Bloomberg Línea — O Brasil é o maior mercado consumidor do “melhor vinho do mundo” de 2024, uma bebida de luxo, com preço na casa de R$ 1.300.
O país também é um dos principais consumidores de um dos vinhos que enófilos e sommeliers mais criticam por causa da (supostamente menor) qualidade. E ambos são produzidos pela mesma vinícola chilena, que navega entre o luxo e o acessível para se consolidar como a maior empresa do segmento no Brasil.
Quando a prestigiosa revista americana Wine Spectator elegeu o chileno Don Melchor como o melhor rótulo de 2024, em novembro do ano passado, os canais de atendimento da Concha y Toro no país ficaram congestionados” e logo foram vendidas mais de 36.000 garrafas.
“O impacto da premiação foi imediato e significativo. Tivemos o melhor ano da história de Don Melchor no Brasil, que se tornou o maior mercado dele no mundo”, disse Pietro Capuzzi, country manager da Concha y Toro no Brasil em entrevista à Bloomberg Línea.
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“É impressionante perceber a paixão dos consumidores por essa marca, com colecionadores em busca de safras antigas e pedidos de autógrafos do enólogo.”
A conquista desse “Oscar” do mundo dos vinhos e a ampliação da presença no mercado de luxo no Brasil consolida um perfil multifacetado da Concha y Toro no país.
Ao mesmo tempo em que consomem o luxo do Don Melchor, que custa cerca de R$ 1.300, os brasileiros compram todos os anos 7,2 milhões de garrafas do vinho Reservado, marca de entrada da vinícola e a mais vendida no país, por menos de R$ 40, cada uma.
“A estratégia da Concha y Toro é ter marcas e vinhos para todos os gostos e bolsos. O Reservado é o vinho mais vendido no Brasil, seguido pelo Casillero del Diablo [que custa até R$ 70]”, disse Capuzzi.
“Mas temos também marcas que promovem a ‘premiumização’. Nossa estratégia não é ‘um ou outro’, mas, sim, desenvolver o potencial de cada linha, sempre buscando o trade up e a geração de valor.”
Essa estratégia de diversificação de perfis tem gerado resultado.
O país é o quarto maior mercado da vinícola (atrás do Reino Unido, do Chile e dos Estados Unidos), com um total de 12 milhões de garrafas vendidas por ano. E se destacou no ano passado como o de maior expansão da empresa no mundo.
Ao mesmo tempo, a Concha y Toro se firmou como a maior importadora e distribuidora de vinho no país, segundo dados da Ideal Consulting e da Nielsen.
A vinícola fechou 2024 com um crescimento de 22,3% no faturamento no Brasil em comparação ao ano anterior, superando a marca de R$ 500 milhões por ano, segundo Capuzzi.
Em comparação, outros mercados importantes tiveram crescimento menor, como Reino Unido (19,5%), Chile (2,4%) e Estados Unidos (18,7%). No quarto trimestre de 2024, a companhia registrou um crescimento global de 9,1% em receita e de 4,7% em volume, com um faturamento de US$ 970 milhões.
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“O Brasil historicamente sempre teve grande relevância pela proximidade cultural e econômica com o Chile, mas hoje se destaca como o mercado com o maior crescimento no mundo. Além disso, há a forte conexão emocional dos brasileiros com a marca, muitos dos quais visitam nossas vinícolas no Chile”, disse Capuzzi.
Estratégia de reforçar o premium
A construção da marca da vinícola com oferta de vinhos para perfis variados faz parte também de uma estratégia da Concha y Toro para estimular uma jornada de evolução no consumo dos seus rótulos no Brasil.
Segundo Capuzzi, apesar de um certo preconceito de enólogos com bebidas mais baratas e simples, a tese da vinícola é abrir a porta do mundo dos vinhos para novos consumidores e fidelizá-los, para que passem gradualmente para rótulos com faixa de preço superior.
“O grande desafio é democratizar o acesso ao vinho e desmistificar a ideia de que é uma bebida elitista. Gosto não se discute, e o sucesso do Reservado atesta sua qualidade e aceitação”, disse Capuzzi.

O rótulo mais popular, ele ressaltou, tem apelo especialmente em momentos de instabilidade econômica no país, quando o consumidor busca marcas confiáveis e acessíveis que garantam qualidade.
“O consumidor brasileiro cada vez mais busca experimentar novos rótulos, mas ainda com certa cautela, e por isso valorizam marcas reconhecidas que ofereçam qualidade”, disse.
A estratégia de “premiumização da vinícola acompanha essa evolução do paladar do consumidor brasileiro com lançamentos em todas as categorias.
Os vinhos intermediários da Concha y Toro, como a linha Diablo e Trivento (produzido na Argentina), têm atraído esse consumidor que busca algo além do básico e de entrada e cresceram mais de 50% em vendas no ano passado.
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“O consumidor mediano muitas vezes tem receio de investir em garrafas mais caras sem ter certeza da qualidade. Ao optar por marcas conhecidas dentro de uma faixa de preço intermediária, ele sente mais segurança em experimentar”, disse.
É nesse processo de promover a experimentação de novos vinhos da mesma marca que a Concha y Toro tenta levar aos brasileiros os seus rótulos de luxo, desde o Marques de Casa y Concha (que custa até R$ 200) e até o premiado Don Melchor.
“A participação de nossas marcas premium cresce ano após ano e essa é uma prioridade para nós”, disse Capuzzi.
“O Brasil é referência global de mercado de luxo. Em vários segmentos, como carros, moda, relógios — e com o vinho não é diferente. Para quem consome nessa faixa, o custo de um vinho premium ainda é competitivo”, segundo ele. “Tomar uma garrafa de Don Melchor em casa pode ser mais barato que um jantar em um restaurante de luxo. Isso abre uma oportunidade.”
Segundo Capuzzi, apesar da liderança, a jornada da Concha y Toro no Brasil está no começo.
“Acreditamos que há muito espaço para crescimento em todas as faixas de preço. Nossos principais desafios para o futuro são continuar a democratizar a categoria e tornar o vinho mais acessível em diversos pontos de venda e restaurantes, o que naturalmente aumentará o tamanho do mercado e, consequentemente, nossa participação.”
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