Entre Milei e Lula, Paraguai busca caminho da austeridade, diz ministro das Finanças

Em entrevista à Bloomberg News, Carlos Fernandez afirma que governo tem buscado reduzir despesas com a folha de pagamento e tornar arrecadação mais eficiente para manter o déficit fiscal controlado

Carlos Fernandez
Por Ken Parks
07 de Janeiro, 2025 | 04:08 PM

Bloomberg — A América Latina tem se tornado um campo de extremos em gastos governamentais, o que desperta apelos de nações menores para apertar o cinto antes que as consequências se espalhem pelas fronteiras.

Na Argentina, os cortes drásticos de gastos do presidente Javier Milei provavelmente resultaram no primeiro superávit fiscal do país em mais de uma década, levando a um rali de títulos ao longo do ano que superou a maioria dos pares nos mercados emergentes.

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Ao lado, no Brasil, investidores venderam títulos, ações e a moeda local no mês passado, à medida que aumentavam as dúvidas sobre a disposição de Luiz Inácio Lula da Silva em reduzir um abismo fiscal crescente.

O ministro das Finanças do Paraguai, Carlos Fernandez, se posiciona entre esses dois extremos, uma vez que seu país depende do comércio com a Argentina e o Brasil. Em entrevista à Bloomberg News, Fernandez explicou por que uma política fiscal sustentável é importante em uma região exposta a crises internacionais.

“Eu aplaudo isso porque vai direto à raiz do problema, que é fiscal”, disse Fernandez, referindo-se ao programa de austeridade de Milei. O déficit do Brasil “não deixa muito espaço fiscal no caso de um choque externo que exija uma resposta de política macroeconômica.”

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Leia também: Paraguai é elevado a grau de investimento pela agência Moody’s

Fernandez não está exatamente se movendo no ritmo acelerado de austeridade de Milei, mas está cortando gastos com folha de pagamento enquanto aumenta a receita governamental por meio de melhores métodos de arrecadação tributária.

Isso ajudou o Paraguai a reduzir o déficit fiscal do ano passado para 2,6% do Produto Interno Bruto (PIB). O país busca limitar déficits futuros a 1,5% até 2026, o que seria uma fração do déficit nominal de 10% do qual o Brasil busca sair.

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Em toda a América Latina, “se a política fiscal não for ajustada, a política monetária acaba se apertando devido aos temores que os bancos centrais têm sobre a inflação”, disse Fernandez.

O Paraguai, um país sem litoral com 6,1 milhões de habitantes, tinha uma das menores proporções de impostos sobre o PIB na região, de 14,7% em 2022, em comparação com 33% no Brasil, segundo um relatório do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).

O orçamento de 2025 autoriza a emissão de até 9,72 trilhões de guaranis (US$ 1,2 bilhão) em títulos globais para cobrir o déficit.

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O governo tentará repetir a emissão do ano passado de títulos denominados em dólares americanos e globais em moeda local durante o primeiro trimestre para arrecadar dinheiro e quitar títulos com vencimento em 2026 e 2027, disse Fernandez.

Finanças públicas sólidas e uma economia em crescimento ajudaram o Paraguai a obter sua primeira classificação de crédito de grau de investimento no ano passado, quando a Moody’s elevou o país para Baa3, de Ba1, com perspectiva positiva.

Obter o grau de investimento da S&P Global Ratings e da Fitch Ratings — que apontaram instituições fracas e questões relacionadas ao estado de direito como obstáculos para uma melhor nota de crédito — pode ser mais desafiador depois que o partido Colorado, no poder, aprovou um projeto de lei polêmico que aumenta a supervisão governamental sobre organizações não governamentais.

A Fitch alertou em um comunicado que a medida pode enfraquecer as proteções à liberdade de associação e expressão.

A próxima atualização da classificação da nota de crédito do Paraguai não depende de um único fator, mas de avanços em diversas áreas, como a redução da corrupção e do déficit, de acordo com Fernandez, que minimizou as preocupações das agências de rating sobre a lei.

O ministério das finanças pretende publicar regulamentos para promulgar a lei no primeiro semestre de 2025, acrescentou ele.

‘Friend-shoring’

O presidente eleito Donald Trump nomeou pessoas com ampla experiência em políticas para a América Latina — como Marco Rubio, Chris Landau e Mauricio Claver-Carone — para cargos de alto nível, em um sinal de que a nova administração pode se concentrar mais na região do que governos anteriores dos Estados Unidos.

Enquanto o México e outras nações se preparam para enfrentar tarifas de Trump, Fernandez vê uma oportunidade para o Paraguai ganhar investimentos em “friend-shoring” — políticas dos EUA que incentivam empresas a transferir a produção de estados autoritários para aliados — sob a administração Trump.

O Paraguai possui um pequeno, mas crescente setor manufatureiro, cujas exportações ultrapassaram US$ 1 bilhão no ano passado, e é um dos poucos países que evitaram relações diplomáticas com a China continental em favor de Taiwan, aliada dos EUA.

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