Bloomberg — O governador da Califórnia, Gavin Newsom, entrou com uma ação judicial para impedir as tarifas de Donald Trump, o que estabelece um desafio legal de alto risco ao esforço histórico do presidente americana para reformular o comércio global.
O estado contesta o uso dos poderes de emergência de Trump para decretar tarifas amplas contra o México, a China e o Canadá. O governador citou os danos causados aos consumidores e às empresas, incluindo os setores de agricultura e entretenimento, na Califórnia, que tem o que seria a quinta maior economia do mundo caso fosse um país.
“O novo regime tarifário do presidente Trump já teve impactos devastadores sobre a economia, criando caos nos mercados de ações e títulos, eliminando centenas de bilhões de dólares em capitalização de mercado em poucas horas, esfriando o investimento diante de uma ação presidencial tão consequente sem aviso prévio ou processo, e ameaçando empurrar o país para a recessão”, disse o governador acordo com a queixa apresentada na quarta-feira (16) no tribunal federal de São Francisco.
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Newsom, um democrata que é considerado um provável candidato à presidência em 2028, e o procurador-geral da Califórnia, Rob Bonta, buscam uma ordem judicial para suspender imediatamente as taxas.
“Nenhum estado está preparado para perder mais do que o estado da Califórnia”, disse Newsom em uma entrevista coletiva de imprensa. Ele alertou sobre as consequências para o orçamento e a economia do estado.
Casa Branca responde
Em um comunicado, um porta-voz da Casa Branca disse: “Em vez de se concentrar na criminalidade desenfreada, na falta de moradia e na falta de acessibilidade da Califórnia, Gavin Newsom está gastando seu tempo tentando bloquear os esforços históricos do presidente Trump para finalmente resolver a emergência nacional dos persistentes déficits comerciais de mercadorias de nosso país”.
O uso sem precedentes que Trump fez da Lei de Poderes Econômicos de Emergência Internacional para impor tarifas sobre as importações abalou os mercados, provocou previsões de uma possível recessão e prejudicou as relações com muitos dos principais parceiros comerciais dos EUA.
Essa lei aprovada em 1977 dá ao presidente ampla autoridade para regular determinadas transações financeiras ao declarar uma emergência nacional em resposta a uma “ameaça incomum e extraordinária”. Tradicionalmente, ela tem sido usada para impor sanções a países, empresas e indivíduos.
Trump se tornou o primeiro presidente a usar o estatuto para impor tarifas quando anunciou taxas em fevereiro contra a China, o México e o Canadá para responder à “ameaça extraordinária” de imigrantes sem documentos e drogas ilegais que atravessam as fronteiras dos EUA. Em abril, Trump citou o que ele tem classificado como persistente déficit comercial do país.
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O presidente já enfrenta pelo menos três contestações legais às suas tarifas, embora os principais setores afetados pelo fogo cruzado das tarifas tenham evitado qualquer ação legal por enquanto.
Duas queixas foram apresentadas por grupos conservadores de defesa jurídica em nome de pequenas empresas e a terceira por membros da tribo Blackfeet Nation em Montana.
A ação da Califórnia, assim como os casos anteriores, alega que a lei de emergência não dá a Trump autoridade para impor tarifas e que suas ações violam a legislação na ausência de aprovação do Congresso.
"O Congresso não autorizou essas tarifas, muito menos autorizou a imposição de tarifas apenas para aumentá-las, depois pausá-las e, em seguida, reinstituí-las imediatamente por capricho, causando um choque em nossa nação e na economia global", disse Bonta na coletiva de imprensa.
Os advogados do Departamento de Justiça do governo dos EUA argumentaram que as contestações às tarifas deveriam ser tratadas pelo Tribunal de Comércio Internacional em Nova York, especializado em ações judiciais contra o governo sobre questões comerciais, e tentam transferir os casos apresentados nos tribunais distritais dos EUA para o tribunal comercial.
Resistência da Califórnia
A Califórnia, um estado democrata de forma histórica, já contestou uma ordem executiva emitida por Trump para acabar com a cidadania de nascença e o congelamento de subsídios e empréstimos federais por parte do governo.
Newsom se posicionou como uma voz nacional em questões que vão desde as mudanças climáticas até o direito ao aborto. Seu segundo mandato termina em 2026, levando a especulações de que ele se candidatará à presidência.
A Califórnia é responsável por cerca de 14% do Produto Interno Bruto (PIB) do país, tem 40 milhões de habitantes e seria considerada uma das maiores economias do mundo se fosse um país autônomo.
Newsom disse que seu peso econômico proporciona à Califórnia uma vantagem no cenário global, mas também a torna vulnerável a tarifas.
O estado desempenha um papel crucial na agricultura e na indústria dos EUA, incluindo semicondutores, equipamentos de informática e veículos.
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Exportou US$ 24 bilhões em produtos agrícolas em 2022, quase 13% do total das exportações agrícolas dos EUA. As amêndoas foram o principal produto, com US$ 4,7 bilhões, seguidas por laticínios, pistache e vinho, com os principais compradores incluindo Canadá, União Europeia, China e Hong Kong.
Newsom disse que o impacto das tarifas já o forçou a ajustar o orçamento estadual que ele apresentará em maio.
O orçamento revisado “refletirá um rebaixamento na perspectiva econômica do estado”, disse ele na entrevista coletiva de imprensa, acrescentando que espera uma queda no crescimento econômico e na receita de ganhos de capital.
Os economistas estaduais e independentes com os quais Newsom se reuniu nas últimas semanas o informaram que “eles rebaixaram significativamente as projeções do PIB para o estado da Califórnia no próximo ano e aumentaram, como consequência dessa incerteza tóxica, a probabilidade de que nossa taxa de desemprego aumente, e não diminua, e que o ambiente precipite uma inflação mais alta”, disse o governador.
Newsom já havia dito anteriormente que tentaria isolar o estado do plano tarifário de Trump ao tratar diretamente com parceiros comerciais globais e buscar isenções, embora não esteja claro como ele poderia acertar acordos internacionais com parceiros estrangeiros.
-- Com a colaboração de Pierre Paulden e Eliyahu Kamisher.
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