Na contramão do mercado, criptoativos crescem no Brasil e pesam sobre balança

Transações de criptos do exterior já representam 5% das importações totais do país; em 2023 até agosto, somaram US$ 7 bi, quase o mesmo valor de 2022 inteiro, segundo dados do BC

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Bloomberg Línea — As compras por brasileiros de criptoativos, incluindo moedas digitais como o bitcoin, têm crescido de forma acelerada e já começam a pesar sobre o resultado da balança comercial brasileira.

Dados do Banco Central (BC) indicam que as importações líquidas de criptoativos em 2023 somaram US$ 7 bilhões no acumulado do ano até agosto, pouco menos do que todo o valor do ano passado (US$ 7,4 bilhões).

Somente em agosto, o volume das importações de criptoativos foi de US$ 1,14 bilhão, o maior valor mensal já registrado na série histórica do BC. A quantia representou 5% do total das importações do país no mês, ante 2% em agosto do ano passado.

O BC contabiliza os criptoativos na balança comercial de bens seguindo uma recomendação metodológica do Fundo Monetário Internacional (FMI), que classifica essa categoria como um bem não-financeiro para o cálculo do balanço de pagamentos.

Segundo o BC, apesar de os criptoativos não terem registro aduaneiro e serem digitais, as compras e as vendas por residentes no Brasil implicam a celebração de contratos de câmbio, o que justificaria incluí-los na conta de exportação e importação para fins estatísticos.

Os criptoativos são uma categoria de ativo digital que inclui principalmente criptomoedas e os chamados tokens e NFTs, que são registros digitas que representam uma parte do capital de um produto ou empresa e são negociados em plataformas online.

No acumulado em 12 meses, as importações líquidas de criptoativos somam US$ 9,4 bilhões, um aumento de 38% em relação aos US$ 6,8 bilhões registrados até agosto do ano passado.

No mundo, os volumes de negociação de criptoativos estão em queda da ordem de 60% a 70% na base em 12 meses tanto à vista como em derivativos a depender da fonte, como a CCData.

De acordo com os pesquisadores Andreza Palma e Estêvão Bastos, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), o crescimento das importações de criptoativos tem sido responsável por aumentar a diferença entre o saldo da balança comercial calculado pelo BC no balanço de pagamentos e o valor apurado pela Secretaria de Comércio Exterior (Secex), do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (Mdic).

Enquanto o Banco Central registrou um saldo de US$ 7,6 bilhões no mês de agosto, o valor apurado pela Secex foi de US$ 9,6 bilhões.

No acumulado do ano até agosto, o BC aponta um superávit comercial de US$ 51,5 bilhões, enquanto os dados do Mdic indicam um valor de US$ 62,3 bilhões, uma diferença de US$ 10,8 bilhões.

“A importação de criptoativos é um ponto que merece atenção, pela magnitude que vem assumindo. Outra comparação, para ilustrar o fenômeno: de janeiro a agosto deste ano elas foram de US$ 7,4 bilhões, enquanto os investimentos diretos de residentes no Brasil no exterior, considerando ‘participação no capital, exceto reinvestimento de lucros’, foram de US$ 9,0 bilhões”, afirmaram Andreza Palma e Estêvão Bastos em resposta conjunta por e-mail à Bloomberg Línea.

Os pesquisadores do Ipea explicam que os criptoativos são classificados como “ativos não-financeiros” na metodologia internacional porque não há uma contrapartida da parte devedora, como ocorre no caso de títulos públicos ou privados. Por esse motivo, os valores são lançados na conta de transações correntes pelo Banco Central, seguindo recomendação do Fundo Monetário Internacional (FMI).

Segundo o economista Livio Ribeiro, pesquisador associado do FGV/IBRE e sócio da consultoria BRCG, a diferença entre as medições do BC e do Mdic tem chamado a atenção e está associada a três fatores que são computados pelo Banco Central, mas não pelo ministério: os criptoativos, a importação de bens de baixo valor (em geral, compras feitas em lojas online internacionais como Shein, Aliexpress, Shopee e outras), e as importações associadas ao Repetro, um regime aduaneiro especial para o setor de petróleo.

Ele observou que os efeitos do Repetro eram mais significativos no passado e vêm perdendo peso nas estatísticas do BC uma vez que o regime deixou de existir. Enquanto isso, os criptoativos e as importações de pequeno valor cresceram.

“Essa dinâmica está aumentando neste ano. No ano passado, vimos uma diferença entre os dois regimes [do BC e do MDIC] de US$ 17,5 bilhões. Neste ano, estamos caminhando para números da ordem de US$ 20 bilhões”, afirmou.

“Essa questão dos criptoativos acelerou a diferença. E parece pouco provável que tenhamos números menores olhando para frente.”

A série histórica da balança comercial medida pelo BC inclui dados de importações e exportações de criptoativos a partir de novembro de 2018. Desde então, as importações líquidas por brasileiros somam US$ 27,7 bilhões.

As exportações de criptoativos (que indicam operações de venda) têm sido bem menores do que as importações desde o início do registro dos dados.

Em 2023, as exportações somaram somente US$ 363 milhões até agosto, enquanto as importações foram de US$ 7,4 bilhões. As exportações acumuladas desde o início da série histórica, em 2018, é de US$ 562 milhões.

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