Por que a queda do dólar não é sentida nos preços, segundo este economista do Citi

Leonardo Porto, economista-chefe do Citi para o Brasil, diz que a redução de custos de commodities não tem sido repassada na mesma medida ao consumidor, o que demanda cautela do BC

A inflação dos chamados bens comercializáveis continua elevada
29 de Junho, 2023 | 12:55 PM

Bloomberg Línea — A queda do dólar (USDBRL) em relação ao real em 2023, combinada com a redução das cotações globais de matérias-primas, tem colaborado para manter a inflação no Brasil controlada nos últimos meses. No entanto o repasse da redução de custos para o preço final dos produtos no país tem demorado mais para ocorrer do que seria esperado, segundo o economista-chefe do Citi no Brasil, Leonardo Porto.

A situação coloca pressão sobre o Banco Central no momento em que a autoridade monetária avalia iniciar um ciclo de corte da taxa básica de juros, a Selic.

O economista notou que o preço das commodities em reais registra uma queda de quase dois dígitos no acumulado de 12 meses. Ao mesmo tempo, a inflação do atacado, medida pelo Índice de Preços ao Produtor Amplo (IPA), tem retração anual de 7% até o mês de junho.

Apesar das quedas, os preços ao consumidor final de bens comercializáveis (aqueles que sofrem influência do mercado externo) continuam a subir e se mantêm na casa dos 4% ao ano, de acordo com o IPCA.

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“Existe uma força externa que está ajudando o processo desinflacionário, que é a queda das commodities em moeda local. Mas a transmissão para o consumidor está mais limitada do que o usual. É a transmissão do atacado para o varejo”, disse Porto em conversa com jornalistas na terça-feira (27), durante evento organizado pelo Citi em São Paulo, em resposta a uma pergunta da Bloomberg Línea.

Para o economista, seria esperado que a inflação de bens comercializáveis no IPCA estivesse rodando abaixo de 4% ao ano diante da queda das cotações das commodities em reais e dos preços no atacado.

Recomposição de margem

Segundo cálculos da equipe de pesquisa do Citi, uma explicação para que os varejistas não estejam repassando a redução dos custos ao consumidor é a de que as empresas estejam em busca de recompor as suas margens de lucro perdidas durante a pandemia. Essa recomposição ocorre em um ambiente em que a economia está mais aquecida do que se imaginava.

Empresas ainda têm mais espaço para recompor a margem

Na fase mais aguda da crise de covid-19, varejistas reduziram as margens para evitar repassar o aumento de custos ao consumidor no momento em que a demanda despencou e a economia entrou em recessão.

“Em 2020, 2021, os IGPs [Índice Geral de Preços] rodavam em 40% positivo ao ano. E os IPCs [Índice de Preços ao Consumidor] não passavam de 12%. As empresas perderam margem nesse período. Não tinha como repassar o aumento de custos”, afirmou. “Agora eles estão encontrando um ambiente mais favorável. Se vale a nossa métrica, ainda tem mais espaço para recompor a margem.”

Reflexos para o Banco Central

O tempo prolongado para repassar a redução de custos ao varejo tem efeitos sobre a política monetária do Banco Central. Segundo o economista, o BC precisa ser cauteloso para fazer com que esse processo de transmissão se consolide.

“Quando o Banco Central é mais duro e faz um processo mais gradual, mais lento [de redução de juros], ele ajuda a fazer com que esse processo desinflacionário vindo de fora para dentro se complete ou se materialize em maior escala do que se ele fizer um processo de afrouxamento prematuro ou mais intenso”, afirmou.

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Filipe Serrano

É editor sênior da Bloomberg Línea Brasil e jornalista especializado na cobertura de macroeconomia, negócios, internacional e tecnologia. Foi editor de economia no jornal O Estado de S. Paulo, e editor na Exame e na revista INFO, da Editora Abril. Tem pós-graduação em Relações Internacionais pela FGV-SP, e graduação em Jornalismo pela PUC-SP.