Bloomberg Línea — A relutância em controlar as despesas públicas prejudica “severamente” a credibilidade do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para atingir as metas fiscais, incluindo o objetivo de zerar o déficit primário em 2024, na visão da equipe econômica do Goldman Sachs (GS).
Em relatório divulgado nesta sexta-feira (5), analistas do banco de Wall Street classificam a política fiscal do governo como “claramente expansionista”, e dizem que a âncora fiscal “fraca e duvidosa”, representada pela regra do arcabouço, contribui para manter as expectativas de inflação acima da meta de 3% ao ano.
O Boletim Focus mais recente, divulgado na terça-feira (2), aponta uma estimativa mediana de 3,51% para o IPCA de 2025 e de 3,50% para 2026, uma situação que dificulta o esforço do Banco Central para seguir com os cortes da Selic.
Dados do BC divulgados nesta sexta indicam que o déficit do setor público consolidado atingiu R$ 48,9 bilhões em fevereiro, acima de R$ 26,5 bilhões do mesmo mês no ano passado.
O rombo está concentrado nas contas do governo central (Tesouro Nacional, Previdência Social e Banco Central), que registrou déficit de R$ 57,8 bilhões no mês. Por outro lado, estados e municípios tiveram superávit de R$ 8,6 bilhões, e as empresas estatais atingiram um resultado positivo de R$ 0,5 bilhão.
Leia mais: O conselho de Campos Neto ao sucessor: ‘o importante é ter a firmeza de dizer não’
Considerando os 12 meses encerrados em fevereiro, o déficit primário do setor público atingiu 2,44% do Produto Interno Bruto (PIB). Considerando apenas o governo central, o déficit ficou em 2,56% do PIB.
Parte do déficit foi influenciado pelo impacto de despesas de R$ 93 bilhões de precatórios (pagamentos relacionados a decisões judiciais contra o governo) e de benefícios sociais.
“Esperamos que o saldo primário do setor público consolidado permaneça no vermelho no futuro previsível, e que a dinâmica da dívida bruta continue em tendência de alta nos próximos anos”, disseram os analistas do Goldman, liderados por Alberto Ramos, diretor de pesquisa macroeconômica do Goldman Sachs para a América Latina.
“Colocar a dinâmica da dívida em uma tendência de declínio estrutural sustentada e construir amortecedores fiscais permanecem como um desafio macroeconômico-chave. Isso exigiria superávits fiscais primários estruturais acima de 2% do PIB, o que contribuiria para a redução da taxa de juros real neutra. Tal resultado é altamente improvável no curto prazo”, completa.
A visão é compartilhada por outras instituições. Em relatório, analistas do Itaú Unibanco (ITUB4) avaliam que os riscos fiscais continuam elevados, apesar de a arrecadação de impostos ter surpreendido para cima nos primeiros meses do ano. Dados de atividade econômica também apontam para uma expansão maior do que o esperado para o PIB em 2024 do que o esperado anteriormente.
Economistas do banco, liderados por Mario Mesquita, apontam também a baixa disposição do governo em contingenciar despesas como um dos fatores de risco.
“Uma mudança precoce da meta de resultado primário ou dos principais parâmetros do arcabouço traria um dano de credibilidade à estratégia do governo e implicaria em um ajuste ainda mais dependente do aumento de receitas”, escrevem os economistas no relatório.
Leia também
Crédito privado volta ao normal, mas ainda há boas oportunidades, diz BTG Asset