Bloomberg — A União Europeia e o Mercosul fecharam um acordo comercial negociado desde 1999, apesar das veementes objeções da França, que se comprometeu a liderar uma iniciativa para obstruir a ratificação.
As partes concordaram, em princípio, com os termos do pacto comercial nesta sexta-feira (6), depois que a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, viajou ao Uruguai para participar da cúpula do Mercosul desta semana, apesar de o presidente francês Emmanuel Macron ter dito a ela que os termos eram “inaceitáveis”.
Depois de mais de duas décadas de negociações, o acordo é uma chance para a UE e a união alfandegária sul-americana fundada por Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai aproveitarem novos mercados para seus produtos em meio à concorrência acirrada da China e às ameaças tarifárias do presidente eleito Donald Trump. Seria o maior acordo comercial já concluído por qualquer um dos blocos.
“Esse acordo é uma vitória para a Europa”, disse von der Leyen ao anunciar o acordo, observando que ele inclui salvaguardas destinadas a proteger os agricultores do bloco europeu. “Isso criará enormes oportunidades de negócios”.
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A ratificação será uma batalha longa e difícil na UE. Se for aprovado, o acordo criará um mercado integrado de 780 milhões de consumidores, impulsionando o setor manufatureiro da UE, que está em dificuldades, e o vasto setor agrícola do Mercosul.
Também fortaleceria a presença da UE em uma região onde a China emergiu como um grande fornecedor industrial e o principal comprador de commodities, ao mesmo tempo em que ajudaria a isolar ambos os blocos de uma possível guerra comercial de Trump.
Os exportadores de automóveis da UE, em particular, podem se beneficiar da remoção gradual das tarifas atuais de 35%.
As altas tarifas sobre produtos industriais, como peças de automóveis, maquinário, produtos químicos, roupas e têxteis, também seriam eliminadas.
No entanto, vários países europeus, especialmente a França e a Polônia, continuam se opondo firmemente, principalmente devido a preocupações sobre como isso afetará o setor agrícola.
Os agricultores europeus temem que a entrada de produtos da América Latina os coloque em uma desvantagem injusta.
Macron tem enfrentado a indignação dos agricultores que se opõem ao acordo e, atualmente, lida com a queda do governo no país.
Autoridades francesas próximas a Macron têm criticado von der Leyen da UE, insistindo que o acordo pode ser rejeitado pelos estados membros mesmo depois de assinado por ela.
Dado o grande consenso na França contra o acordo, é provável que Macron continue a luta, pois enfrenta um conjunto crescente de desafios políticos internos. O gabinete de Macron não respondeu imediatamente a um pedido de comentário.
O acordo também deve provocar tensões políticas e a ira dos agricultores na Polônia, que realizará uma eleição presidencial em 2025.
O primeiro-ministro polonês, Donald Tusk, disse que seu governo, que também inclui um partido de coalizão júnior apoiado pelos agricultores, se oporá ao acordo. Tusk levantou fatores internos para sua decisão, dizendo que o acordo teria repercussões para a agricultura polonesa.
A Alemanha, que representa cerca de um quinto da população da UE, é um forte apoiador do acordo, assim como a Espanha.
Os dois lados também chegaram a um acordo preliminar em 2019, mas nunca o assinaram devido, em grande parte, ao protecionismo europeu e à hostilidade em relação às políticas ambientais do ex-presidente brasileiro Jair Bolsonaro.
No entanto, o atual líder do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, tem sido um dos maiores defensores do acordo desde que assumiu o cargo em 2023. O presidente uruguaio, Luis Lacalle Pou, também tem se empenhado muito para que o acordo seja concluído.
"Na vida, é mais difícil destruir do que construir", disse Lacalle Pou. "Esse anúncio exige a melhor política."
Para o Brasil, o acordo deve impulsionar ainda mais as exportações do gigantesco setor de commodities agrícolas do país. O último estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada do Brasil (Ipea) mostrou que as exportações relacionadas à agricultura para o bloco europeu poderiam crescer em mais US$ 7,1 bilhões entre 2024 e 2040.
Produtos como carne suína, aves, óleos e gorduras vegetais podem ser os principais ganhadores, enquanto no café o país espera expandir a venda de grãos verdes para o envio de produtos de valor agregado, como o café instantâneo.
Embora exista a possibilidade de um acordo para reduzir as tarifas e facilitar o acesso dos produtos brasileiros ao bloco, a nação sul-americana também terá que trabalhar para atender às crescentes exigências ambientais da Europa.
As novas regras antidesmatamento na Europa têm o potencial de afetar cerca de dois terços das exportações agrícolas do Brasil para a Europa, disse Sueme Mori Andrade, diretora de Relações Internacionais da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil.
-- Com a colaboração de Jorge Valero, Simone Iglesias, Alberto Nardelli, Richard Bravo, Dayanne Sousa, Clarice Couto, Natalia Ojewska, Katharina Rosskopf e Samy Adghirni.
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