencionada, com dados até julho de 2023, o lítio foi responsável por 92% das importações de mineração, explicadas por empresas atualmente em fase de construção. Mesmo assim, esse é um setor amplamente excedente.

Além desses, há seis projetos em processo de viabilidade, 14 em pré-viabilidade e 32 em fase de exploração.

Projeções para o lítio na Argentina

Se a Argentina conseguisse colocar todos os projetos em fase de produção, o país produziria até 1,5 milhão de toneladas de equivalente de carbonato de lítio por ano e exportaria US$ 30 bilhões. Esse cenário poderia ser alcançado até 2040, de acordo com as estimativas de Dreizzen.

As projeções do relatório, elaboradas após uma análise de cada projeto das empresas envolvidas, estimam que as exportações dos projetos em produção e construção atingiriam US$ 8 bilhões até 2028. Esse número é semelhante ao esperado pelo Ministério de Mineração, que estima US$ 8,7 bilhões para o mesmo ano.

“O potencial de lítio da Argentina é imenso e o crescimento será muito grande. Só com os projetos em construção e os que estão ativos atualmente, a produção aumentaria seis vezes”, disse Dreizzen, que apontou alguns dos gargalos enfrentados pelo setor e a curva de aprendizado pela qual ele precisa passar.

“Há um risco tecnológico. A logística e a infraestrutura ainda são complicadas no norte da Argentina, há falta de fornecedores, de transporte e as restrições à disponibilidade de moeda estrangeira proveniente de exportações também atrasam o desenvolvimento.”

De acordo com Dreizzen, esses são números conservadores, calculados apenas com projetos em produção e em construção e com o preço atual do lítio (US$ 20.000 a tonelada).

“É um negócio que nos próximos anos vai dar certo; cada vez mais carros estão sendo fabricados e vendidos com baterias de lítio”, disse o diretor da Aleph Energy.

Quais são as empresas de lítio na Argentina?

Entre as 41 companhias (em alguns casos, mais de uma empresa é proprietária do mesmo projeto) que operam atualmente no país, Dreizzen as divide em empresas ou conglomerados dedicados não apenas à mineração, mas também à fabricação de baterias elétricas ou químicas (Ganfeng, Livent, Albemarle); empresas exclusivamente de mineração (Rio Tinto, Eramet, Posco); empresas internacionais com ativos apenas na Argentina (Lake Resources) e nacionais de petróleo que se aventuraram no lítio local nos últimos anos (Pluspetrol, Integra, PAE, Tecpetrol).

Há empresas de vários países: Austrália, Canadá, Coreia do Sul, China, Estados Unidos, França, entre outros.

Globalmente, sete empresas controlam 80% do mercado. A Arcadium Lithium, a fusão entre a Livent e a Allkem, duas das três empresas que produzem lítio na Argentina, responde por 13%. É um negócio cuja produção quadruplicou nos últimos dez anos, mas que hoje está concentrado em poucos países e projetos.

O desenvolvimento de um projeto de lítio tem várias fases, que o relatório divide em três: prospecção e exploração, desenvolvimento e produção. As duas primeiras podem levar cinco anos cada, enquanto a produção pode levar até quarenta anos.

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