Bloomberg — O Brasil está ajustando os detalhes finais de um plano de resgate para companhias aéreas, à medida que o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva enfrenta um desafio que os Estados Unidos e a Europa tiveram que lidar logo após a pandemia.
O pacote, a ser anunciado nos próximos dias, usará fundos públicos como garantia para empréstimos a empresas aéreas em dificuldades do banco de desenvolvimento do país (BNDES), de acordo com uma pessoa familiarizada com o assunto que falou à Bloomberg News.
O plano, contudo, ainda está indefinido e espera-se que seja mais uma solução paliativa do que uma cura para toda a indústria.
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Reduzir as tarifas o suficiente para permitir que os mais pobres voem regularmente se tornou um grande foco de Lula, que fez campanha com a promessa de restaurar a prosperidade na maior economia da América Latina.
O alto custo do combustível de aviação no Brasil é um fator complicador, com a Petrobras (PETR3; PETR4) sob pressão para reformular sua política de preços.
A inação do antecessor de Lula após a covid-19 empurrou as companhias aéreas domésticas à beira do colapso.
O novo governo tem enfrentado dificuldades para concordar com um caminho a seguir e, quando a Gol (GOLL4) pediu recuperação judicial no final de janeiro, a questão subiu para o topo da agenda.
Agora, a Azul (AZUL4) está explorando uma possível oferta de aquisição para sua concorrente em dificuldades.
O valor exato da ajuda ainda está sendo determinado. Alguns dentro do governo estão pressionando por até R$ 8 bilhões, enquanto o Ministério da Fazenda prefere um valor mais próximo de R$ 5 bilhões, de acordo com duas pessoas familiarizadas, que falaram sob condição de anonimato porque as discussões são privadas.
“As companhias aéreas não receberam ajuda do governo durante a pandemia e em algum momento você tem que pagar o preço”, disse Ygor Araujo, analista da Genial Investimentos, em uma entrevista.
Segundo sua estimativa, um resgate do tamanho em consideração poderia aliviar as pressões de fluxo de caixa por seis a oito meses, mas não seria suficiente para reduzir as tarifas por si só.
Além dos altos custos de combustível, as companhias aéreas brasileiras estão enfrentando atrasos na produção de novas aeronaves, incerteza jurídica e um número extremamente alto de processos judiciais envolvendo clientes insatisfeitos.
Elas aumentaram os preços para compensar os custos crescentes, com as tarifas subindo quase 50% em dezembro em relação ao ano anterior.
O presidente tem sido especialmente vocal sobre sua insatisfação com a situação. “Não há explicação para o preço das passagens aéreas neste país”, disse Lula em um evento no estado do Amapá naquele mês, acrescentando que algumas passagens para a região norte custam até R$ 10.000.
Muitos da classe trabalhadora estão levando-o a sério e aguardando resultados. Dulce da Conceição, uma empregada doméstica há mais de 35 anos em Brasília, está ansiosa por passagens aéreas mais baratas para poder visitar sua família no nordeste com mais frequência.
“Seria muito melhor ir de avião do que de ônibus”, disse ela em uma entrevista.
As companhias aéreas têm ouvido muitas críticas sobre a questão. Em um fórum do setor em São Paulo na semana passada, o diretor executivo da Azul, John Peter Rodgerson, disse que as empresas enfrentaram repreensões semanais do governo ao longo de 2023, à medida que as tarifas aumentavam.
Seus colegas da Latam Airlines e Gol admitiram no mesmo evento que os altos preços estão dificultando o acesso às viagens.
Mas apenas retomar empréstimos do BNDES, o banco de desenvolvimento, provavelmente não será suficiente para reduzir os preços para o consumidor.
“A linha do BNDES não resolve o problema, pois não seria usada para subsidiar passagens, mas sim ajudar com as questões de liquidez das empresas”, disse Carolina Chimenti, analista de crédito da Moody’s Investors Service, que destacou as taxas de câmbio e os custos de combustível como outras questões-chave.
Apesar do processo de recuperação judicial, a Gol afirma que ainda é elegível para a linha de crédito do BNDES, de acordo com uma pessoa familiarizada com o assunto que falou à Bloomberg News. A companhia aérea não respondeu a um pedido de comentário.
A Latam confirmou que está em negociações com o governo sobre formas de reduzir as tarifas, afirmando em comunicado por e-mail que vê o aumento no fornecimento de assentos e a redução dos custos estruturais como requisitos-chave.
E a Azul acredita que o setor não está crescendo tão rápido quanto deveria no Brasil, citando comentários de Rodgerson em entrevista recente à Bloomberg News.
O CEO disse na época que uma linha de crédito doméstica poderia mitigar as flutuações cambiais e, em última análise, ajudar a aumentar a capacidade.
Medidas para amenizar os preços
O governo Lula está considerando outras medidas para reduzir os preços das passagens. Um novo programa em discussão, conhecido como Voa Brasil, tem como objetivo persuadir as companhias aéreas a oferecer tarifas com desconto para estudantes e aposentados.
Em relação aos custos do combustível, o governo está instando a Petrobras a mudar seus procedimentos de fixação de preços, mas até agora encontrou forte resistência.
Embora o Brasil produza quase todo o combustível de aviação usado no país, a empresa estatal calcula os preços como se fossem importados, o que traz volatilidade cambial para a equação.
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Executivos do setor veem a redução dos preços dos combustíveis como um processo de longo prazo. Mas isso pode mudar se Lula decidir intervir diretamente nos assuntos da empresa, como diz ter feito na semana passada ao orquestrar a rejeição de uma proposta de dividendos pela diretoria da Petrobras.
A medida apagou US$ 11 bilhões do valor de mercado da empresa estatal em um único dia.
Outro desafio são as taxas de litigância extremamente altas que custam milhões às empresas a cada ano. As companhias aéreas brasileiras enfrentam entre 8.000 e 10.000 processos judiciais a cada mês.
A combinação de um forte código de defesa do consumidor, que se aplica às transportadoras aéreas, e um sistema legal acessível significa que os clientes insatisfeitos no Brasil têm 800 vezes mais probabilidade de recorrer aos tribunais do que os dos Estados Unidos.
A concorrência também é um problema. A Agência Nacional de Aviação Civil do Brasil (ANAC) disse que, de oito novas companhias aéreas licenciadas para operar no país desde 2019, duas pararam de voar e outra nunca chegou a começar.
"Uma redução significativa nas tarifas será alcançada com um aumento no fornecimento de assentos - um desafio tremendo em todo o mundo após a pandemia", disse José Roberto Afonso, economista e pesquisador da Universidade de Lisboa, que também leciona no IDP em Brasília.
A Associação Internacional de Transporte Aéreo concorda que não há uma solução única para o governo Lula.
“O Brasil precisa resolver efetivamente seus problemas estruturais, como o alto custo do combustível de aviação, especialmente quando comparado aos principais mercados, o custo proibitivo de capital e a excessiva judicialização, que atuam como obstáculos significativos para o enorme potencial de crescimento do setor”, afirmou o grupo global da indústria de companhias aéreas em resposta a perguntas por e-mail.
-- Com a colaboração de Giovanna Serafim, Beatriz Reis, Leda Alvim e Gabriel Tavares.
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